Não mais mistérios

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Camila:

Não existe possibilidade de ficar louca quando se leva uma pancada na perna.

Se eu tivesse batido com a cabeça no chão, levaria em consideração qualquer tontura ou doideira da minha parte. Porém eu quase que não toquei a cabeça no solo, tive certeza disso... Lauren havia me chamado de amor, tive certeza disso também. Não ouvi errado, não imaginei coisa. Aconteceu. E quando aquela palavra saiu de sua boca, meu corpo parou e a voz falhou. Tudo havia, de repente, ficado quieto. Uma quietude inconsciente, diria.

Eu, idiota que sou, curti sem mostrar emoções sua forma de me chamar, apesar de ter explodido por dentro. Amor... Sei que Lauren não percebeu o que havia dito. Foi seu costume, ela sempre me chamava assim.

Mas agora, já bem recuperada desse choque bom que foi seu afeto volúvel, eu estava no seu carro a caminho de casa. Pode ser que não esteja tão recuperada assim, admito... Lauren, por outro lado, não estava inquieta (como eu) por estar ali ao lado, tão perto de mim. Contudo, seu rosto era sério. Senti-me mal. E não se ouvia palavras nem música nem transito. Ela pilotava o carro a, no máximo, 50 quilômetros por hora nas ruas largas de Miami. Me entristeci então quando lembrei de que Lauren não me dera uma segunda chance, mesmo que eu tivesse ido até sua casa para mostra-la quão necessária é na minha rotina; na vida. Não a culparia, deixei de ser tão covarde.

Mas aquele silêncio nosso... Aquele silêncio me corrompia. Íamos mais fundo àquela bagunça. A separação. Esse espaço enorme entre nós, o tempo que não demorou a passar. Na última vez que estive em seu carro, brigamos. Ela não se importou em discutir e manter-me lá. Eu não queria ter ido embora... isso não precisava ser assim. Preferiria estar cheia de hematomas a não tê-la mais. Sou rejeitada agora e ciente de que busquei por isso todas as vezes que fingi sua inexistência. Penso sozinha. Sou uma pedra.

Tão quieto. Essa ausência de som chegava a perturbar. Que tivesse cuspindo sangue; rasgando a pele; quebrando os ossos. Nada dói tanto quando o silêncio de duas pessoas que têm tanto a dizer. Preso à garganta guardava um tudo. Vamos, Lauren! Diga alguma coisa. Qualquer coisa...

Esvaziei os pulmões. Ela não disse nada até agora e também não iria dizer. Eu fiz:

- Tudo dói menos que o silêncio.

A encarei. Seu maxilar estava preso e as sobrancelhas juntaram-se.

- Tudo dói menos que a sua rejeição.

Sua resposta veio feito uma rajada das fortes, sem medir palavras.

- Lauren...

- Você também errou, Camila. Sabe disso.

- Sei disso. E sei que ainda há algo de mim aí em você... assim como há aqui. - Coloquei a mão sem ferida no peito. Não falei nada em vão, estava certa de tudo aquilo. Não obtive respostas suas e continuei: - Sinto muito a sua falta e agora vejo meu erro.

- Esperei tanto, Camila.

Daí a garganta começou a fechar e brotaram pequenas lágrimas nos cantinhos dos meus olhos. A voz saiu embargada:

- Me perdoe, Lauren. - Vi que o carro fez a curva oposta da rua onde eu morava. Ela queria ouvir o que eu tinha a dizer. - Eu sei que... que fui uma babaca por ter feito o que fiz mas tudo o que quero é seu perdão.

Contei quanto tempo ela levou até dizer e nunca pensei que quatro segundos demorariam tanto quanto aqueles. Lauren não me olhava.

- Sua perna ainda dói?

- Para...

- Ok. - Suspirou pesado e levou a mão no rosto. Sem delongas, começou: - Não vou te deixar com toda essa culpa. A gente errou por igual e você também precisa me desculpar. - Quando fui responde-la, ela fez um sinal para que eu a esperasse terminar. - Você não respeitou meu tempo, quis brigar justo num péssimo dia e depois fez questão de não falar comigo. Mesmo sem saber de nada. Tudo bem que, como sua namorada, eu precisava confiar em você... te escondi meus segredos e tal, mas eu só queria ter meu tempo respeitado, sabe? Você iria saber de tudo se tivesse esperado. Mas olha só no que deu. - Ela parou de falar e eu não sabia se continuava ou se só me calava. Lauren, ainda séria, olhou para mim. - Camila, você tentou sair decidida da minha vida. Disse que era uma loucura e... e aquilo não era bem o que eu queria ouvir.

Live And Let DieOnde histórias criam vida. Descubra agora