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Anny estava ocupada beijando o rosto do diretor russo quando Alfonso entrou no camarim depois do espetáculo, naquela noite. Ela vestia um roupão curto e vermelho, e ainda estava com a maquiagem pesada que usara para se apresentar no palco. Os cabelos continuavam presos no alto da cabeça em um penteado sofisticado, que usara para o segundo número, uma dança espanhola, quando trajara uma vestimenta muito sexy.

A platéia aplaudira entusiasmada, e Alfonso também.

Mas naquele instante entrava no camarim para encontrá-la aos beijos com o russo antipático que a insultara tanto poucas horas antes. Alfonso teve um súbito e absurdo pensamento sobre qual dos dois mataria primeiro.

- Desculpe a interrupção - falou em voz alta.

Anny voltou a cabeça com calma, o olhar brilhante, e sorriu.

- Alfonso!

Davidov passou um braço pelo ombro da bailarina e examinou o intruso com frieza.

- É este o empreiteiro? O que me odeia? Acho que agora me detesta ainda mais. Não gosta que eu a beije.

- Ora! Não seja bobo! - riu Anny.

- Não gosto mesmo - sibilou Alfonso.

- Que absurdo! Este é Davidov!

- Sei muito bem quem é. - Alfonso fechou a porta. Preferia não ter testemunhas do duplo assassinato. - Conheci sua esposa hoje.

- Sim, ela gostou de você e de seu filho. Eu tenho três filhos, um rapaz e duas meninas. - De modo provocador, o diretor de bale beijou os cabelos de Anny. - Minha mulher sabe que vim aqui no camarim cumprimentar esta bailarina. Ela foi maravilhosa, costuma ser perfeita e não a perdôo por ter me abandonado.

- Estou tão feliz! - disse Anny, esquecendo a dor terrível nos pés.


Davidov ergueu o olhar, em um gesto impaciente.

- Feliz! - resmungou com pouco-caso. - Como seu diretor, não me importa sua felicidade contanto que dance bem. Mas como seu amigo... - Beijou-lhe as mãos. - Fico feliz que tenha tudo o que deseja.

- Ficaríamos todos muito mais felizes se você se afastasse dela - disse Alfonso.

Anny franziu a testa.

- Ciúme é uma coisa horrível e, neste caso, sem sentido.

- Assassinato também é algo horroroso, mas neste caso faz sentido - sibilou Alfonso.

- Um minuto! - pediu Davidov. - Se vocês dois querem brigar, esperem até eu acabar de falar. Escrevi o bale Rosa Vermelha para minha esposa Ruth. E ninguém desempenhou o papel de Carlotta tão bem quanto Anny... depois de minha mulher, é claro.

Lágrimas inundaram os olhos de Anny.

- Obrigada.

- Estão sentindo a sua falta - disse Davidov, beijando-a na testa só para provocar Alfonso ainda mais. Depois voltou-se para ele. - Já a conheceu, portanto sabe que é um verdadeiro tesouro. E estou aqui com Anny porque também a considero um tesouro. Se tem olhos nessa sua cabeça deve saber do que estou falando, depois de vê-la dançar esta noite. - A expressão de Davidov adquiriu um brilho divertido. - Entretanto, no meu caso, se pego um homem beijando minha mulher, quebro as pernas dele. Sou russo.

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