Filha o que aconteceu?

130 10 0
                                    

O frio chegou, o orvalho que aparecia na manhã cobria todas as coisas, as brisas geladas batiam contra as janelas fazendo-as estremecer, estávamos todos na sala com a lareira acessa, xícaras de chás espalhadas pelas mesas, Carrye estava deitada com uma coberta no sofá e prestava atenção nas conversas, não éramos uma família unida, mas fazíamos o possível para vivermos em harmonia.
- Mãe. - Ela me chamou em um tom baixo, somente eu ouvi.
- Sim. - Olhei para baixo e a vi.
- A senhora lê um livro pra mim? - Ela cabisbaixa estava desanimada.
- Claro, venha. - Ela se levantou no sofá ficando em pé e a peguei no colo com a coberta, ela encostou a cabeça em meu ombro e quase dormiu. Me levantei e segui para o quarto em que reservaram para ela, era um quarto amplo com cortinas floridas, cama de casal, seu baú em um canto e alguns papéis com desenhos sobre a penteadeira, caminhei até a cama e a repousei ali, depois fui a prateleira peguei um livro e voltei. Aproximei-me e sentei-me, ela se encostou mais em mim repousando a cabeça em minha perna, abri o livro e comecei a ler, era um conto de fadas, uma princesa em perigo a espera do seu príncipe encantado, li por quase meia hora até que vi que ela havia dormido, fechei o livro e coloquei em cima do criado mudo, com cuidado segurei a cabeça dela e coloquei sobre o travesseiro e a cobri com as cobertas e afastei-me.
- Mãe. - Virei-me e ela estava com os olhos semifechados.
- Oi.
- Fica comigo, por favor. - Disse se sentando.
- Mamãe precisa conversar com os adultos.
- Por favor, fica comigo. - Disse quase chorando, e andei até ela sentando-me.
- Tudo bem? - Perguntei e ela exitou.
- Filha, esta tudo bem? Pode me contar, sou sua amiga.
- Esta sim. - Disse me abraçando.
- O que você tem?
- Nada. - Falou deitando-se novamente e fechando os olhos.
- Mamãe estará aqui pra você, sempre. - Deitei-me, me cobri e a abracei, apesar de ter coisas para fazer minha menina precisava de mim. Fiquei ali por mais uma hora até que tive certeza que ela dormia e sai.
                                ***
- Dylan, acho que tem algo errado com a Carrye. - Estávamos na varanda da casa, ele com os braços em minha volta observando Carrye brincar com uma boneca de pano.
- Por que acha isso?
- Ela anda muito estranha.
- Notei que ela esta menos brincalhona, mas acho que talvez esteja enjoando do lugar.
- Não é isso, sei que não. Estou preocupada.
- Deve ser coisa de criança.
- Não é. - Realmente eu estava preocupada, ela estava cada dia mais fechada, se alimentava mal e era raro vê-la brincando como antes.
- Eu vou conversar com ela.
- Obrigada.
- Eu vou resolver.
- Estou com frio, vou entrar. Quando acabar de falar com ela mande-a entrar e colocar um casaco.
- Tudo bem. - Ele beijou-me na testa e sai para dentro.
                                ***
               Perspectiva Diferente

Freya vinha relatando sobre suas preocupações a respeito de Carrye, mas eu tinha que concordar que minha garotinha estava mudada durante a última semana, pensei que talvez fosse saudades de casa e do amigo. Andei até ela que brincava com sua boneca e a chamei:
- Carrye. - Ela se assustou e caiu para trás. - Desculpe-me filha. -  A ajudei a levantar-se.
- Onde esta a mamãe? - Disse olhando para atrás de mim e querendo sair.
- Ela está lá dentro. - Pegou sua boneca  e começou a andar rapidamente.
- Espere aí. - Falei e ela parou se virando.
- Eu quero ver a mamãe. - Ela parecia assustada e ansiosa para encontrar Freya e partiu meu coração de pai.
- Venha cá. - Ela andou relutante olhando a casa se afastar.
- Posso entrar?
- Não.
- Por favor, eu quero a mamãe.
- Não, querida. Precisamos conversar.
- Eu não quero.
- Carrye o que esta acontecendo?
- Pai, por favor. - E começou a chorar.
- Filha, por favor. Conte para o papai o que está acontecendo. - Aproximei-me dela e ela recuou ao meu toque.
- Eu quero a mamãe.
- Eu estou aqui para ajuda-la no que precisar, pode dizer o que esta acontecendo.
- Não quero conversar.
- Carrye, por favor filha. - Me aproximei devagar e a peguei no colo e ela choramingou no meu ombro.
Andei de volta a casa e ela segurava a boneca enquanto batia contra minhas costas, entramos e procurei por Freya, mas encontrei Jhonathan.
- O que houve? - Perguntou preocupado vendo Carrye chorar e ela levantou a cabeça ao ouvir sua voz.
- Sabe onde Freya está?
- A vi passar para o quarto.
- Obrigado. - E segui meu caminho até o quarto onde a encontrei dobrando peças de roupa.
- Freya. - Ela se virou e parou o que estava fazendo.
- O que aconteceu?
- Precisamos conversar. - Coloquei Carrye no chão e ela correu para Freya agarrando-se na suas pernas.
- Meu amor, olhe para a mamãe. - Freya a sentou em uma cadeira e enxugou as lágrimas, ela olhou para a mãe e engoliu o choro, andei até elas e me ajoelhei ficando no nível de Carrye.
- Filha, mamãe e papai querem ajudar.
- Querida, me conte o que esta havendo.
- Mãe... Estou com medo. - Vi que Freya estava prestes a fraquejar, em relação a nossa filha ela era emotiva, segurei sua mão. E admirei a confiança que Carrye possuía nela ao começar a demonstrar o que sentia.
- Por que meu Anjo? - E se silenciou.
- Carrye, papai é seu amigo, ele quer ajudar e precisa que você diga o que esta havendo. - Freya tentou me ajudar a faze-lá falar comigo.
- Eu quero ir pra casa. - Eu queria ajudar minha garotinha a melhorar, mas ela não colaborava.
- Carrye, é melhor você dizer. - Falei um pouco mais alto e ela arregalou os olhos.
- Dylan! - Freya me repreendeu.
- Desculpe-me meu anjo, papai não quis fazer isso.
- Você pode nos dar um minuto? - Freya virada para mim perguntou.
- Não, eu quero ajudar.
- Dylan, por favor. Ela não está se sentindo a vontade.
- Tudo bem. - Me levantei e caminhei até a porta e virei.
- Carrye. - A chamei e ela me olhou. - Papai te ama. - Sai e fiquei esperando ao lado da porta.
                                ***
Minha menininha estava chorando, e eu estava disposta a fazer o que fosse preciso para vê-la sorrir, até mesmo abandonar tudo e voltar pra casa.
- Mamãe.
- Por favor, Carrye. Eu te amo, o que esta acontecendo com você?
- Eu... Eu...
- Minha menininha. - A abracei e ela me apertou. - Vamos voltar para casa, eu prometo.
- Obrigada. - Eu não iria força-lá me dizer se não quisesse.
- Eu te amo, e vou proteger você de qualquer coisa. Não precisa me dizer se não quiser. - Ela me fitou com seus olhinhos castanhos cheios de lágrimas e se levantou pegando minha mão e me puxando para fora do quarto. Do lado de fora encontrei Dylan esperando que nos seguiu sem dizer nenhuma palavra, somente me olhou com um olhar inquisidor. Carrye me levou até o seu quarto e parou me olhando.
- Tudo bem meu amor? - Ela andou até a cama, abaixou-se, se enfiou ali em baixo e puxou um pedaço de pano. - O que é isso? - Dylan perguntou.
- Posso pegar? - Perguntei e ela assentiu. Era um pano pequeno rasgado, parecia um vestido manchado, um vestido semelhante ao que Carrye usará a três dias.
- O que é isso? - Perguntei e ela ficou calada, estática.
- Freya, deixe-me ver. - Dylan pegou o pano e falou:
- Isso é sangue?
- É o vestido dela, Dylan. - Falei enquanto lágrimas escorriam.
- O que?
- É o vestido dela, eu mesmo o comprei. -  A encarei parada na minha frente, ela olhava dele para mim.
- Carrye, filha você se machucou? - Ele perguntou ajoelhado.
- Foi ele. - Disse com a voz como quase um sussurro.
- Quem? - Ela negou-se a responder.
- Por favor, meu amor o que aconteceu? Você está machucada? - Ela não respondia e eu não sabia o que fazer no momento.
- Alguém te machucou? Papai quer te ajudar.
Comecei a andar pelo quarto e peguei as coisas dela colocando no baú.
- O que esta fazendo?
- Vou leva-la para casa. Você tinha razão, não deveríamos ter vindo.
- Não, Freya. Ir embora não vai resolver nossos problemas.
- Carrye, nos vamos voltar para casa meu amor. Fique tranquila, mamãe vai te levar pra casa. - Olhei para ela que continuava parada.
- Freya, não!
- Trate de mandar minhas coisas o mais rápido possível. - Peguei na mão dela e comecei a caminhar com ela rumo a rua.
- Freya! - Berrou quando passávamos pela sala e Greta que estava sentada na sala se assustou e correu para dentro. Eu desci as escadas e andei até o lado onde o motorista da charrete conversava com um copeiro.
- Vamos embora, ligue a charrete.
- Sim, senhora. - E voltei até a frente onde esperaria pela charrete.
- Freya, por favor. Vamos conversar.
- Não, Dylan. Achei que seria bom para Carrye ficar aqui, mas foi um erro, algo aconteceu a ela e ela não quer contar porquê esta traumatizada. - Ela olhava para nós com o rosto pálido.
- O que está acontecendo? - Perguntou minha mãe descendo as escadas com Greta, Jhonathan e a senhora Asheley.
- Freya está indo embora.
- O que? Por que?
- Jhonathan por favor ajude Dylan a recuperar minha fazenda.
- Por que esta indo? - Ele perguntou
- Eu não deveria ter vindo.
- Por que essa mudança, irmã? - Perguntou Greta e eu ignorei.
- Dylan ira ficar para poder retomar a fazenda e eu vou administrar a nossa em Houston, não voltarei nunca mais a Cambridge.
- Freya se acalme você não pode ficar morando sozinha, em pouco tempo dará a luz. - Disse a senhora Asheley.
- Vocês não entendem, Dylan poderá explicar mais tarde. - A charrete parou em minha frente e o motorista desceu abrindo a porta e eu coloquei Carrye para dentro.
- Freya você terá o bebê em duas semanas.
- Mamãe você vem comigo? - Perguntei.
- Freya, tenho que preparar-me.
- Não precisa, mandarei que busquem nossas coisas.
- Tudo bem, filha.
- Mãe! - Greta chamou.
- Freya você não pode ir. - Disse Jhonathan.
- Alguém machucou Carrye, vocês não entendem, não notaram que ela se afastou nos últimos dias? Dylan e eu vimos um vestido dela manchado de sangue e ela se nega a dizer quem foi. Sabem o quanto dói para uma mãe saber que sua menina foi machucada? - O silêncio predominou, eles olharam de um para o outro e ela dentro da charrete ficou quieta como se falássemos em sua ausência.
- Eu vou com você. - Disse minha mãe subindo na charrete.
- Obrigada.
- Freya eu te amo, podemos resolver tudo. - Falou Dylan segurando meu rosto.
- Acho que ela precisa de um pouco de sossego, escreverei cartas.
- Tudo bem, irei resolver as coisas o mais rápido possível para voltar a ficar com vocês.
- Obrigada Dylan. - O abracei forte e ele me deu um beijo de despedida, depois se abaixou e beijou-me na barriga e em seguida foi até a charrete e chamou por Carrye, que se levantou e ficou parada a porta.
- Papai te ama, desculpe-me se assustei você, você vai pra casa minha boneca com a mamãe e sua vó, papai vai assim que puder. - Ele pegou uma mexa do cabelo dela e colocou atrás da orelha, e repousou um beijo em sua testa. Me despedi da senhora Asheley e de Greta com um abraço, quando chegou a vez de Jhonathan apertou-me o coração ao ver a mesma situação de 6 anos atrás quando eu ia embora.
Depois de me despedir, entrei na charrete e a porta foi fechada, Carrye que estava sentada com minha mãe veio para o meu lado e ficou deitada. Ouvi o motor ligar e senti quando começou a se afastar, me neguei a olhar para trás e ver mais uma vez os abandonado. O que queria saber no momento era quem havia feito aquilo com ela, será que somente a machucou ou fez algo mais? Minha mente imagina as piores possibilidades, o pior é que eu não sabia quem havia feito, ela somente disse que foi ele, mas eu não podia desconfiar de ninguém já que ela vivia correndo e conhecendo pessoas. Sobre a proposta do senhor Lewistown eu havia descartado e agora quem resolveria seria Dylan, tentei me acalmar respirando profundamente, meu bebê agitado em meu ventre chutava-me com força, eu deveria ter ficado quieta como a parteira disse, mas estava fazendo tudo ao contrário. Em nome dos filhos não há uma mãe que não se transforme para o bem deles.

Freya & JohnathanOnde histórias criam vida. Descubra agora