Tempo amigo

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Lauren:

Na hora seguinte da briga minha com Camila, voltei ao hospital como se estivesse tudo bem. Fiz o máximo para parecer calma e disposta... não garanto que tenha conseguido. Depois daquele momento, odiei ter estado acordada por cada segundo que estendeu-se naquele dia. Conversei com Sofia outra vez, pedi para que não falasse sobre mim à irmã. Este pedido que fiz à ela foi o mais forçado a parecer inocente, assim eu não teria que dar grandes explicações. Não falei que Camila já não me namorava mais, não com todas as letras, só que acredito que Sofi tenha entendido bem. Sinto-me exausta fisicamente e psicologicamente. Julguei que nem mil tapas como o que levei de Chris seriam tão dolorosos e, sei lá... frustrantes, talvez, do que as coisas que Camila me disse.

As horas que se arrastaram até o início daquela noite me massacraram. E eu não chorei. Não chorei no carro a caminho de casa; Nem no banho; Nem no longo tempo que fiquei olhando o movimento da cidade pela janela transparente do meu quarto. Eu só pensei. Pensei que poderia ter sido diferente quando estive com meu pai... se no passado eu tivesse mais senso e ter tomado outras decisões, se eu não tivesse errado tanto. E então, talvez, teria sido diferente. Naquela noite eu pensei em meu pai, em tudo. Pensei nos meus irmãos e até em Aiden... em tudo. Eu pensei em Camila. Nossa, eu pensei demais nela. Foi sua escolha terminar nosso namoro. Escolha dela e culpa minha. Não constava em meus planos ter que acabar com tudo, assim, tão de repente. A gente ainda tinha de estar juntas. Eu preciso dela agora. Se ela soubesse o bem que me faz só por estar pertinho... Mas, apesar de tudo isso, eu não poderia descarregar em cima dela o que fiz e o que aconteceu. São aqueles mesmos segredos meus. Os que me fazem mal e, por isso, não devo espalhar por aí, esperando que amenizem. Só posso ver Camila como vítima nessa história toda.

Um dia depois, era quarta-feira, fui ao trabalho como faço todos os dias. Não havia mais nenhum vergão vermelho no meu rosto, mas não saberia contar em quantos pedaços estava despedaçado o meu coração. Tão clichê quanto real, doía. Foi difícil manter-me focada, sem pensar no que não queria. Eu só quis que tudo se ajeitasse; Que o tempo fosse amigo... eu sei que ele seria.

Tive a prova de que somos totalmente capazes de sentir quando há um par de olhos fixos em você. Pela manhã, quando entrei na sala habitual dos meus pacientes, Alejandro e Sinu, os pais de Sofia e Camila, estavam lá. Eles sempre aparecem no hospital neste horário. Foi Alejandro que notei ter ficado olhando para mim e, nas vezes em que olhei de volta, ele disfarçou sem pressa. Não era um olhar negativo nem nada, apenas me incomodou um pouco. Camila contou sobre nosso namoro para os pais e pelo jeito também contou sobre o término. Os dois foram simpáticos na hora de irem embora. Sinu sorriu e Alejandro disse um tchau.

E foi um dia normal à média do possível. Saí do hospital por um tempo na hora que Camila costuma chagar. Por ela. Eu sei que não queria me ver. Só voltei com certeza de não a encontraria lá. Soube que Camila estava meio triste e parecia até resfriada, palavras de Sofia. Mais uma vez reforço que não queria que terminasse assim...

Na quinta eu já não parava de pensar em Camila. Morri de saudades dela, da sua voz, boca, pele, tudo... A última coisa que queria era ter feito nosso amor tão novo se acabar. Então eu pensei: como vou fazer agora sem o meu amor? Talvez eu vá precisar de um tempo, tenho que lidar com o que passou. E sei que ela também pensa em mim... mas o que deixei de falar para ela não pode justificar um fim como este nosso. Apesar disso, queria pedir desculpas. Mas a fiz mal e sei disso. Pensei o tempo todo em Camila. Ah, era uma tortura interior; bem dentro do peito. Aí eu quis chorar mas não o fiz. Decidi ligar para o meu pai à tarde, na hora que tenho um tempo livre. Foi a primeira vez que falei com ele desde que nos vimos. Foi bom, mas não durou mais de vinte minutos. E outra vez eu voltei para o hospital na certeza de que Camila não estava mais lá.

Dia e noite eu encarava o celular, encontrava seu número nas últimas ligações, escrevia mensagens à ela. Pena, eu não tive coragem de ir até o final com esses. Eu queria o seu perdão, começar de novo. Tê-la outra vez. Mas deixei disso pensando nela. Ela precisava de um tempo.

Sexta-feira. Decidi que não ia mais sair do hospital para evitar um encontro com Camila. Também não a procuraria. Deixei levar. E na sexta-feira eu não a vi de novo. Então a semana passou. Mais um, dois e três dias. Descobri que ao mesmo tempo que evitei um encontro, ela também evitara. Quanta falta eu senti! Todas as horas de todos os dias eu encontrava uma maneira de lembrar-me. Em casa, achei uma pulseira de pano amarelo que é dela, tinha seu perfume fraco. Também escutei as músicas que Camila gosta ou que faz-me lembrar dela. A sua voz, vez ou outra, cantava na minha cabeça. Ah, sim. Ela me fez chorar. Sabia que uma hora eu deixaria de parecer tão forte. A sensação era que algo me consumia.

Outro dia, no hospital, aconteceu de me esbarrar com ela. Claro que, mais cedo ou mais tarde, isso iria acontecer. Quanta comoção. Camila olhara para mim com desprezo. Será que tinha raiva agora? Não me dirigiu a palavra nem por um instante. Tenho certeza de que se Sofia tivesse uma recaída, daria um jeito de buscar notícias sem a minha ajuda.

Mas que droga! Porque era tão difícil para ela entender que não tem o poder de estar sabendo de tudo da minha vida? As coisas não são assim, do jeito dela. Se tivesse respeitado quando eu disse que não sentia vontade e segurança de contar a ela o que se passa na minha vida toda, poderíamos estar bem. Continuaríamos o nosso namoro. Este tempo todo, desde que terminamos, eu tenho jogado a culpa toda em mim... Tudo bem, eu posso até ter errado. Porém agora eu vejo que Camila também fez mal assim que não aceitou minha escolha de ter segredos guardados. Do que isso adianta agora? Eu ainda a amo. Demais. Ela, no entanto, parece me detestar.

E não, eu não sou de ferro. O princípio me afligiu. Choveu dentro de mim, era um temporal. Eu me remoí e não a tenho mais. Eu chorei por causa dela, pela saudade que senti de seu abraço e beijo... O tempo não era tão meu amigo assim.

Outra semana se foi. Tão lenta quanto o despetalar de uma flor.

Live And Let DieOnde histórias criam vida. Descubra agora