Problemas hipotéticos

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Camila:

Hoje mais cedo fui ao hospital ver Sofia e quis aproveitar este tempo por lá para tentar falar com Lauren. Nem que fosse só um olá. De preferência, poderia ser um diálogo mais longo, concreto. Só queria vê-la; poder conversar. Acredito que ter escutado o que meu pai tinha a dizer para mim, ajudou (isso é um fato). E além disso, não era pedir demais. Querer falar com a minha namorada não é mesmo pedir demais... Ex-namorada, acho.

Porém, enquanto que na brinquedoteca eu me dobrava para tentar acertar o que minha irmã e os amigos dala imitavam jogando mímica, ficava mais agoniada por quaisquer dez minutos que corriam e eu não obtinha sinais de Lauren. Nem sequer a vi passar por aquela grande e colorida porta. Ela tem costume de estar sempre passando de um lugar para o outro no hospital. Só hoje... hoje ela não fez isso.

Então eu esperei. Acabei por passar mais uns minutos no hospital, mas mesmo assim, Lauren não apareceu. Pensei que, talvez, ela tivesse de folga hoje. Mas não tive a certeza, preferi não perguntar a ninguém se a doutora deslumbre se encontrava. Contudo, pensei que poderia ser bom ir ao seu encontro. Era provável que Lauren esteja em casa depois das nove horas se eu tivesse sorte dela não ter trocado o turno para à noite.

Depois daquele lenga-lenga de vou ou não vou, pedi as chaves do carro do meu pai e disse o que faria. Eu tive a aprovação dele, acho que poderia usar como motivação já que sei que, a qualquer momento, eu poderia desistir e voltar para minha casa se nem chegar ao meu destino. Tive medo de receber um belo de um esporro da Lauren caso ligasse avisando que estava indo ao seu apartamento, assim optei por fazer surpresa. O mistério para mim era saber se seria uma boa ou ruim surpresa... De qualquer forma, eu precisava tentar a sorte.

- Ela vai me ouvir. Não dará tudo errado. - Já que não tinha nem papai nem Dinah aqui para me motivar, usei foi a própria consciência. - Lauren vai me receber e conversar comigo... Preciso ficar tranquila agora. - Talvez a minha voz me deixasse maluca logo mais. - Droga, estou nervosa...

Não contei quanto tempo fiquei esperando no carro do lado de fora do prédio. Provavelmente, mais de dez minutos. Pareci aquelas crianças tontas que ficam treinando falas antes de pedir algo aos pais. É... Eu não sabia que causaria todo esse efeito. Tive medo. De repente todo meu otimismo se foi. Lauren tem total direito de nem abrir a porta do apartamento quando ver quem bate pelo olho-mágico (o síndico já não precisa me anunciar... a não ser que alguém tivesse decidido mudar as regras, o que é de se esperar). Por todos esses dias que passaram-se, eu não tive o bom senso de dizer nem meia palavra. Me arrependo de ter feito isso, que atitude mais imbecil. Não termina por aí: minha situação piora quando me coloco no lugar dela. Se eu fosse Lauren, juro que não aceitaria conversar com alguém que me ignorou durante um mês e mais uns dias. É sério.

Só que, ao mesmo tempo que estou ciente de que posso me dar mal nos próximos minutos, também acho que posso me dar bem. Talvez haja uma chance em um milhão. Eu sei que estou numa linda e bela confusão de ideias. É uma luta da perspectiva positiva contra a negativa.

Mas respirei. Eu tinha de fazer.

Parece que o ar pacato na rua conseguia chamar minha atenção. Eu já disse, sentia um medo. Anda, Camila, não seja tão idiota!

Daí eu abri a porta do carro. Legal, era um primeiro passo.

O síndico do prédio, que parecia não ter gostado de mim quando me conheceu há meses passados, não custou a sorrir quando me viu hoje. Logo desejou uma "boa noite" e abriu os dois portões. E no elevador, a cada número que subia no painel, meu estômago dava uma volta. Tinha um espelho que pegava toda a extensão da parede daqueles dois metros quadrados, me encarei por lá. Não só isso, eu pensei no que fiz. Que burrice a minha... Lauren poderia ter precisado de mim, mas decidi terminar (pensei nisso antes, mas, diferente de hoje, toda minha conclusão final era de que eu tinha posse da verdade e da razão, tolice minha). É nisso que resulta quando tomamos decisões sem pensar. Também as coisas que meu pai disse estavam pairando na mente, assim como ontem à noite. Minhas mãos suavam e há tempos eu não ficava assim por causa da Lauren. As portas do elevador abriram-se.

- Porque raios eu estou assim?! - Queixei-me pelo nervosismo. Era demais, que isso!

Mas é claro que me auto bronquear não ajudaria, logo apareceu outros problemas hipotéticos: Será que Lauren já estava dormindo? Ela não é de ficar acordada até muito tarde. Ou pior, e se tivesse viajado outra vez? Na primeira ela não disse nada para ninguém, não seria diferente agora. E eu não sabia que era tão pessimista assim.

Tudo bem, não dava para voltar atrás. Eu estava bem de frente com a porta do apartamento de Lauren. Sem mais delongas, toquei a campainha.

Outra vez...

E outra...

Mais uma. Ouvi um grito que pedia calma e a porta se escancarou, revelando uma mulher ainda menor que eu.

- Ah... Boa noite, Camila. Desculpe a...

- Tudo bem, Ally, sem problemas. - Não saberia dizer o motivo pela qual minha voz estava sendo produzida de forma trêmula. - Será que... É que eu queria falar com a Lauren.

- É, eu imaginei.

- Então, ela está acordada?

- Sinto muito, mas ela não está em casa. - Ally portava uma feição entediada, como se tivesse sendo incomodada há horas.

- Ela não está?

- Saiu faz um tempo.

De repente, nem dela e nem de mim saiu voz.

- ...E-e... Você sabe se Lauren vai demorar? Onde ela foi?

- Lauren morar comigo não quer dizer que eu saiba das coisas que ela faz, certo? - E um disparo de arrogância acertou bem na minha cara.

- Desculpa, eu...

- Só sei que ainda hoje ela volta. Eu digo à ela que você apareceu aqui, Camila.

- Tudo bem. - Acho que mais sem jeito do que fiquei nesta hora, nunca fiquei antes. Porque Ally me tratou de tal forma? Mulher prepotente... Não vi a hora de ir embora. - Obrigada. Tchau.

Não esperei ouvir uma resposta. Já estava no elevador.

Na hora seguinte, quando eu já estava em casa, nem me perguntava mais o porquê daquele jeito esquisito da Ally. Também nem me importava. Agora eu ansiava para que chegasse logo amanhã. Amanhã, quando eu encontrasse com Lauren no hospital, ela, sabendo que eu fui até sua casa procurá-la, falaria comigo. E por Lauren, só por ela, eu me redimiria. A quero de volta e vou matar minha saudade antes que esta saudade me mate.

. . .

Pena, no dia seguinte Lauren não falou comigo. Chegou a me ver lá no hospital com Sofia e também passou por mim toda apressada, não tive tempo de tentar pará-la. Pareceu tão indiferente. Então de imediato, pensei: ela sabe que eu estive à sua procura, Ally dera meu recado. E se sabia que eu a procurei na noite passada e não fez nada perante a isso, quer dizer que chegou a hora dela de ignorar. Lauren não deu a mínima importância... eu estava disposta a qualquer coisa agora para reconciliar, bastava ela dar a chance. Meia chance, que fosse. Mas hoje vi que não daria.

Eu cheguei no hospital numa grande expectativa. Uma esperança até maior que eu. Bem que soube que deveria ter mantido os pés não chão. Meu mundo pareceu desabar na hora que achei que poderia falar com Lauren, mas não. No primeiro segundo em eu a vi hoje, sorri. Sorri e esperei a sua contribuição (bela ilusão). Aquele foi o momento de sentir na própria pele o que ela pode ter sentido antes... eu bem me lembro de alguma vez, depois do nosso fim, Lauren me fazer um cumprimento, dar um sorriso. Fez isso umas vezes, eu não retribuí nenhuma.

Volto a dizer: era de se esperar a sua reação. Ter ido até sua casa não poderia suprir o que eu fiz esse tempo todo, fui injusta com Lauren...

Agora eu fico sem toda aquela esperança. Tenho de mesmo de vencer essa falta que a doutora deslumbre me faz? É, acho que é o jeito. Se Lauren tivesse prescrito me perdoar, toparia me ver, falar comigo. Principalmente depois de ter sabido por Ally que eu tentei encontrá-la. E que raiva de mim mesma! Mereço um tapa por ser tão burra.

Eu não sei se consigo passar mais tempo do que já passei sem Lauren. Sinto demais a falta dela. Seu cheiro, o abraço. O quão macia sua pele é... A ausência dela, seu sexo, timbre de voz. Tudo o que ela é, sem tirar nadinha. Vejo agora que Lauren tornou-se muito para mim e preciso dela demais.

Estar dentro desta dúvida é tão ruim... tão ruim. A dúvida é não saber se poderei ter Lauren outra vez.

Live And Let DieOnde histórias criam vida. Descubra agora