Capítulo IX - ... já viajô para o outro mundo...

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IX... já viajô para o outro mundo...

Preto véi vai zi tirá este mal olhado de sucê... viu zi mifia. O companheiro da nega veia tá fazendo puladô de cerca.. Vô amarra ele p'rá vosmicê. Segura cá na mão do nego véi...zi segura firme, zi mi fia... segura .... firma pensamento naquele safado.... firma zi fia.... vou fazer seguradô agora. Hirra....hirra. Firma pensamento zi mifia..firma...

Oia Zimifia seu companheiro tá com fluídos da Pomba Gira. Aquela nega sem-vergonha mandou fazê trabai de mato pra ele. Num sumiu nenhuma camisa suja dele não? Preto véi tá vendo aqui uma roupa dele enterrada no pé do cruzeiro da cidade dos mortos. Sucê vai tê de mandar arrancá esta camisa. Na sexta-feira, depois da meia-noite arguém de corpo fechado vai tê de i lá....sucê qué devorvê o mal p'ra ela, zi mi fia?Qué?...

─ Não, Pai Tupi. Só quero meu marido de volta.

Pensa. Zimifia.. pensa.... Se quisé fala p'rá quem fô lá, pra trazer um pouco da terra de uma morada antiga de arguém que já viajô para o outro mundo, para o preto véi fazer despachadô...

─ Mas, pai Tupi eu tenho medo de cemitério... Ainda mais de noite. Quero meu marido.... mas..

Num precisa fica assim não, zimifia... Fala com o cavalo do preto véi que ele faiz p'ra sucê....

Contar aquelas passagens dos trabalhos espirituais que tinha assistido parecia dar um prazer incomum para Loni. Os olhos da mulher brilhavam como se estivesse contando uma história real da qual era a personagem principal. Se o delegado quisesse, provavelmente iria ter assunto o dia todo. O interrogatório deveria parar por ali, senão ela poderia até entrar em transe. Aí sim, seria preciso chamar um pai de santo para resolver.

Vendo a história descambando para outros assuntos, procurou mudar o rumo da prosa, trazendo para o objetivo da conversa, ou seja: descobrir pistas do assassino. Sem ofender a testemunha, interrompeu sua narrativa, quando ela se dispunha a contar outra passagem. E dali para frente fez perguntas diretas sobre o assunto, pedindo respostas curtas. A mulher falava como um rádio na hora dos reclames. Precisava nortear a conversa.

─ Tem alguma relação entre as mortes e o trabalho daquela noite?

─ Era um trabalho pesado, mas depois eles ainda iam beber vinho de jurubeba. A função terminou mais cedo, dona Zélia tinha de completar a parte dela antes da meia-noite. Não sei se houve alguma relação entre uma coisa e a outra.

─ Você ouviu ou percebeu alguma discussão entre a família na noite do crime?

─ Eles ultimamente brigavam muito. Parece que Júlio e Marcola não estavam conversando um com o outro. Mas não os vi discutindo.

─ Depois do crime você viu Carmelita ou Grampola?

─ Não. Ouvi dizer que Carmelita está viajando para Goiatuba, uma cidade do interior. Os pais dela moram lá. Ela nem veio ao velório, havia saído cedinho naquele dia que o senhor esteve lá buscando os corpos. O Grampola, só o vi hoje quando estava chegando na delegacia. A firma dele estava fechada desde o dia do crime.

─ Quem disse que eles estavam viajando?

─ Não me recordo.

O delegado deu por encerrado o depoimento da mulher, agradecendo-lhe a presença. Avisou que possivelmente falará com ela dentro de alguns dias. Em seguida, passou a analisar as possibilidades dos acontecimentos. Pelo visto havia um relacionamento suspeito dos interrogados com os mortos. Talvez apenas Maricota não soubesse daquele quadrado amoroso, entre Marcola, Julio, Grampola e Carmelita. O primeiro se passava por homem heterossexual, entretanto desmunhecava e tinha um caso com os outros dois. Carmelita deveria ser uma pervertida e aceitava a história em troca do emprego. Passeava da cama de Marcola para a de Julio, com a leveza de uma pluma e a rapidez de uma pulga.

Este relacionamento moderninho poderia gerar ciúmes nalgum dos quatro. Precisa esmiuçar melhor a história, para ver se tinha alguma coisa a ver com as mortes. Faria uma visita de surpresa na tal firma de poços artesianos e saberia quais as obras executadas onde houve participação dos parceiros de orgias. Resolveu marcar para o dia seguinte esta visita inopinada.

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macumba - o terreiro da morteWhere stories live. Discover now