Crack!
A dor explodiu na nuca de Brig. Sua cabeça estalou. Ele caiu da moto. O rosto bateu no cascalho pontiagudo. A Harley, com o motor ainda ligado, escorregou pelo caminho de carros, parando na cerca. Ele sentiu gosto de sangue e não conseguia enxergar.
- Onde ela está? - A voz de Jed Baker foi registrada em algum lugar além da dor latejante em sua cabeça.
Brig lutou contra a sensação de desmaio. Tonto, ergueu o olhar. Jed estava acima dele, sua silhueta aparente pela luz rarefeita que saía da janela do trailer. Ofegante, o rosto, uma máscara de ódio, foi ríspido com Brig. Seus dentes cintilavam sob a luz fraca, tinha um bastão de beisebol numa das mãos carnudas.
- Angie. Onde ela está?
- O que você tem a ver com isso?
- Você vai me falar, seu mestiço idiota. Onde ela está?
Brig tentou levantar-se, mas ainda estava tonto.
- Não é da sua conta.
- Você está querendo dizer que não é da sua conta. Deixe-a em paz. Está me ouvindo, camarada? - Jed desceu o bastão com força. Brig rolou para o lado. A arma arranhou seu ombro e caiu no chão. - Você não está entendendo, não é? Ela é minha!
- Talvez fosse melhor você contar para ela. - Brig rolou até ficar de quatro, mas o bastão o atingiu em cheio nas costas, batendo em sua espinha. A dor irradiou por sua coluna, estourando no cérebro. Ele caiu de joelhos. O cascalho lhe cortou o jeans.
Jed riu e respirou pela boca, o ar passando por entre os dentes.
- Você fique longe dela, seu babaca.
Pondo-se de pé num piscar de olhos, Brig ficou furioso. Virou-se rapidamente, envolveu com firmeza os dedos no cabo do bastão e deu um chute que acertou Jed na virilha.
Com um grito, Jed caiu no chão. Brig arrancou o bastão de suas mãos e começou a balançá-lo.
- Ei, cuidado aí!
Pow! O bastão tremeu nas mãos de Brig quando o acertou com força no ombro de Jed. Jed gritou como um gato atingido por um tiro e cambaleou para trás. Crack! O bastão atingiu suas costelas, quebrando algumas. Outro grito medonho.
- Porra, McKenzie, eu vou denunciar você! - Brig não deu importância. Crack! Amassou o nariz do rapaz. Com um grito animalesco, Jed caiu com força no chão, as mãos sobre a boca e o nariz, chorando como um bebê, implorando que Brig parasse, com o sangue jorrando por seus dedos carnudos, que tentavam manter o nariz no lugar.
- Você merece, seu arrogante filho da puta! - Ofegante, com o suor escorrendo pelo rosto, Brig ia acertar mais uma vez o bastão na cabeça de Jed, com a intenção de fazê-lo calar-se para sempre.
- Pare! - A voz de Sunny ecoou na escuridão. - Brig! - gritou com voz de comando. - Pare com isso agora!
As primeiras gotas de chuva caíram do céu.
Os dedos de Brig estavam apertados no cabo de madeira molhada.
Jed encolheu-se e balbuciou:
- Você não pode fazer isso! Não pode! - Estava gritando, soluçando histericamente. Havia urinado nas calças, o sangue lhe escorria pelo nariz e pela boca. - Seu idiota. Seu idiota filho da puta.
Brig soltou o bastão.
- Dê o fora daqui!
Sunny desceu correndo os degraus e encarou os dois rapazes. Seus cabelos longos, negros, com alguns fios grisalhos, ultrapassavam os ombros, e seu roupão comprido balançava ao sabor do vento.
- Vou chamar uma ambulância.
- Não! - Jed se levantou cambaleante, quase caiu, mas, de um jeito ou de outro, conseguiu ficar de pé.
- Você está ferido. Os dois estão.
- Não preciso do seu tipo de ajuda... de nada dessa bruxa de merda. É tudo uma farsa - escarneceu, as lágrimas escorrendo de olhos que já estavam ficando negros. - Vou falar com o xerife e vou denunciar você, McKenzie. Você não pode sair por aí atacando as pessoas.
- Experimenta - sugeriu Brig.
- Isso, experimenta - disse Sunny e, antes que Jed pudesse reagir, ela lhe segurou a mão com força.
- Me deixa ir embora... - O rapaz tentou se desvencilhar.
Uma luz estranha assaltou seus olhos.
- Isso, vá e conte para as autoridades, que eles vão saber a verdade. Sobre Brig. Sobre você. Sobre Angie Buchanan... Este sangue - Sunny limpou uma gota de sangue do queixo do rapaz - irá provar que você é um mentiroso. - Sua voz falhou e depois adquiriu um tom agudo, quando começou a entoar um cântico em um idioma que Brig suspeitou ser o cherokee, mas que não conseguiu distinguir, quando ela fechou os olhos e começou a balançar para os lados, no ritmo da ladainha repetitiva.
Jed tremeu e seus olhos se fecharam, cheios de medo.
O cântico continuou, e ele pareceu prestar atenção.
- Me deixe em paz, sua bruxa! - gritou, os olhos quase saltando da órbita. - O que ela está fazendo comigo?
- Não sei, mas parece uma praga - respondeu Brig, gostando do jogo. A mãe estava zombando de Jed, e o garoto merecia.
- Me deixe em paz!
O cântico continuou, mantendo-se alto acima do vento que se adensava, que soprava as primeiras folhas secas em volta de seus pés e silvava acima do ronco do motor da motocicleta, do jeito como estava, caída, a roda girando no cascalho.
Jed desvencilhou-se e caiu num buraco que Chase deixara de preencher enquanto ajeitava o caminho de carros. Levantou-se com dificuldade.
- Vão para o inferno! - gritou, com a voz estrangulada pelo terror. - Todos vocês, para o inferno!
Um gato miou esganiçado no escuro, e Jed saiu correndo. Segundos mais tarde, o som de um motor possante - o do Corvette de Jed - liberou um ronco poderoso e pneus deslizaram no cascalho solto. O barulho do motor diminuiu, e as marchas engataram, arranhando e desaparecendo na noite.
- Já vai tarde - disse Sunny.
- O que você estava cantando? - Brig perguntou à mãe. Ela estendeu o braço, tocou-lhe a testa e franziu o cenho.
- Você precisa aprender a vencer seus inimigos com a mente, Brig, não com os punhos.
- Você é uma farsa, mãe.
- Só quando preciso ser. - Seus olhos estavam calmos e escuros. - Mas estou mesmo vendo você em perigo, Brig. Mais perigo do que esse garoto sem importância.
- Cuidado, mãe. Está começando a acreditar no que dizem de você.
- Acredito mesmo.
- Asneira - disse ele, a chuva batendo no chão.
- Só porque fiz uma encenação para o rapaz, não quer dizer que não acredito. Jed precisava se urinar de medo. Mas o que eu vejo para você e Chase é real.
- Acho que você fez mais do que ele se mijar.
- Era minha intenção. - Sunny olhou de relance para a estrada, e sua testa lisa se encheu de rugas. - Ele não vai intimidar mais ninguém.
- Olha, não estou preocupado com o Chase nem comigo - mentiu Brig, ao enxugar o suor da testa e sentir uma dúzia de pingos de chuva em sua cabeça.
- Deveria estar.
- Preciso ir...
- Ainda não. - Sunny olhou para o céu e franziu a testa para as nuvens que se moviam ininterruptamente na frente da lua.
- Você precisa me contar sobre a festa da família Caldwell. Voltou cedo.
- Foi um saco.
- E houve confusão.
- Está chutando ou foi uma de suas previsões?
Ela cruzou os braços bem abaixo dos seios e franziu a testa.
- Da próxima vez, vou jogar uma praga em você - brincou com ele, mas sem tom de riso na voz, depois passou o lábio inferior pelos dentes quando olhou para o bastão ensanguentado
- Tudo bem, houve um pequeno contratempo, mas nada sério - mentiu. - Ninguém nem se deu ao trabalho de chamar a polícia. - Brig limpou a poeira do paletó e foi pegar a Harley. Houve um contratempo, tudo bem, dos grandes, e que foi bem além de alguns insultos sussurrados sobre Sunny ou algumas pauladas com um bastão de beisebol. Pensou em Cassidy e sentiu uma pontada arrebatadora de culpa. Droga, aquela garota dera um jeito de mexer com ele. Mas havia também a irmã dela. Angie. Ela agira de forma estranha naquela noite. Em vez de sedutora, a maior parte do tempo parecera quase mal-humorada, ora se aproximando tristonha dele, ora flertando e dançando com rapazes que pareciam segui-la em bando. Depois, quando Brig se dera por satisfeito daquela festa luxuosa e de seus convidados egocêntricos, tentou convencê-la a ir embora. Ela concordou, e eles saíram andando por um caminho arborizado na lateral da casa. De repente, ela começou a chorar e a conduzi-lo para um local mais afastado atrás da estufa, longe da festa.
- Algo errado? - perguntou ele, cauteloso, desconfiado.
- Tudo.
Não acreditava nela. Angie Buchanan tinha o mundo a seus pés. Mas lágrimas desciam por seu belo rosto e, no escuro, ele percebeu que ela estava metida em algum tipo de encrenca. Encrenca das quais ele não estava precisando.
- Me ajude, Brig.
- Como?
- Me abrace, só isso.
- Angie... Acho que está na hora de você ir para casa.
- Ainda não. - Parecendo à beira do desespero, Angie abaixou a frente de seu vestido rosa-choque todo enfeitado, desnudando um de seus belos seios e oferecendo-se para ele.
- Pelo amor de Deus, ponha isso de volta...
- Por favor, Brig - disse, pegando a mão dele e colocando-a sobre a pele firme de seu corpo, deixando-o ver seu mamilo inchar-se em antecipação, permitindo que ele tocasse o calor e o fogo que se concentravam sob sua pele. Ele tinha dezenove anos, aquilo seria só um momento, e ela era tentadora demais. - Deixa eu fazer você se sentir bem - sussurrou ela. - Já fiz isso antes... lembra?
O desejo latejava em suas têmporas. A pele dela parecia seda macia sob seus dedos brutos, e foi preciso reunir toda a sua força de vontade para afastar a mão daquele corpo. Mas Angie foi insistente, puxou os dedos dele para o outro lado do vestido, ajudando-o a abaixá-lo, de forma que aqueles globos gloriosos balançassem livremente à luz da lua.
- Você gosta de mim. Sei que gosta. Eu me lembro...
O constrangimento queimava o cérebro de Brig. Ainda assim, seu coração se acelerava numa expectativa ansiosa. Sua masculinidade o traiu e entrou em estado de alerta quando ela se aproximou e lhe beijou os lábios, os seios nus roçando contra sua camisa, implicantes, encantadores. O calor incendiou seu sangue e o deixou cego a qualquer outra coisa a não ser perder-se nela. Já havia sido corajoso e nobre, dizendo a Cassidy que nunca mais a veria de novo, então por que não aceitar o que Angie queria lhe dar com tanta vontade? Não que não tivesse se sentido tentado antes... que não a tivesse tocado intimamente na primeira vez que ela fora tola o bastante para deixá-lo vê-la nua.
Ai, meu Deus, agira como um garanhão naquela vez. Mas isso fora antes de saber que Cassidy estava apaixonada por ele. Desde então, pensava nela e suas fantasias libidinosas eram com ela, uma garota que mal completara dezesseis anos. Cassidy era jovem demais para ele, ingênua demais, merecia algo melhor, a despeito de como ele se sentisse... e Angie... ah, droga, ela era tão gostosa! Rangendo os dentes, empurrou Angie para trás... para longe dele.
- Não acho que seja uma boa ideia.
- Claro que é.
- Vista-se. Vou levar você para casa. - Brig fechou os olhos, tentando raciocinar, esforçando-se para afastar da mente o desejo que lhe fazia ferver o sangue. Ouviu o ruído adorável de um zíper descendo o trilho. - Não... - Pouco depois, quando abriu os olhos, viu que o vestido dela estava caído sobre a grama, formando uma poça de chiffon cor-de-rosa, e que ela estava de pé à sua frente, usando apenas calcinhas de seda, baixas na cintura e que deixavam à mostra a linha de seu bronzeado. Uma única renda rosada mal cobria os pelos encaracolados no alto de suas pernas. - Vista-se - repetiu ele, mas sua voz estava rouca e carente de determinação.
Angie aproximou-se dele então, a boca molhada, sensual, aberta. Na ponta dos pés, passou os braços pelo pescoço dele e, esticando-se, deixando os seios roçarem em seu peito, beijou-o.
- Case comigo, Brig - sussurrou em seus lábios partidos, ao roçar os seios contra sua camisa e aninhar-se a ele, a frente de suas calcinhas deslizando suavemente sobre o volume de seu jeans. Passou uma perna pelo quadril dele e moveu-a devagar, para cima e para baixo, deixando um rastro úmido e quente no brim; um rastro que ele podia sentir. - Case comigo e serei sua para sempre.
Agora, à medida que se afastava da casa da mãe e endireitava a motocicleta que ainda trabalhava, sabia o que teria de fazer.
- Brig! Não...
- Mais tarde, mãe. - Ignorando as gotas de chuva que caíam no chão, montou na Harley e voltou para a estrada, tomando a direção da cidade. Tinha algumas contas a acertar.
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O último grito
Roman d'amourProsperity, Oregon, 1977. Um incêndio criminoso no moinho da abastada família Buchanan faz Cassidy, filha caçula de Rex Buchanan, dono da propriedade e de metade da cidade, ver sua adolescência e seu amor serem levados pelo fogo. A autoria do incênd...