Capítulo 33

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— Vai precisar de ponto. — comentou Gregório, com preocupação, ao verificar a gravidade do corte enquanto limpava meu rosto com um pano úmido de origem incerta. Provavelmente o pano úmido era um dos panos que estávamos usando para secar o chão. Desconfortável com a situação, decidi não iniciar uma investigação e confiar em suas habilidades como enfermeiro. — Pressiona isso para estancar o sangue. — Posicionou o pano imundo sobre o corte, e eu fiz o que ele pediu. — Tem gases e soro por aqui?

— Tem uma caixa de acrílico de primeiros socorros no armário que fica embaixo da pia. — respondi, levantando do chão com sua ajuda e, logo após, sentei-me na beirada da cama.

Gregório correu para pegar a caixinha e, com os materiais necessários em mãos, providenciou um curativo para a minha ferida. O sangue já havia parado de escorrer. Porém, segundo ele, o corte era bem profundo e precisávamos ir às pressas para o hospital.

Hesitei. Hospitais, para mim, eram apenas em último caso.

— Logo vai sarar. — repliquei, retirando minha blusa manchada de sangue e jogando-a no chão, tentando encobrir a sujeira que se formou no local do acidente. — E não deve estar tão feio, você só quer me assustar! Vamos ficar aqui e esperar a comida.

— Não está feio? — disse ele, rindo nervosamente. Não era uma risadinha debochada, mas sim nervosa, quase diabólica. — Tem um buraco desse tamanho. — Ele gesticulou com a mão, indicando o tamanho do machucado. Caberiam três cabeças minhas no espaço. — Vai ficar uma cicatriz horrível se não for suturado corretamente.

Cicatriz horrível.

Um bom motivo para ir ao hospital. Eu não queria uma cicatriz horrenda na testa e ser obrigada a usar uma franja brega para escondê-la.

Levei a mão até os empelicados de gases na testa e soltei um grunhido de preocupação.

— Você é quem sabe. — disse ele, balançando os ombros como se não se importasse. — Não sou eu que vai ficar um buraco na testa para sempre e desse tamanho. — Gesticulou, mais uma vez, com as mãos o tamanho do machucado.

— Vou vestir uma blusa e pegar os documentos. — falei, levemente aflita, ao levantar da cama. Gregório deu um meio sorriso, satisfeito com a minha decisão. Eu não estava feliz com o rumo daquela noite. Do céu ao inferno. E o pior, ao inferno com muita fome. — E a comida? Daqui pouco vai chegar.

— Podemos falar com o porteiro e pedir para guardar. — disse ele, entrelaçando o seu braço no meu e guiando-me até o closet.

********

O centro de triagem do hospital estava cheíssimo. Uma terrível maldição se abateu sobre a cidade, fazendo com que pessoas caíssem e sofressem graves lesões em diferentes partes do corpo. Em menos de trinta minutos, cinco pessoas se juntaram à fila de atendimento devido a acidentes domésticos que causaram cortes na testa. Comentei com Gregório sobre o quão estranha era aquela coincidência, mas ele não levou a sério. Apenas sorriu e, de forma zombeteira, disse que era normal ter várias pessoas feridas em um hospital, apertando a minha mão.

Fiquei agitada para compartilhar esse fato estranho com Salete, mas achei melhor não incomodá-la. Já era mais de meia-noite e não queria perturbar seu sono com minhas bobagens.

O tempo foi passando e, todas as vezes que chegava a minha vez de ser atendida, alguém com uma lesão grave surgia no chão e me roubava o lugar. Primeiro foi uma criança nos braços da mãe, com uma queimadura no braço; em seguida, um homem embriagado com um corte profundo no pé; e, para piorar, uma menina, amparada por uma policial, muito machucada no rosto. A forma que andava denunciava que havia sido vítima de uma violência brutal. Meu coração se desperdiçou e tive vontade de chorar.

Descendo do SaltoOnde histórias criam vida. Descubra agora