Capítulo 43: Bela Adormecida

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Na manhã seguinte, Carol acordou lentamente, sentindo-se ancorada em uma paz que não se lembrava de ter experimentado havia tempos. Enquanto piscava contra a luz que entrava pela janela, percebeu que, pela primeira vez, o peso que carregava no peito há tanto tempo parecia ter se desfeito como nuvens dispersando após uma tempestade. Sentia-se livre, como se tivesse sido retirada debaixo de toneladas de areia e agora pudesse, enfim, respirar. Finalmente...

Ao espreguiçar-se, um sorriso sutil, quase alheio à sua própria vontade, surgiu em seus lábios. Pensou na conversa da noite anterior, no alívio que Gabi lhe proporcionara ao ouvi-la sem julgamentos, sem interferências desnecessárias, deixando-a esvaziar todas as palavras que precisavam sair. A amiga, que sempre estava ao seu lado nas brincadeiras e trocas de provocações, havia sido o ombro, o abraço silencioso que ela tanto precisava. Como é bom ter alguém que entende até o que a gente nem sabe como explicar.

Virou-se na cama, os olhos se fixando no teto, e riu baixinho. Havia sido um verdadeiro alívio poder colocar para fora todas aquelas mágoas acumuladas ao longo do relacionamento com Juliana. Como uma ferida que só cicatrizaria quando o curativo fosse retirado, deixar as palavras emergirem na companhia de sua amiga de longa data parecia ter sido a última coisa necessária para que ela finalmente virasse aquela página. Carol sempre se orgulhara de ser forte, de suportar as dores com um sorriso e com aquela risada fácil. Mas ontem, entre uma lágrima que escapou e um afago no cabelo, ela finalmente pôde baixar a guarda.

Ela suspirou. Sabia que Gabi nunca falaria sobre aquilo novamente; era como um pacto mudo entre elas. Sempre havia espaço para as risadas, os apelidos e as zoeiras, mas, quando uma das duas precisava, era como se abrissem um parêntese, uma bolha onde as palavras mais duras, os sentimentos mais escondidos, podiam existir. E, assim como a bolha se formava, ela desaparecia no dia seguinte, sem deixar vestígios.

Ao levantar-se, Carol sorriu de lado, sabendo que, se Gabriela acordasse antes dela, certamente já começaria o dia com alguma piada ou comentário sobre o cabelo desgrenhado da amiga. Era esse o jeito delas, e ela não poderia estar mais grata. Em algum lugar da casa, ouviu o barulho de passos preguiçosos e uma voz rouca de sono resmungando algo, e, ao sentir o coração leve, Carol sabia que estava pronta para recomeçar, para viver sem as sombras de ontem. "Hoje é só o começo."

Ao sair do quarto, Carol seguiu o som dos passos e encontrou Gabi na cozinha, de costas, preparando o café da manhã. Os cabelos da amiga estavam presos em um coque alto e desarrumado, e ela murmurava alguma música baixinho enquanto mexia a colher na caneca. A cena era tranquilizadora e exatamente o que Carol precisava para começar o dia. Gabi se virou, notando a presença da amiga, e, com um sorriso preguiçoso, acenou com a caneca no ar.

— Bom dia, bela adormecida! Dormiu tanto que já achei que ia ter que te acordar com um balde d'água... Porque você sabe, essa coisa de beijinho de príncipe encantado não rola por aqui. Até sou uma princesinha, mas Deus me livre te beijar.

Carol riu, balançando a cabeça.

— Prefiro ficar desmaiada! — Deixou que uma risada mais alta fosse emitida antes de continuar — Bom dia. Acho que estava precisando de umas boas horas de sono, né? — Ela pegou a caneca que Gabi lhe estendia e levou aos lábios, sentindo o aroma do café invadir os sentidos. — E você? Não está com cara de quem dormiu muito.

Gabi deu de ombros, com um sorriso de canto.

— Eu dormi o suficiente. Cê sabe que eu sou dessas que se recupera rápido, é "jovem" que fala né?! — Ela piscou com malícia, mas, em seu olhar atento, havia uma faísca de carinho e preocupação. Sabia que a amiga estava bem melhor hoje, mas queria garantir que esse bom humor era autêntico.

Sorte A Nossa | BuijrolOnde histórias criam vida. Descubra agora