Capítulo 20: Dúvidas

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Desci da charrete e caminhei em direção à praia, como Álvaro ordenara. Passei pela mata densa até ser atingida por uma forte ventania gerada pelas ondas. O céu estava fantástico, as estrelas estavam começando a aparecer, algo raro para a minha época, que acontecia apenas em fazendas ou na estrada. Sentei-me na areia sem me importar em sujar o vestido de Augusta, algumas batidas resolveriam depois.

Fechei os olhos enquanto sentia o vento bagunçar meus cachos e a presença de Álvaro a poucos centímetros de mim. A lembrança do rosto da velha louca logo apareceu na minha mente, causando um leve tremor no meu corpo.

"A viajante do tempo" ela dissera antes de Álvaro me puxar com força para longe daquele rosto sombrio. Ela sabe. Ela sabe da vacina no meu antebraço. Ela sabe que sou de outra época. Como ela sabe de tudo isso? Talvez ela seja como eu ou conhece alguém que passou pelo que eu passei. Será isso? Eu precisava procurá-la, precisava obter informações a respeito.

– No que está pensando?– perguntou Álvaro, seu hálito quente atingindo minha bochecha esquerda.

– Nada importante– abri os olhos– Onde vamos dormir?

– Na casa de praia. Você irá conhecê-la.

– Mas ela não está pronta– informei.

– Pedi a um escravo de confiança que colocasse um colchão lá e um jantar para nós– ele levantou-se– Venha, está começando a ficar escuro.

Ergui meu braço para segurar a mão de Álvaro. Ele me puxou com destreza e finalizou selando um beijo nos meus lábios. Antes de começar a caminhar em direção a casa, dei uma última olhada no mar e tive uma súbita ideia.

– Vamos nadar?– perguntei, animada.

– Como?!– ele colocou as mãos no bolso e me encarou.

– Nadar! A água parece estar uma delícia– minha voz soou mais alta que o normal.

Segurei a barra do vestido e o puxei através da cabeça, ficando nua a céu aberto.

– O-lívia– incapaz de parar de me fitar, Álvaro apenas permaneceu estático– Por favor, vista-se. Alguém vai te ver.

– Tem vergonha de ser visto com uma negra nua?– provoquei.

– Tenho vergonha de ser visto com qualquer mulher nua. O que vão pensar de mim?

– Vão pensar que é um tarado. Um louco. No mínimo– dei uma risadinha– Deixe que pensem. Esse é o meu lema de vida.

E com isso, saí correndo nua pela areia até meus pés encostarem na água. Estava gelada, eu admito, mas mesmo assim dei um mergulho e uma olhadinha sobre o ombro para Álvaro.

– Vem!– gritei– Está uma delícia.

– Não mesmo– gritou ele de volta e voltou a se sentar na areia.

Eu sabia que ele não entraria, Álvaro é muito sério para seguir estripulias de meninas de vinte e dois anos. Dei uma última mergulhada e voltei correndo em sua direção. Consegui atirar-me sobre ele antes dele sequer pensar em levantar. Dei uma gargalhada da sua careta de nojo.

– Porra, Olívia– ele reclamou, tentando me segurar para longe do seu corpo– Estou todo molhado.

– E vai ficar ainda mais! Vou te arrastar até a água– eu ri.

– Aham, quero ver essa sua força para me arrastar até lá– ele pressionou minha barriga com o joelho para me manter afastada, meus seios estavam balançando livremente sobre sua cabeça.

Ele olhou para cima e segurou um dos meus mamilos com a boca.

– Não adianta, você não vai me manter aqui.

– Será?!– ele puxou meus braços e me jogou delicadamente na areia, indo para cima de mim.

– Sai!– pedi, rindo.

– Você está um gelo! Não entro naquela água nem amarrado– ele afirmou antes de deitar sobre meu corpo nu.

– Tem areia em lugares muito indesejados por aqui.

– E terá ainda mais.

Nos beijamos com fervor enquanto ele abaixava a calça.

– Senhor?– gritou uma voz masculina distante.

– Ai meu Deus!– afirmei– vamos para a casa antes que alguém nos veja.

– Era disso que eu estava falando, Stra. Ambrose teimosa.

– Vá se acostumando com minha teimosia, Sr. Coimbra– Vesti minha roupa rapidamente e saímos correndo de lá antes que o dono da voz aparecesse.

– E se fosse algum problema na fazenda?– perguntei no caminho.

– Nada que Augusta não possa responder– ele afirmou, antes de me puxar devagar para junto de si, segurando nossas mãos unidas abaixo do peito– Eu disse a ela que dormiria na Fazenda Canto do Sabiá.

– Ela acreditou?

– Espero que sim.

Avistei uma construção em madeira e barro a menos de meio quilometro dali. A casa estava inacabada, mas as paredes externas encontravam-se erguidas e o teto de telha de cerâmica já protegia o local. Dois andares e uma varanda, bem maior que a Casa Grande. As aberturas, como portas e janelas, estavam fechadas apenas por palhas e paus.

Álvaro retirou os obstáculos da entrada para permitir nossa passagem. Ele pegou uma lamparina do lado de fora, que acabou nem sendo utilizada, pois a sala já estava iluminada por uma lareira e algumas velas.

– Quando amanhecer eu te mostro a casa, você irá gostar– disse ele.

– Certeza que vou.



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