Garota milagre

265 12 0
                                    

Camila:

Sofia dizia que estava bem e que, se lhe dessem a chance, escalaria uma montanha usando uma só mão (palavras da própria). Falou também que sentia-se forte e a única coisa que poderia reverter sua situação era passar a noite de natal dentro do hospital, como um dia qualquer. Na véspera do feriado, Sofi cismou que precisava ir para casa comigo e com nossos pais para comemorar, nem que fosse só por meia hora, o natal. De zero à dez as suas chances estavam no... no quatro. Essa era a minha média e eu sempre fui otimista, detalhe.

Minha irmã não pediu, ela implorou. Queria mais que tudo que eu falasse com Lauren ou com Peter ou qualquer um dos médicos que cuidava dela. Acho que aquele era o seu maior desejo, acima de qualquer outro no momento. Eu não queria que houvesse muita expectativa da sua parte porque seria ruim se acontecesse como na minha média realista otimista. Eu juro que quatro era otimista.

- Se você pedir com jeitinho eles vão me liberar, Kaki. – (Pela décima nona vez) disse.

- E O que é pedir com jeitinho, Sofia?

- É meio que ser boazinha...

- Ah, é óbvio, entendi. É só pedir com jeitinho.

- Isso! – Seu sorriso esperançoso estava lá. – Eu tenho certeza que a doutora Lauren não negaria isso pra você.

- Eu não teria certeza disso, Sofi... pode não ser seguro te tirar daqui, você sabe. – Te fiz carinho no rosto e vi sua expressão de esperança sumir, mas logo voltou:

- Só que vão ver que estou legal e que posso escalar uma montanha usando uma mão só e aí me deixariam ir! Eles são legais e vão deixar! Por favorzinho...

Era bastante claro que minha irmã não sossegaria até saber que tentamos falar com algum dos médicos. O que ela queria era difícil mas não impossível. Sofia estava mesmo bem e forte, dava para ver em seu rosto; na sua inquietude. Prometi que iria falar com Lauren ou Peter (que, no meu ver, eram, com certeza, os mais propensos a liberarem a minha irmã). Se a pequena queria, é digno que nós tentemos. Refiro-me aos nossos pais. Só eles podem assinar para Sofia sair daqui. Agora é de tarde, estou certa de que pela manhã minha mãe e meu pai ouviram tudo que acabei de ouvir.

- Você promete, Kaki? Promete que vai tentar?

- Disse que te prometo, Sofi, mas não crie tantas expecta...

- Olá, doutora Lauren!!! – Gritou minha irmã olhando atrás de mim. Ela faltou pular da cama onde estava sentada. – A Camila quer te falar uma coisa, escuta ela, tá?

- Ok... – Lauren não tinha ideia do que se passava.

- A Sofia quer passar o natal fora daqui... ela quer ir pra casa, só isso, Lauren.

- Você não pediu com jeitinho, Kaki!

- Ah, é... – Fiz uma cara trágica-não-exagerada e voltei atrás: – Lauren, meu amor, a Sofi quer ir pra casa hoje e eu ficaria muito feliz se você a liberasse. A gente te ama e sabe que você é um amorzinho de médica e de pessoa e vai fazer o que estamos pedindo, não é?

- É? – Lauren ainda não estava 100% dentro do assunto.

- É, doutora. Diz que sim. Por favor?

Lá estava a doutora deslumbre olhando para mim, olhando para Sofia, para mim, para Sofia. Eu sabia que ela não tinha uma resposta concreta, assim como havia previsto. Sorriu como quem não tem o que dizer ou como quem foi pega de surpresa. Ao olhar para o seu rosto, eu pensei que Sofia poderia ter perdido suas esperanças, mas não. Claro que não.

Live And Let DieOnde histórias criam vida. Descubra agora