Camila:
- Eu não sei mais o que estou fazendo, Dinah. Não tenho ideia do que ela está pensando... sentindo...
Talvez Dinah estivesse ficando cansada de escutar essas tantas lamentações repetitivas e orgulhosas e cheias de drama. Pode ser que, como amiga, ela esteja tentando passar um pouquinho de conforto sendo paciente comigo. Que pena, não funciona.
- Você já parou para pensar que está me falando as mesmas coisas que falou anteontem? - Perguntou sem olhar para mim, ocupava-se limpando o balcão de madeira da lanchonete. Talvez o seu prazo de paciência terminasse hoje.
- Não...
- Antes fosse anteontem, né? Faz quase um mês que você não sai dessa. Até mais de trinta e um dias, se bobear. Acho que perseguir pombos numa praça pública é mais produtivo do que qualquer coisa que eu tenha te falado durante todo esse tempo.
Um mês. Um mês desde o fim de tudo... os dias voaram.
- Você é a única pessoa que eu tenho aqui, tá? Só tem como desabafar com você!
- Camila, meu amor... - Dinah deixou seu pano de flanela de lado e se apoiou com os cotovelos no balcão, estando bem defronte comigo. É claro que vi um sorrisinho debochado formando-se em seu rosto. Ela pôs-se a falar: - ...diga, se você ia ficar desse jeito... Precisamos concordar que você está péssima, dá até dó... Por que é que terminou com a Lauren? Tudo bem. Eu sou sua amiga e quero te ajudar, mas você precisa se ajudar também, poxa! Volta logo com ela e para com...
- Não dá para voltar com ela, Dinah! - Vozeei. Ela virou os olhos e murmurou qualquer coisa, passou a mão no rosto como se estivesse exausta de ter que me ouvir. Ah, eu não a culpo.
- Eu nunca vi pessoa mais burra... Olhe para você! - Segurou minhas mãos. - Você só quer voltar com ela.
- Eu não quero voltar com ela, Dinah, mas que inferno!
Não, eu não estava mentindo. Voltar a namorar a Lauren não era minha vontade. Ainda não sou capaz (certeza, eu nunca serei) de imaginar um relacionamento sem confiança igual estava sendo o nosso. Não vejo nada certo quando entrego tudo o que é meu à ela e não recebo o mesmo em troca. O ato de confiar deve partir de dois, não só de um. Falta dela eu sinto sim, isso é óbvio, mas como todas as coisas tem um porém... Dias e mais dias sem falar com Lauren, evitando o menor que for o contato. O que sobrou parece ter sido nada.
- Juro, Mila... eu não entendo como vocês duas terminaram algo que nem tinha começado direito. Sei lá, meu. Vocês ficaram juntas o que? Um pouco mais de dois meses?
- Por aí, mas o que a gente já fez... hm... parece mais que dois meses. Você entendeu. - Era riu e eu tentei não acompanhar, fracassei. - ...Mas, mas a culpa foi dela. - Resmunguei.
- Você é cheia de colocar a culpa nas costas dela. Coitada da Lauren. Você deveria guardar a culpa dentro de si, quem sabe assim não dava um jeito de consertar todo esse rolo. - Dinah, outra vez, desviou sua atenção de mim e voltou a limpar o balcão. Agora eu acompanhava o movimento do seu braço sem prestar a mínima atenção, matutando o que dissera.
- É, mas não tem como eu ficar com a culpa quando a Lauren errou sozinha.
- Sozinha. - Riu-se. - Você só pode estar se fazendo de sonsa, desculpe. - Dinah virou as costas assim que terminou de falar, fora atender um cliente que havia entrado na lanchonete.
Sonsa? Ela só pode estar brincando. Esperei que voltasse e, quando voltou, a firmei. Dinah fingiu não ver que tinha alguém de olhos fixos nela. Pigarreei. Enfim encarou-me com a sobrancelha arqueada e toda cheia de aborrecimento.
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Live And Let Die
RomancePorventura, todos os caminhos por quais trilhamos estão traçados na palma das nossas mãos, e, quiçá, marcados nas calçadas invisíveis do espaço que se cruzam e por vezes se entrelaçam em tantas outras. Num emaranhado algumas dão nós, outras se torna...