05.2 | ou ❝é um prazer, finalmente❞

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— Lola. Natan dirigiu-se a ela com sobriedade — Você não costuma andar tão bem acompanhada.

Ele segurou a mão de Lorena e beijou-lhe os dedos, num gesto arcaico que lhe caía perfeitamente bem.

Eu estava paralisada pelo som de sua voz. Pelos olhos azuis, familiares, me medindo de cima abaixo. Não conseguia superar o quanto ele era parecido com Lucas. Eu cheguei a cogitar que ele estivesse me pregando uma peça, mas sabia que o Lucas que eu conheço não entraria em um terno por nada nesse mundo.

— Não sabia que conhecia a Valéria. — disse Lorena, surpresa; tinha algo indetectável em seu tom de voz — Você também não costuma conhecer pessoas que são toleráveis.

— Bom, eu conheço você.

— Pobre garota do interior. — ela debochou — Acabou de se mudar e já conheceu a pior parte da cidade.

— Eu não moro mais aqui, lembra? — falou ele, como se Lorena soubesse o motivo de ele não morar mais em Vitória. Qualquer que fosse o motivo, isso fez Lorena se calar.

A tensão entre eles era palpável.

— Você não é daqui. Por isso não te conheço. — Natan se dirigiu a mim, que ainda estava congelada na mesma posição de quando ele tinha se aproximado — Qual é o seu nome?

— Valéria. — respondeu Lorena, sem o meu consentimento. Natan estendeu a mão para mim.

Minha vontade era arrancar a cabeça de Lorena, mas isso não seria muito promissor para nossa futura amizade.

Dei a mão a ele, mas em ver de apertá-la, Natan segurou meu pulso e me encarou com a expressão.

— É um prazer finalmente te conhecer, Valéria. Eu sou Natan, como disse antes. — ele se apresentou — Desculpe-me por ter esbarrado em você no jogo.

— Já é a trigésima vez que você se desculpa. — consegui dizer — Está perdendo o efeito.

Lorena soltou uma risada, feliz por eu ter dado uma dura nele. Por algum motivo, aqueles dois não se gostavam nem um pouco.

— Ele está dando em cima de você, caso não tenha reparado ainda. — Lorena falou, examinando as próprias unhas — Dou cinco minutos até ele te chamar pra sair.

— Vou embora antes que Lorena me mate de vergonha. — desviou-se Natan, embaraçado, recolhendo seu café enquanto suas bochechas adquiriam um tom rubro. Lorena tinha esse efeito nas pessoas. — Foi bom te reencontrar sem causar um acidente, Valéria.

Então ele acenou com a cabeça e saiu.

É um prazer finalmente te conhecer.

Eu escondi o rosto nas mãos, precisando de um minuto. Ele tinha o rosto do Lucas, mas era tão... diferente. Era mesmo assustador.

— Por que ele fica dizendo o meu nome o tempo todo? — perguntei para mim mesma em voz baixa, mas Lorena também ouviu.

Confundindo minha exasperação com interesse, Lorena disparou tudo o que sabia sobre Natan.

— Você não vai querer se envolver com Natan, confie em mim. Ele é obviamente bonito, é claro. E tem um jeito de príncipe encantado, todo formal e educado, sem mencionar que ele é tão rico que me faz ter vergonha de sair na rua, mas ele não vale a pena. É o maior cafajeste que eu já vi. — ela fez uma careta — Quando ele estudava no Sacré Coeur, todas as garotas eram apaixonadas por ele. Então ele saiu da escola porque o pai dele pressionou, e agora estuda nessa escola interna trilíngue em São Paulo. Dizem que ele já está treinando para herdar as empresas do pai. Por isso ele usa aquele terno. E ele só vem para casa nos feriados e datas importantes, eu mesma quase nunca o vejo, e sou vizinha dele.

É por isso que eu levei tanto tempo para encontrá-lo de novo, conclui.

— Não estou interessada. — falei, e ela duvidou.

Eu respirei, aliviada. Lorena afastou todas as minhas suspeitas de que eu estava delirando. Se Natan era mesmo tão rico, herdeiro de empresas, e estudava em São Paulo, provavelmente não teria ligação nenhuma com o Lucas. Era difícil imaginar aquele mauricinho perambulando pelas ruas de Vitória em uma caminhonete anciã e alimentando tartarugas, também. Tudo devia ser uma coincidência maluca.

O celular de Lorena tocou. Ela checou o visor e desviou a ligação.

— Onde está o seu amigo? Pensei que se encontrariam no Starbucks.

Tinha me esquecido completamente do meu encontro com Lucas. Peguei meu próprio celular, procurando por ligações ou mensagens. Nada.

— Acho que ele me deu o bolo. — a decepção na minha voz era audível.

— Namoradinho?

— Não ainda. — não sei por que eu disse isso, mas não contive um sorrisinho — Não. Não, não é meu namorado. — corrigi.

— Natan tem competição, então. — Lorena fez um aceno com a cabeça, e voltou a olhar para a tela do celular — Ele gosta disso.

Acenei a cabeça, incrédula. Lorena seria a companhia perfeita para mim na minha nova vida. Poucas seriam as perguntas incômodas que as pessoas que prestam atenção demais costumam fazer.

— Meu namorado acabou de me dar o bolo do século. — ela reclamou, voltando o assunto para ela — Eu juro, nessas horas ele é tão parecido com o Natan, que chego a pensar que estou como irmão errado.

Como é que é?

— Seu namorado é irmão do Natan? — tentei fazer a minha pergunta parecer displicente, embora cada nota da minha voz demonstrasse pânico e minhas sobrancelhas quase cobriam meus olhos de tão franzidas.

— Gêmeo.

Minha cabeça girou no próprio eixo. Controlei minha expressão, para não entregar o que eu estava pensando. Para que Lorena não fizesse a conexão que eu estava fazendo. Escolhi cuidadosamente as palavras:

— O irmão do Natan também estuda em São Paulo?

— Não mesmo. Ele nunca trocaria Vitória por outro lugar no mundo. — ela sorriu, e eu senti o chão se abrindo sob meus pés — Estou surpresa por não o conhecer. Ele estuda na sua escola.

Eu esperei por suas palavras como a uma facada. Lorena prosseguiu:

— Poucas são as garotas da Leonardo da Vinci que nunca caíram de amores por Lucas Avelar.

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