Capítulo 25 - A Distância de um Suspiro

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LÍVIA BIANCHI
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A noite anterior ainda pesava em minha mente. Eu não conseguia tirar da cabeça o que havia acontecido na cozinha. Filipe e eu nos esbarrando no meio da madrugada, e o ar ficando denso, quase insuportável de tão carregado com a tensão que pairava entre nós. Eu não tinha planejado sair do quarto, mas o calor do verão e a secura na boca me obrigaram a ir até a cozinha em busca de um copo d'água. O que eu não esperava era encontrá-lo ali, àquela hora, como se também fosse refém de seus próprios pensamentos.

Agora, no dia seguinte, eu estava sentada no sofá da sala, ouvindo o som distante dos dedos dele batendo nas teclas de seu laptop no escritório. Trabalhando como se nada tivesse acontecido. Como se aquele encontro inesperado não tivesse mudado alguma coisa entre nós.

Lembrei de como foi difícil controlar minha respiração quando o vi na cozinha. A camiseta preta colada ao corpo forte, os cabelos bagunçados, como se ele também tivesse passado a noite em claro. Quando ele me viu, algo em seu olhar mudou – e naquele instante, parecia que o ar ao nosso redor tinha ficado pesado demais para ser respirado.

Eu estava tão perto dele, perto o suficiente para sentir o calor de sua pele, e ainda assim... era como se houvesse um abismo entre nós. Um abismo que, a cada segundo, parecia mais difícil de ignorar.

Na noite anterior...

— Não sabia que você estava acordada — a voz de Filipe soou baixa, rouca, enquanto ele me observava abrir o armário em busca de um copo.

— Eu... só vim pegar um pouco de água — murmurei, sem coragem de encará-lo diretamente.

Minhas mãos tremiam levemente, e eu sabia que ele havia percebido. Senti o olhar dele em mim, me estudando, como se tentasse ler cada pensamento que passava pela minha cabeça. O silêncio entre nós era torturante. O som do copo enchendo na torneira pareceu ensurdecedor, mas nada comparado ao som dos meus batimentos acelerados.

Eu me virei para sair, o copo de água ainda entre os dedos trêmulos, mas, ao dar um passo, tropecei ligeiramente, fazendo com que nosso encontro fosse inevitável. Esbarrar nele foi como um choque. O toque, ainda que breve, despertou algo em mim – algo que eu tentava negar desde o primeiro dia que o conheci.

— Cuidado — Filipe murmurou, a mão firme segurando meu braço antes que eu perdesse o equilíbrio.

Eu estava tão perto dele que podia sentir o cheiro amadeirado e envolvente de seu perfume, algo que misturava poder e perigo. Seus dedos ainda estavam em meu braço, mas não de forma agressiva. Era um toque contido, quase como se ele estivesse lutando contra si mesmo para não ir além.

— Desculpe — sussurrei, minha voz quase falhando. Tentei me afastar, mas parecia que meus pés estavam presos ao chão.

Filipe não disse nada. Seu rosto estava a poucos centímetros do meu, e eu podia ver o conflito em seus olhos – aquele mesmo olhar que ele sempre tinha, como se houvesse algo mais profundo que ele nunca deixava ninguém ver. Sua respiração estava pesada, como se ele também estivesse lutando contra algo dentro de si.

Eu não sabia o que fazer. Qualquer movimento parecia arriscado, como se qualquer passo errado pudesse quebrar aquela barreira invisível que nos separava e que, ao mesmo tempo, nos aproximava perigosamente.

Ele soltou meu braço, mas não se afastou. Nossos corpos estavam tão próximos que eu podia sentir o calor emanando dele, e isso fazia minha cabeça girar. O ar entre nós parecia eletrificado, como se uma simples faísca pudesse incendiar tudo ao nosso redor.

— É melhor... — Filipe começou, mas sua voz falhou por um segundo. Ele fechou os olhos, como se estivesse tentando encontrar a força para terminar a frase. — É melhor você voltar para o seu quarto, Lívia.

Eu assenti, mesmo sabendo que minhas pernas estavam fracas demais para me mover naquele momento. Tentei dar um passo para trás, mas meus dedos roçaram levemente o peito dele, e aquele simples toque fez meu coração disparar de uma forma que eu não conseguia controlar.

Filipe ficou imóvel, mas eu vi o músculo de sua mandíbula se contrair, como se aquilo fosse uma tortura para ele também. Ele deu um passo para trás, finalmente quebrando a tensão que nos envolvia.

— Boa noite — ele murmurou, virando-se rapidamente e saindo da cozinha, deixando-me ali, com o corpo trêmulo e a respiração descompassada.

Na manhã seguinte...

As memórias da noite anterior ainda me atormentavam, mas eu não tinha coragem de enfrentá-lo. E, pelo visto, Filipe também não parecia disposto a continuar de onde paramos. Ele estava preso em seu escritório, o que só tornava as coisas ainda mais intensas. O silêncio entre nós gritava mais do que qualquer palavra dita.

O que estávamos nos tornando?

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