CAPÍTULO 45

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A mulher estava um lixo. Folhas e sujeira coladas nos cabelos, na saia, dando a impressão de que passara uma semana andando a esmo pela mata.
- Então, deixa eu ver se entendi direito - disse T. John, com Sunny sentada à sua frente, segurando um chá de ervas e esperando pela refeição que o detetive havia pedido para ela. - A senhora acendeu a fogueira para fazer contato comigo. E foi por isso que acendeu as outras fogueiras que encontramos na mata.
- Foi. - Ela tomou um gole da xícara, como se fosse desmaiar. Recusara atendimento médico apesar das queimaduras nas pernas.
- Da próxima vez, a senhora use o telefone. A AT&T é bem mais segura do que um incêndio florestal.
Não iria escutar sermões, ele podia ver isso em seus olhos. Sunny falava de forma confusa de novo, metade do que dizia num tipo de língua nativa americana, o resto em inglês. O que ele podia perceber era que ela estava com medo.
- Ele será ferido, talvez até mesmo morto - disse ela, a voz trêmula, os olhos escuros marcados pela dor.
- Quem? O seu filho?
- Os dois! Buddy e Brig.
- Agora, espere um minuto. Achei que a senhora tinha entendido que Brig está morto - disse, sabendo que teria que chamar os médicos do hospital de onde saíra e interná-la de novo. Ela estava completamente fora da realidade e, embora não parecesse estar sentindo dor, suas pernas estavam em petição de miséria. Largou a xícara, o chá quente espirrou em seu colo, mas ela não pareceu notar, apenas fechou os olhos e balançou para frente e para trás, numa espécie de transe. O que deixou T. John nervoso. Levou a mão aos cigarros. Havia visto muitos charlatões em sua época. Charlatões que levavam as pessoas na conversa para lhes extorquir dinheiro, dizendo que eram paranormais, mas apenas poucos eram videntes, e esses eram assustadores... muito assustadores. Ele não gostava do fato de alguém ver a droga do seu futuro. Sunny podia muito bem ser uma dessas pessoas. Ou então era maluca... comprovadamente maluca.
O cântico estridente era mais do que ele podia aguentar. Acendeu o cigarro e sentiu a fumaça espiralar confortavelmente em seus pulmões.
Uma batida à porta anunciou a chegada da comida da lanchonete ali ao lado, sanduíche de presunto e batatas fritas, mas Sunny parecia não notar, simplesmente continuava a cantar. Os nomes Brig e Buddy apareciam várias vezes. Repetidas vezes. Mas nunca o de Chase. Nem uma vez o de Chase.
- O que é isso? - perguntou Gonzales, olhando fixamente para ela.
- Ela está fora de si. Acha que os filhos estão em apuros, mas, veja só, não está preocupada com Chase. Só com Buddy e Brig.
- Achei que Brig fosse Baldwin.
- Era. - T. John pegou metade do sanduíche e deu uma mordida. Mal sentiu o gosto do presunto, da mostarda ou das cebolas porque sua mente dava mil voltas, como rodas dentadas correndo cada vez mais rápido. Pela primeira vez, entendeu.
- Cacete! - Sentiu um arrepio, como se um dedo gelado escorregasse por sua espinha. - Não está achando que demos a certidão de óbito ao McKenzie errado, está?
- O quê? Está maluco? - perguntou Gonzales, até que se virou para a velha.
T. John pôs-se de pé.
- Peça a Doris para entrar e ficar com ela, pois nós vamos ter uma conversa com McKenzie.
O cântico cessou.
- Estou indo com vocês. - Na mesma hora, Sunny ficou tão lúcida quanto ele. Droga, será que a porra daquele cântico paranormal sem sentido significava algum tipo de ação?
- De jeito nenhum.
- É sobre os meus filhos que estamos falando, Detetive. Meus filhos. A vida deles está em perigo, e eu irei com o senhor. Agora, não vamos perder mais tempo. - Pegou a malfadada bengala e enfiou um sanduíche inteiro dentro do bolso antes de se dirigir à porta. No corredor, parou de repente: - Ai, meu Deus... tarde demais. - Ficou com o olhar parado à frente, e o rosto torcido de pavor. - Ai não, não, não! Brig! Brig! - Começou a gritar desesperadamente, e T. John chamou ajuda.
- Levem-na para o hospital, agora! - gritou, assim que a oficial Doris Rawlings correu à sua mesa.
- Não! Ai, meu Deus! Estão colocando fogo. Queimando! - Estava soluçando e gritando histericamente. T. John sentiu-se como se o diabo em pessoa tivesse entrado na sala.
- Cuidem dela! - gritou para Doris, apontando para Sunny. - Estamos indo à casa de Chase McKenzie. Talvez precisemos de reforços. Ligarei se for o caso.
- Certo. - Doris aproximou-se de Sunny, que estava chorando, arranhando as paredes e o próprio corpo como se estivesse sentindo dor.
- Morte... ele vai morrer. Meu bebê vai morrer!
T. John deixou-a e saiu correndo pelo corredor. As botas produziam um ruído alto, e ele já estava ofegante, seu interior calejado ficando mole como água. Deus do céu, ela era assustadora com todo aquele cântico sem sentido, vestido queimado, cabelos grisalhos e olhos tão assustados como se tivesse visto o diabo em pessoa: T. John Wilson estava tão aterrorizado como nunca estivera na vida! Abrindo a porta, saiu correndo para a viatura com Gonzales em seu encalço. Ligou o tom mais alto da sirene.
- Merda, cara, o alarme de incêndio! - alertou Gonzales, e T. John ouviu então o estrondo alto das sirenes e, ao olhar para o leste, na direção das montanhas, viu o brilho das chamas alaranjadas acender a escuridão.
- Entre! - gritou e ligou o motor, engatando bruscamente a marcha a ré antes de Gonzales chegar até mesmo a fechar a porta. Com uma sensação de pavor, saiu da vaga, a sirene da viatura berrando, as luzes piscando.
Sem dúvida, Sunny estava certa. Ele já estava atrasado demais.

O último gritoOnde histórias criam vida. Descubra agora