06.1 | ou ❝ei, irmã!❞

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Irrompi pelos portões do colégio, lívida de raiva. Lorena tinha me dado uma carona até lá com seu motorista, tagarelando sobre seu namorado Lucas, e sobre o quanto o amava, e sobre os muitos meses que os dois estavam juntos.

No intervalo, pisei fundo até a mesa dos atletas. Eu não via Zaca desde a manhã daquele dia, então o Zé era a pessoa mais próxima da escala da confiabilidade para me dar algumas respostas. Eu o peguei pelo braço e puxei para longe de todos. A última coisa de que eu precisava era os garotos populares sabendo que eu tinha sido feita de idiota por um riquinho, como eles.

— Lucas tem um irmão gêmeo? — perguntei, sem delongas.

José ergueu as sobrancelhas para mim, sem saber se "sim" era a resposta correta.

— Você não sabia? — disse — Todo mundo sabe. Eles são populares, principalmente entre as garotas. Quer dizer, o Natan é. Lucas está namorando há um tempo com uma garota da antiga escola dele.

Eu só precisava ouvir da boca de outra pessoa. Precisava tornar aquilo real.

E era.

Minha cabeça estava a mil. Eu queria poder ir para casa. Voltar para a minha vida de garota do interior, em Viveiro, onde novidades só acontecem uma vez por ano. Estava decepcionada comigo mesma, por ter sido tão facilmente enganada por um riquinho que estava se fazendo de coitado para brincar de amor de verão comigo.

Eu passei os dedos pela raiz dos cabelos, sem saber para onde ir a seguir. Eu não conhecia a escola inteira, e não estava a fim de dar de cara com Lucas em algum corredor.

Lucas, que mentiu para mim durante todo o tempo que nos conhecemos. Além de ser rico, ter um irmão gêmeo e uma namorada, o que mais ele escondia de mim? Será que eu ainda podia acreditar em alguma palavra que saía da boca dele? Como eu poderia confiar nele?

Eu tinha muitas perguntas a fazer e muita raiva para descontar. Uma saudade de casa tão imensa e avassaladora encheu meu coração e de repente todo o ar estava muito pesado. Eu tentei, tentei, tentei, mas eu não era mais tão forte quanto costumava ser. Lágrimas pesadas escorreram pelos meus olhos.

Lucas sempre desaparecia quando Natan estava por perto. Ou melhor, quando Lorena estava por perto. Ele provavelmente entrou em pânico ao saber que a namorada descobriria sua abre-aspas-traição-fecha-aspas, e deu sumiço em mim, que era a pessoa mais fácil de enganar.

Senti vergonha, e raiva de mim mesma, por me importar tanto com aquele garoto a ponto de chorar. E a pior parte, é que eu estava fazendo o mesmo, só que com Nicholas.

Eu também tinha optado covardemente pelo conforto de uma mentira.

Precisava dar um jeito de sair daquela escola, antes que perdesse o meu réu primário com Lucas Avelar, caso ele esbarrasse comigo segundos após eu descobrir suas mentiras em série.

Desci correndo as escadas para o pátio principal. Quem sabe o portão estivesse aberto, por ser intervalo. O pátio estava vazio, exceto pelo Professor Alan.

Ele estava um tanto ofegante e pálido, como se tivesse corrido mais do que estava acostumado para chegar até ali. As gotículas de suor que se acumulavam sem seus cabelos escuros não podiam ser só por causa do calor de Vitória. Alan Jordan parecia surpreso em me ver.

— Professor? — chamei, e ele tentou reunir forças para falar, mas não conseguiu. Eu o convidei para entrar e se acalmar um pouco.

— Não posso, Vale. — ele respondeu — Preciso encontrar os responsáveis por Zacarias Eifler imediatamente. É uma emergência.

— Posso te dar o telefone da minha mãe, ou do pai dele — eu disse, pegando o meu celular — O que está acontecendo?

— Aquela namorada dele não sabe explicar as coisas. Alan passou uma das mãos pelos cabelos como se quisesse arrancá-los. Me identifiquei: a namorada fresca do Zaca também me dava vontade de arrancar os cabelos. — O Zacarias teve uma espécie de crise convulsiva durante uma reunião do grupo de teatro. Tentamos tudo que pudemos na enfermaria, mas ele acabou desmaiando. Chamamos uma ambulância e agora ele está no hospital, internado. — ele sacudiu negativamente a cabeça tantas vezes seguidas que eu achei que ele também estava tendo um tipo de convulsão — Os médicos dizem que sua situação é grave.

Recobrei os sentidos, deixando os meus dramas de lado.

Zaca precisava de mim. Eu precisava agir.

Os minutos seguintes foram como borrões. Entrei no carro com Alan, ligando incessantemente para o meu padrasto. Chegamos ao hospital. Marcos já estava lá. Minha cabeça girava. Eu não estava conseguindo raciocinar direito, pedaços de conversas ficavam reprisando na minha cabeça.

"Estado grave."

"Valores sanguíneos alterados."

"Não reage."

Zaca não merecia isso. Ele era bom. Devia ser eu no lugar dele.

O que estava acontecendo com ele?

Contei até dez em voz baixa. Múltiplas vezes. No fundo da minha mente, podia escutar uma canção de ninar que meu pai costumava cantar para mim. Eu não conseguia manter a calma.

Os minutos se tornaram horas, e a exaustão me venceu. Eu acabei caindo no sono ali mesmo, na cadeira do hospital.

Onde Há FumaçaOnde histórias criam vida. Descubra agora