A manhã de segunda foi bastante calma. Almoçámos lá em casa novamente. Poderíamos ter ido embora mas, visto que iríamos fazer o trabalho naquela tarde, não valia a pena. O almoço estava ótimo e tudo parecia estar a correr bem. Aquele fim de semana estava a ser perfeito, perfeito de mais para ser verdade...
Como acabei por ficar lá em casa sem ter planeado nada, não tinha o meu computador mas o Adam emprestou-me o dele e ficou a pesquisar a informação no tablet. Estávamos no quarto dele, prontos para fazer o trabalho.
-Vá Adam! Temos de fazer este trabalho hoje!
-Tem mesmo de ser?- perguntou ele fazendo olhinhos de cachorro.
-Tem, sim! Temos de entregar amanhã!- disse eu, no meio de risos.
- Então, tu procuras a informação e dizes o que é para escrever e eu escrevo. Pode ser?
Pensei que, para alguém que se tinha recusado a fazer o trabalho, até estava a trabalhar muito e por isso aceitei.
Algumas horas se passaram e, estando o trabalho quase terminado, levantei-me para esticar as pernas. Andei um pouquinho pelo quarto, toquei em alguns livros da estante dele, sem nunca pegar em nenhum. Limitei-me a ver as capas e, como nenhuma era apelativa decidi nem pegar neles. Fui até à secretária onde ele tinha espalhadas algumas folhas, cadernos e livros escolares. Abri o caderno que estava mais ao meu alcance e contemplei a escrita dele. Nunca a tinha visto antes mas, de certa forma, já tinha visto. "Estranho", pensei.
Voltei a sentar-me, ainda com aquele pensamento. Aos poucos, pequenos pedaços se juntavam no meu cérebro. Olhei para as horas e, vendo que eram quase 5 horas da tarde, fui dizer à minha irmã para arrumar a mala dela. Acabámos o trabalho muito rápido e, sem pensar duas vezes, fomos lanchar. Miss Potter fizera crepes. Que delícia! Saio desta casa com mais uns 20 quilos do que o que entrei...
Enquanto comíamos, não conseguia parar de pensar na letra do Adam; de como eu tinha a estranha sensação de que já a tinha visto antes. De repente, um arrepio passou pelo meu corpo. Tinha juntado as peças do puzzle. Agora tudo fazia sentido, bem, quase tudo. Fiquei um pouco tonta e tive que me sentar. Não acreditava naquilo. Não podia ser...
-Estás bem?- perguntou Adam enquanto punha a mão no meu ombro. Instintivamente senti repulsa.- pareces um bocado pálida.
-Estou, estou- menti- lembrei-me só de que os nossos pais vão chegar daqui a nada a casa e nós temos de ir andando.- precisava de sair dali o mais rápido possível.
-Já? Mas nem acabaram de lanchar!- respondeu ele, meio desconfiado.
-Sim. Já. E já devíamos estar a caminho. - continuei, sempre tentando manter a farsa o mais real possível. De certo modo até que era verdade. Os nossos pais estariam em casa a qualquer momento e nós tínhamos que regressar.- Foi muito bom passar este fim de semana aqui convosco.
-Foi um prazer tê-las cá.- disse amavelmente Miss Potter enquanto nos abria a porta da rua.
-Temos de fazer isto mais vezes- disseram as gémeas ao mesmo tempo enquanto abraçavam a Sarah.
-Sim...Temos de repetir. - disse o Adam, de uma forma carinhosa enquanto passava a mão pelo cabelo castanho-escuro.
Saímos de casa e, quando chegámos à nossa casa, fui direita para o meu quarto, pronta para stressar, ficar furiosa, humilhada e para chorar.
Peguei no livro que tinha encontrado no coreto do lago. Abri com medo e, sem hesitar, desatei a chorar. Era ele. O Adam. O meu Adam era o Adam dono do livro. Um Perseguidor. Que outra explicação haveria para isso acontecer? Se calhar era um assassino. Procurei as moradas e, nenhuma delas correspondia a uma casa ou local onde seja possível alguém viver. Eram sempre campos, lagos, florestas, poços, moinhos, grutas e coisas do género. Se fosse só isso... mas não; havia ainda os nomes. Não podia ser apenas um caderno com a morada daquelas pessoas, de amigos dele. E se ele as tivesse matado e aquelas moradas eram onde ele tinha enterrado os corpos?
Comecei a a stressar bastante e a pensar nos meus amigos, na minha família, em mim. E se ele se ter aproximado de mim fosse uma farsa para depois me poder matar? E se tivesse sido uma mentira desde o início? Os beijos, os passeios, as fotos. Foi tudo uma mentira. Estava tudo a correr bem de mais para ser verdade... eu sabia. Senti vontade de chorar ainda mais mas as minhas lágrimas já não corriam. Os meus olhos estavam vermelhos e inchados. Senti medo. Medo por aqueles de quem eu gostava. Medo por aqueles que seriam as vítimas do Adam. Medo por mim. Nunca antes tivera sentido medo assim. Não apenas porque eu poderia ser a sua próxima vítima mas porque tinha um medo incrível de começar a ter sentimentos maiores do que a amizade estranha que nós tínhamos.
Tinha muitas perguntas mas, para mim, uma coisa era certa: o assunto Adam na minha vida estava encerrado. Para sempre.
Pousei o caderno e, com a maior força que consegui arranjar fui até à casa de banho, tomei um banho relaxante e pus creme na cara. Passei base e corretor de olheiras. OS olhos inchado não se notavam tanto. Pus os óculos em vez das lentes de contacto como sempre fazia quando estava em casa. Pelo menos assim não se notava tanto os olhos inchados. Se alguém perguntar, era porque tinha bastante sono e os olhos vermelhos era porque me doía a vista de ter lido demasiado ou de ter estado demasiadas horas com as lentes de contacto. Ninguém suspeitaria dessas desculpas pois eram bastante normais.
Vesti o meu pijama: as minhas meias compridas, os calções pretos e fui até ao armário e tirei uma camisola que costumava ser do meu irmão, até ele se ter fartado dela, e por isso me estava enorme.
Desci as escadas e vi os meus pais na sala. Fui até eles e abracei-os. Nem notaram que eu estava com os olhos vermelhos. Tivemos uma noite agradável em família e depois fui para o meu quarto. Preparei a minha mochila para o dia seguinte, vi as previsões metrológicas e escolhi uma roupa com base nisso. Estava a prepar-me para ir dormir quando alguém bateu à porta, com um toque bastante conhecido:
- Tum, tum- tum, tum, tum, tumtum.- só podia ser o Simon.
-Podes entrar- disse eu, enquanto me sentava na cama.
-Oi maninha.- disse ele.
-Oi maninho.- respondi no mesmo tom de voz.- Precias de alguma coisa Simon?
-Sim. Quero saber o que se passa contigo.- disse ele num tom preocupado. Não consigo esconder-lhe nada que ele repara em tudo!
-Nada- respondi eu, forçando um sorriso.
-Preciso que sejas sincera comigo. Sabes que não tens de me mentir- disse. Não conseguia fazer com que ele se preocupasse assim e, por isso, decidi contar-lhe a verdade. Mais ou menos.
-Pronto está bem... Então é o seguinte: acho que comecei a ter sentimentos por uma pessoa por quem eu não devia ter e isso está a ser muito difícil porque eu não quero ter mais nada a ver com essa pessoa depois do que eu descobri sobre ela. Percebes?
-Percebo. Mas o que descobriste tem fontes seguras? Porque se não podes estar apenas a magoar o teu coração Lia.- disse ele, num tom meio filosófico, meio preocupado.
- Tenho. Vi com os meus próprios olhos. E, que eu saiba ainda não estou maluca... tenho a certeza.
-Gostava de poder ajudar mais mas se o assunto é esse, não há nada que eu possa fazer. Lamento.
-Não faz mal Si. Apenas falares comigo e te preocupares é o suficiente.- disse eu com um sorriso meio desmaiado.
-Obrigado. Mesmo assim gostava de poder fazer mais. Não gosto de te ver sofrer, muito menos gosto de te ver chorar. - e abraçou-me.- Boa noite maninha. Dorme bem.
Começou a sair do quarto e, mesmo antes de fechar a porta, voltou a abri-la, virou-se para mim e disse:
-Não estou a duvidar do que tu disseste mas, tenta perceber que nem sempre o que vemos é a verdade. Por vezes é apenas o que queremos ver.- e saiu do quarto. Pensei naquelas palavras o resto da noite, acabando por dormir menos do que eu esperava.
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Romance Proibido - Livro 1
General FictionNum mundo onde os Humanos convivem com outros seres, um amor proibido nasce entre Merlia e Adam. Mas não são regras e proibições que os vão impedir de fazer o que o coração manda... Onde os elementos Ar, Água, Terra, Fogo, Tempestade e Místico fazem...