Capítulo 18: Obra de Arte

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(capítulo narrado por Álvaro Coimbra)

A semana passou como a mais lerda lesma existente na fauna de Paraty. Meus dias poderiam ser resumidos a bebidas, leituras e perturbações da minha adorada irmã. Abri meu caderno de anotações enquanto me jogava na poltrona da sala de reuniões. Observei os desenhos da Casa de praia e comecei a me indagar se tudo aquilo não passava de um sonho, de uma grande ilusão que eu insistia em mantê-la viva dentro de mim. A Casa de praia era inicialmente um meio de me isolar cada vez mais de tudo aquilo que me cercava e principalmente separar a minha vida da vida de minha irmã. Ela não iria demorar para arrumar um casamento, do jeito que a danada é, e quando finalmente realizasse este seu tão sonhado desejo ela iria ou se mudar para a casa do marido ou para a nossa fazenda.

Ou seja, minha vida irá se tornar o verdadeiro inferno quando Augusta resolver arrumar filhos, realizar festas, contratar mais empregados e virar a verdadeira dona da fazenda. Bastava a ideia se projetar na minha mente que eu começava a ficar apavorado. A casa Grande vai se tornar um caos e eu precisava me mudar, precisava me manter nas sombras.

Mas tudo isso era apenas a minha ideia inicial. Hoje, qualquer um pode me julgar por isso, eu penso que se continuar as obras da Casa de praia, Olívia será obrigada a me visitar mais vezes e eu poderei admirá-la. Meus negócios com o inglês estavam indo de vento em popa e Olívia seria designada para o cargo de tradutora.

Escuto uma batida na porta, certamente a governanta Mari deseja me informar alguma coisa, já que Augusta Coimbra não possui uma educação mínima para bater na minha porta.

–      Entre, Mari– avisei, sem sair da poltrona.

–      Bom dia, senhor!– disse Mari no meio da fresta entre a porta e a parede. Ela era uma mulher muito gentil, acima do peso, africana e já de idade.

–      Bom dia. Aconteceu alguma coisa?– perguntei sem verdadeiramente me preocupar.

–      Não, senhor– ela sorriu– Está tudo ótimo por aqui, espero que com o senhor também. Venho lhe informar que chegou uma moça, visita pro senhor.

–      Uma moça?– perguntei confuso– Veio visitar Augusta, supostamente.

–      Não senhor. Ah, já ia me esquecendo que Augusta pediu para lhe informar que precisava sair. Ela está na feira.

–      Então diga à visita que vá encontrar Augusta na feira– afirmei, fechando meu caderno de anotações.

–      Senhor, creio que a moça não seja amiga de Augusta... ela é negra. Mas me parece muito apresentável e educada, não deve ser escrava, chegou até de charrete.

–      Ela disse o nome?– levantei-me e andei em direção à porta.

–      Olívia Ambrose. Sim, acho que era esse o nome– Mari sorriu, acenando para que eu a seguisse– Ela está na varanda principal e deseja falar com o senhor.

As palavras de Mari entraram no meu ouvido como um sopro de uma corneta, fazendo-me ficar ligeiramente desorientado, sem saber o que falar. Apenas segui a escrava até a porta principal e lá estava ela, tão linda quanto naquela tarde no quarto de hóspedes. Seu cabelo, sempre preso em algum lenço colorido, sua roupa apesar de simples descia pelo seu corpo de uma forma única que a deixava tão leve e sensual. Senti vontade de agarrá-la pela cintura e jogá-la na minha cama para lembrar-me daquela tarde da semana anterior.

Ela me olhou, séria, um olhar meramente acusador, fazendo os pêlos do meu corpo eriçarem. Aquela mulher me atiçava, me tirava de qualquer sombra, de qualquer remorso que eu poderia guardar. A cor do pecado, o sabor que eu não poderia ter o prazer de provar.

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