CAPÍTULO 5 - VER E SENTIR

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Eu estava no carro, o silêncio preenchendo o espaço ao meu redor enquanto a cidade passava como um borrão invisível. Ainda sentia o toque de Jenna, o calor do abraço que partilhamos depois do evento. Mas mesmo com a proximidade, a conexão que eu tanto prezava, algo dentro de mim ainda doía.

Eu queria tanto poder ver Jenna.

Era uma verdade que eu escondia até de mim mesma às vezes. Eu sempre tentei me convencer de que minha cegueira não deveria limitar quem eu era, que minha visão interior era mais profunda do que qualquer imagem que meus olhos pudessem captar. E, por muito tempo, eu acreditei nisso. Mas desde que conheci Jenna, desde que me permiti abrir espaço para algo mais entre nós, essa convicção começou a desmoronar aos poucos.

Eu lembrava dela na série, suas expressões marcantes, o jeito como seus olhos transmitiam tanto sem precisar de palavras. Quando estávamos juntas, eu me esforçava para imaginar essas expressões. Eu ouvia o som suave de sua voz, o riso leve que fazia meu coração vibrar, e tentava, de alguma forma, preencher o vazio com memórias que eu tinha dela na tela.

Mas não era a mesma coisa.

A falta de poder ver as sutilezas do seu rosto quando ela falava comigo, a maneira como seus lábios se curvavam em um sorriso ou como seus olhos poderiam brilhar de emoção... isso me atormentava. Eu queria ver esses pequenos momentos. Eu queria ver Jenna completamente, assim como eu sabia que ela me enxergava além da minha condição. Mas esse desejo, essa necessidade crescente de poder captar sua presença visualmente, me trazia uma dor silenciosa.

Meu peito apertava com a realização de que, talvez, isso nunca fosse possível.

E, além desse turbilhão, havia o peso do meu segredo. Não era apenas a minha visão que eu escondia; minha intersexualidade também era algo que nunca ousei compartilhar. Eu não sabia como falar sobre isso com Jenna. Ela era tão compreensiva, tão aberta... mas e se essa fosse a linha que ela não poderia cruzar? E se a verdade sobre mim a afastasse? Esse medo me paralisava toda vez que eu pensava em me abrir.

Eu queria tanto que Jenna soubesse de tudo, que ela visse todas as partes de quem eu sou. Mas, ao mesmo tempo, o medo de perder o que tínhamos essa conexão frágil e preciosa que estávamos construindo era aterrorizante.

Fechei os olhos, sentindo a suavidade do tecido do meu vestido sob meus dedos, tentando me concentrar em qualquer outra coisa que não fosse o caos que se instalava dentro de mim. O som do motor do carro, o farfalhar distante das folhas do lado de fora, tudo parecia uma tentativa inútil de abafar a tempestade interna.

Quando cheguei em casa, o silêncio do meu apartamento me recebeu com uma espécie de vazio acolhedor. Deixei minha bolsa na mesa e caminhei até o sofá, sentando-me com um suspiro pesado. Os eventos da noite se desenrolavam em minha mente, mas, ao invés de me sentir em paz com tudo o que aconteceu, uma sombra de tristeza pairava sobre mim.

Eu queria ter visto Jenna no palco, com seus olhos brilhando de entusiasmo enquanto falava sobre o filme. Eu queria ter visto a expressão no rosto dela quando dedicou aquelas palavras a mim na frente de todos. Mas, ao invés disso, eu apenas ouvia, imaginava e tentava preencher as lacunas com suposições que nunca seriam suficientes.

Abracei meus joelhos, sentindo a familiar pressão contra meu peito. O mundo parecia tão vasto e cheio de coisas que eu nunca poderia experimentar plenamente. E por mais que eu me esforçasse para aceitar isso, momentos como aquele tornavam a aceitação muito mais difícil.

Meus dedos roçaram o telefone, e por um breve segundo, pensei em ligar para Jenna. Dizer a ela como eu estava me sentindo, como queria tanto vê-la de verdade. Mas as palavras presas na minha garganta me impediram. Eu ainda não estava pronta. Não sabia como explicar tudo isso a ela sem parecer frágil ou insegura, duas coisas que eu sempre tentei evitar ser.

AMOR EM CORES VIVAS - JENNA ORTEGA / GP!Onde histórias criam vida. Descubra agora