Capítulo 15-A Vida de Sebastian(Part. 3)

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DIAS ATUAIS

SEBASTIAN

Eu não deveria estar ali, mas não consegui evitar a vontade de visitar meu túmulo após quase ter sido ceifado de uma vez por todas.

A pedra já estava desgastada e não haviam mais flores sendo colocadas ali como antes. Todos que um dia me conheceram já estavam mortos ou velhos demais pra me fazer uma visita.

Ainda dava-se para ler as palavras na lápide;

Sebastian Hayes.
1922-1943
Amado filho e amigo.

Odiava ir naquele lugar pois era apenas mais um lembrete de que eu estava morto agora e nunca mais poderia reverter isso.

Era um lembrete que meus planos para o futuro foram tirados de mim para sempre. Que eu nunca envelheceria, ou teria filhos, ou qualquer outra coisa do tipo.

Mas, quando o ceifeiro me levou, foi ainda pior do que olhar para meu próprio túmulo.

Eu estava morto.

Por anos esperei ser ceifado para me livrar da tristeza que me consumia cada vez mais a cada ano que passava.

Quando Elizabeth morreu e eu não achei seu espírito, senti a dor crescer ainda mais dentro de mim e eu quase me tornei um espírito como os outros que habitavam o Plano Fantasma; perdido, murmurando palavras soltas, preso a um mundo do qual não precisava mais de mim.

Mas, alguns anos depois eu a senti, e a dor pareceu desaparecer por um momento enquanto eu a procurava. Quando eu a achei, ela já tinha 13 anos, e eu não conseguia acreditar no que estava vendo.

A garota presa no armário era a minha Elizabeth. Mais jovem do que quando eu estava vivo, mas era ela.

Durante esses três anos em que acompanhei ela, me iludi ao pensar que ela era a minha Elizabeth. A aparência era a mesma, mas não a mesma personalidade.

Aquela Elizabeth era mais dura e e confiante, diferente da inocente e frágil Elizabeth que eu um dia conheci e amei.

Mas mesmo assim, ainda era ela. Podia perceber pelos pequenos momentos em que ela não brigava comigo uma parte de sua personalidade que se assemelhava à minha Liz.

Mas, quando o ceifeiro me levou, as expectativas que eu havia criado em minha cabeça se foram. Elizabeth estava viva, e eu era um fantasma. Eu nunca a teria, eu nunca poderia ficar com ela.

Eu estava morto, e apesar de estar com ela me fazia me sentir vivo, era apenas uma ilusão. Meu fardo era sentir a dor de uma vida curta e uma morte inevitável.

Olhei para a lápide novamente, sentindo as lágrimas começarem a surgir em meu rosto.

Não era justo. Simplesmente não era justo. Eu tinha muito o que viver, eu havia prometido Elizabeth que iria voltar. Eu perdi tudo.

Enxuguei as lágrimas e respirei fundo, sabendo que era um ato idiota já que eu não precisava de ar.

— Não esperava te encontrar aqui, Sebastian. —ouvi uma voz conhecida se pronunciar

Me virei para encarar Harley e ele me deu um sorriso como ele sempre fazia nos dias de treinamento enquanto tentava me animar.

Havia me encontrado com Harley alguns anos depois da minha morte. Ele parecia estar conformado com sua morte de um jeito que eu provavelmente nunca estarei.

Foi ótimo encontrá-lo novamente naquela época. Harley foi um dos motivos para eu não ter desistido de lutar, mesmo depois de morto.

— Eu que não esperava encontrar você aqui, Harley. —falei

— Estava por perto e senti você, então resolvi dizer um oi

Sorri para ele e ele se aproximou e olhou para a minha lápide.

— Nós dois deveriamos ter voltado para casa. Vivido nossas vidas até o fim delas... —murmurei

— Nós vivemos até o fim de nossas vidas, Sebastian. Infelizmente nosso fim foi precoce, mas tinha que acontecer...

— Como pode dizer isso?

— Eu acredito que tudo tem uma razão. Nada é por acaso. Se estamos mortos agora, é por uma razão. Talvez a morte não tenha sido o fim, e sim o começo.

Olhei para Harley, pensando em suas palavras.

— O começo de quê?

Ele sorriu e me olhou. Seus olhos não pareciam cansados como quando ele estava vivo. Ele parecia bem.

— Isso, caro amigo, você tem que descobrir sozinho.

x

Caminhei pela rua até chegar na frente da casa de Elizabeth. A noite parecia calma e tudo parecia estar bem.

Gostaria de entrar e conversar com ela, mas as proteções da casa haviam sido recolocadas, impedindo que qualquer ser de outro plano entrasse na casa.

Vi uma movimentação na janela da sala e pude ver o pai de Elizabeth sentando-se no sofá junto a outro homem, enquanto conversavam.

Os dois pareciam tensos, especialmente o pai de Liz.

Sacudi a cabeça e saí de perto da casa. Seja lá o que estivesse acontecendo, não era problema meu.

Nada mais era problema meu. Eu estava morto.

O Primeiro Plano tremulou a minha frente e eu voltei a caminhar pelo Plano Fantasma.

Muitos espíritos perdidos caminhavam por ali, murmurando coisas sobre suas vidas, com olhos vidrados em um ponto fixo, totalmente sem rumo ou esperança, fadados a esperar que a morte lhes fosse gentil e os tirasse daquele sofrimento.

Baixei a cabeça e continuei andando. Fechei os olhos, e, ao abri-los novamente, me encontrei andando em outra rua.

A antiga casa de Elizabeth, a minha Elizabeth, ainda estava lá. Uma família nova morava lá agora, mas aquilo não importava.

Subi até a varanda da casa e pude ver claramente em minha mente a noite em que levei Liz para um passeio, nosso primeiro encontro, muitos anos atrás.

Me lembrei da sensação de seus lábios nos meus naquele beijo inesperado e da sensação de tê-la em meus braços.

Caí de joelhos no chão de madeira, sentindo o peso daquelas memórias me empurrar para o chão. Tudo aquilo parecia apenas um sonho distante. Uma miragem boa e devastadora ao mesmo tempo.

Aquelas memórias eram pesadas e dolorosas pois eram memórias de coisas que eu nunca mais teria a chance de recuperar.

Eram memórias de uma vida que eu jamais iria viver novamente.

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