Capítulo 21: Capoeira

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Resumo dos dois capítulos anteriores:


Olívia Ambrose aparece de surpresa na casa de Álvaro Coimbra, exigindo explicações sobre seu sumiço posterior a morte de Diego. Álvaro tenta manter-se rígido, como um digno Senhor da fazenda, mas não resiste aos encantos da moça, entregando-se ao sentimento que ele tanto reprimia dentro de si.

Os dois passam duas belas noites juntos, além de visitarem uma vila em um formoso passeio, aumentando a ligação afetiva entre o mais novo casal da região.

Observação: o capítulo vinte ainda terá uma continuação, mas por enquanto seguirei a partir do vinte e um. Boa retomada de leitura a todos!


* * *

Abri um olho contra a claridade da manhã, apesar da escassa luz que entrava na senzala. Observei calmamente as mulheres ao meu redor, todas suadas e sujas, com marcas nítidas do esforço que o trabalho na fazenda as sujeitavam. A pontinha de orgulho que brotou no fundo do meu estômago era ao mesmo tempo reconfortante e ao mesmo tempo temerosa. Elas eram fruto da escravidão, cada gota de suor mostrava o destino delas, que desde pequenas foram obrigadas ao trabalho forçado.

Eu sentia orgulho pela cor da pele que elas carregavam sem culpa, pela rotina obrigatória, pelos castigos que marcavam suas peles antigamente delicadas, pelas hora sem fim no sol quente. Olhei para a minha própria pele por alguns segundos e agradeci toda aquela melanina que não deixava as manchas causadas pelo sol transparecerem. Será que existia filtro solar? Perguntei-me de repente.

A senzala esvaziou-se com o passar dos minutos. Eu também deveria partir, mas hoje a preguiça tomou conta do meu ser e eu possuía uma grande necessidade de ficar absorta em meus pensamentos. Pensamentos únicos, com apenas um personagem principal.

Senti um sorriso elevar minhas bochechas e corei com as lembranças da noite passada. As palavras dele no meu ouvido ainda me causavam arrepios, como se ele estive ali comigo, afagando meu cabelo. Eu conseguia sentir o calor da fogueira que esquentava a casa em construção e a felicidade que me consumia naquele momento nunca antes idealizado.

Conversamos sobre tudo, com o objetivo de nos familiarizarmos um com o outro. Álvaro contou sobre sua irmã, na qual ele suportava cada vez menos, pois preferia estar morando sozinho. Ele me revelou, quase que como um segredo, seu prazer em ficar só, em beber e olhar pela janela nas noites mais frias, absorto em pensamentos sobre sua infância. Revelou sua impaciência em ser chamado muitas vezes ao dia, em sair de casa para estar presente em eventos formais que não lhe interessavam.

Segurando com força minha mão ele cochichou sua alegria em ter minha presença, sentimento que ele nunca imaginou sentir. Disse-me que era reconfortante, melhor ainda que ficar sozinho bebendo junto a escuridão.

Infelizmente eu não pude revelar muito sobre mim, apesar de sentir uma crescente necessidade de prender Álvaro contra a parede e contar tudo, sem deixar espaço para outra coisa senão um monólogo infinito sobre minha louca vida.

Escutei um barulho vindo do outro canto da senzala, próximo a porta, mas eu estava completamente sem ânimo para me levantar.

– Negra!– gritou uma voz rouca e familiar, que fez os pêlos do meu corpo subitamente eriçarem. O feitor.

Levantei-me prontamente, mas não consegui escapar de suas mãos firmes e suadas.

– Levante-se preguiçosa!– gritou ele, agarrando meus braços com força demasiada– Eu sei bem da sua invisibilidade e falta de importância para a sociedade, mas aqui nesta fazenda seu preço é caro e seu trabalho é necessário! Vista-se decentemente e vá para o cafezal. Deixo bem claro minha advertência, pois mais uma dessas você sofrerá graves consequências.

NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora