Entramos na mata mais densa, longe dos olhares curiosos.
– Ela gosta de você– comecei a falar para quebrar silêncio.
– Lurdinha?– ele riu baixo, deixando os dentes brancos a amostra– Creio que não da maneira como você está pensando. Lurdinha é de todos.
– Compreendo.
Talvez o assunto não tivera muito efeito em quebrar o silêncio, pois este voltara rapidamente. Observei o rosto cálido de Dante na penumbra da noite, lembrando-se dos meus primeiros dias aqui na fazenda Canto do Sabiá, dias assustadores, em que eu mal conseguia dormir, a saudade da minha família era tão extrema... hoje felizmente ou infelizmente a saudade não doía tanto, eu me acostumara a conviver com aquele vazio dentro de mim e a conviver com as pessoas dessa época. Dante foi um grande amigo, estava presente quando eu mais necessitei dele, eu precisava dele de volta.
Dei dois passos na sua direção e o abracei, primeiro de forma hesitante, mas assim que ele retribuiu eu apertei meus braços em volta dele, sem me importar com sua camisa suada da capoeira. Aquilo era tão reconfortante, minha âncora há tempos esquecida.
– Eu sei– afastai-me– Sei que a gente anda se estranhando ultimamente, que até tentamos manter uma conversa de grandes amigos, mas ela nunca progride. Eu sinto sua falta, Dante. Eu preciso de você. Existe um grande vazio aqui dentro por causa do nosso afastamento.
– Olívia, tudo começou quando eu te alertei sobre aquela fuga– ele afirmou, sério– Você foi insistente e teimosa, agora veja no que deu.
– A culpa não foi minha!– minha voz falhou quando as lágrimas ameaçaram em sair– A morte dele não foi por minha causa! Eu já aceitei isso, agora preciso que você aceite.
– E outra– ele começou– Não quero te julgar nem nada, mas foi este o motivo que me fez te chamar aqui. Não sei qual é o nível de intimidade entre você e aquele Sr. Coimbra, mas saiba que ele não é um bom homem.
Disfarcei meu constrangimento causado pelas palavras de Dante.
– Não tenho nada a ver com aquele homem– tossi– Ele é perverso, mas me salvou das chibatadas, talvez em algum lugar naquele corpo exista um coração bom.
– Você é uma péssima mentirosa– ele afirmou, irritado– Pensei que amigos revelassem tudo um para o outro. Aquele homem te quer na cama dele, isso é óbvio para todos que o observam. E para mim, algo mais óbvio ainda, é que você parece desejar a mesma coisa.
– Há– eu ri sem graça– Dante, por favor. Eu e o Sr. Coimbra? Somos completamente diferentes, é uma relação impossível.
– Você não negou que deseja ele– Dante me fuzilou com o olhar, com um desejo ardente de arrancar informações– Ele é um canalha, assim como o pai e o Barão Macedo.
– Eu discordo. Ele é diferente.
– Está completamente apaixonada– ele afirmou– Olhe bem onde está pisando Olívia, alguma granada poderá explodir e eu não estarei por perto quando isto acontecer.
– Você deveria me apoiar!
– Não, eu não deveria!– ele aumentou o tom de voz– Você é inteligente, mas está sendo burra! Aposto que nem sabe dos últimos "negócios" do Sr. Coimbra.
– Negócios? Da nova casa dele? Claro que sei, se eu estou sendo a tradutora dele– aquele assunto estava me aborrecendo.
– Então sabe do inglês?– disse Dante, sorrindo, ele possuía uma carta na manga contra o Sr. Coimbra– Sabe aquele dia em que o Sr. Coimbra e o Barão Macedo estavam juntos conversando? Quando eu menti sobre a estadia dele aqui na Fazenda, disse que ele já havia partido. Eu menti porque estava com raiva da conversa que tinha escutado.
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Negra
Ficção HistóricaOlívia Ambrose Barros é uma estudante de Arquitetura que enfrenta com garra o dia a dia como qualquer outra garota de vinte e dois anos. Mas no dia 20 de Julho o inesperado acontece: ela volta no tempo e para no ano de 1871. E o maior problema nem f...