Pela manhã fui encaminhada para o quarto de Amélia Macedo. Lá se encontravam sentadas na cama a mãe e a filha, as duas muito bonitas, por sorte a menina não havia puxado a aparência grotesca do pai. As duas eram tão brancas e possuíam a pele tão fina que parecia porcelana, os cabelos claros cor de mel desciam em cachos bem definidos até a cintura. A semelhança era impressionante, apenas as rugas da mãe as diferenciavam.
– Bom dia– a menina de quinze anos abriu um enorme sorriso. Ela estava com uma roupa rendada branca, provavelmente de dormir.
A mãe a olhou com censura e se levantou, ajeitando seu cabelo.
– O Barão certamente a informou sobre todas as regras da casa– ela afirmou, virando-se de costas para abrir um enorme guarda roupa de madeira– Aqui estão as roupas de Amélia. Este aqui é o uniforme da escola. Depois que você arrumá-la quero que a deixe no portão de casa, Joaquim a levará para o colégio. Durante esse período eu a aconselharia conhecer melhor a fazenda e os negros que vivem aqui, eles conhecem as regras até melhor que a gente, irão te impedir de cometer qualquer besteira.
Depois da enxurrada de informações, ela me entregou um vestido azul, com touca, meia e vários outros acessórios que eu achava particularmente desnecessários. Ao observá-la de perto reparei que era bem mais jovem que o Barão, provavelmente uns vinte anos de diferença entre os dois. Seus olhos verdes me fitavam com indiferença.
– Cuide bem da minha filha– ela disse, atravessando a porta em seguida e me deixando sozinha com a menina.
Virei-me de costas para acompanhar a porta se fechando e a mulher desaparecendo no corredor.
– Minha mãe sempre foi muito séria, não estranhe– a menina colocou a mão nos meus ombros. Ela era poucos centímetros mais baixa que eu. Talvez em outra situação poderíamos até ser grandes amigas, mas no momento eu não conseguia suportar qualquer parente de Barão.
– Bem...– sem saber o que falar, fiquei alguns minutos em silêncio. Minha vontade era apenas de sair correndo dali– Meu nome é Olívia.
– Prazer Olívia– ela sorriu– Tenho certeza que vamos nos dar muito bem! Eu e Luíza éramos grandes amigas.
– Luíza?
– Minha outra dama de companhia.
Abaixei a cabeça quando vi a expressão de tristeza tomar conta dos olhos da menina. Luíza tinha sido assassinada, o que eu menos queria era ser a próxima.
– Seu pai me contou dela– coloquei a mão nos ombros da menina e tentei abrir um sorriso– Vai ficar tudo bem. Seremos sem dúvida grandes amigas.
– Obrigada.
Depois de arrumar Amélia e garantir que ela havia entrado na charrete que a levaria na escola, fui procurar comida. Ninguém me avisou como os escravos se alimentavam, talvez não fosse de grande importância para eles garantir a nossa alimentação. Decidi procurar Dante.
Andei pelos cafezais, pela plantação de feijão, de mandioca e nada dele. A única coisa que eu via eram os olhares, os olhares dos vários negros que estavam trabalhando debaixo desse Sol quente, um olhar de dor, um vazio. Não se vinham sorrisos, conversas paralelas, eles trabalhavam arduamente, sem olhar para os lados. Mas uma coisa era óbvia: o companheirismo; todos ali se ajudavam, todos visavam o bem do outro para ninguém sair prejudicado. Pensei no mesmo instante em um título para meu blog, Orgulho de ser Negra. Sim, meu sentimento com aquele povo além do pesar pelo sofrimento deles, era de orgulho, por ser um povo guerreiro, que acordava todas as manhãs sabendo do árduo dia que teriam pela frente e o enfrentavam com garra.
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Negra
Ficción históricaOlívia Ambrose Barros é uma estudante de Arquitetura que enfrenta com garra o dia a dia como qualquer outra garota de vinte e dois anos. Mas no dia 20 de Julho o inesperado acontece: ela volta no tempo e para no ano de 1871. E o maior problema nem f...