Capítulo 24

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Estar no meu apartamento me causava tremedeira no corpo e falta de ar. Provavelmente, sofria de uma crise de ansiedade por não conseguir raciocinar rapidamente para livrar o Robert Rocha da minha vida e da Guilhermina. Já não devia tanto a ele; sem juros, a dívida ficaria em torno de cento e oitenta e cinco mil. No máximo, ele me cobraria uns duzentos mil. No momento, não possuía dinheiro disponível, pois todas as minhas reservas foram aplicadas na bolsa de valores que, para meu grande azar, tiveram mais perdas do que ganhos. 70% aplicados na bolsa foram para o beleléu. Ainda me restavam alguns títulos, porém não podia resgatá-los de imediato e o valor não era tão significativo assim. A única alternativa viável seria vender os meus bens, que tanto sacrifiquei para obter. Desfaria do carro, bolsas e roupas de grife e, em última instância, se o banco não tomasse por falta de pagamento, o meu apartamento dos sonhos, pois não sabia se no futuro conseguiria arcar com as longas prestações do financiamento.

Tudo no apartamento, de 153 m², foi tão sonhado e planejado. O piso claro de madeira laminado, onde custou praticamente os meus dois rins e toda a pele, por todo local criava um belo contraste com as paredes de dois tons mais escuros, quase um marrom, tornando as coisas formidáveis. A enorme sala solidária era rainha das coisas formidáveis, título arremetido graças aos quadros de artistas brasileiros - não muito conhecidos - pendurados na parede e as esculturas finíssimas adquiridas em lojas de decoração de classe alta. A cozinha e a sala de jantar, raramente usadas, por ser integrada à sala, ganhavam o gostinho de serem as sub-rainhas das coisas formidáveis devido à visão perfeita que possuía da sala com seu aconchegante sofá branco para dez pessoas em sintonia com a decoração de tirar o fôlego de qualquer apreciador da arte.

Indiscutivelmente, a sala era o meu local predileto no apartamento. Mais do que meu espaçoso quarto que, em um conceito aberto, unia o escritório, closet e banheiro, que custaram os meus outros órgãos.

Era bom morar em um lugar rico, que exalava bom gosto e superioridade, em comparação aos familiares que moravam em um casebre apertado e barulhento. Talvez eu gostaria de ter um pouco de barulho razoável em meu imóvel. A maioria dos meus dias no apartamento era tão fúnebre que conseguia até escutar os meus batimentos cardíacos devido ao tedioso silêncio. Ouvia-se apenas um pouco de som quando James surgia ou algum namorado colhido na esquina vinha me fazer uma visita.

Destruída pelo longo voo de volta para casa e com os problemas borbulhando no meu juízo, recorri a dois Zolpidem para dormir antes mesmo de tomar um banho.

******

No sétimo dia, reclusa no apartamento, que parecia ser do tamanho de uma caixinha de fósforo, sem apreciar a claridade do sol e evitando fazer a higiene pessoal, andava em círculos pela sala para acalmar um pouco os meus nervos. Era a décima crise de ansiedade em uma semana. Na noite passada, e repassada e re-repassada, precisei me dopar de medicamentos, pois não aguentava mais conviver com o aperto no coração, choradeira infinita e dificuldade de respirar. Os medicamentos, adquiridos de formas ilegais, já entravam no seu estoque de risco, deixando-me mais nervosa e, consequentemente, ocasionando uma nova crise de ansiedade. Como iria avançar um novo dia se não conseguisse dormir durante todo o tempo? Eu precisava renovar as minhas drogas e continuar existindo.

Renovar o estoque era o primeiro passo para o sucesso.

Tentei ir até o closet e trocar a roupa que estava grudada em meu corpo desde o dia que retornei de viagem, mas na metade do percurso algo fez com que eu perdesse o meu objetivo. Esbarrei na minha cama e acabei deitando sobre ela. Ao seu lado esquerdo havia uma mesa de cabeceira e, em cima dela, metade de uma cartela de Zolpidem. Tomei um e, gradativamente, os meus olhos começaram a pesar até que se fecharam.

Acordei um tempo depois, desnorteada. Sete dias sem me situar sobre as coisas mais simples do dia a dia, como as horas. Levantei da cama e, cambaleando feito um bêbado alcoólatra, fui à cozinha em busca de algum alimento. Já não havia comida na despensa ou na geladeira; a solução seria pedir comida por algum aplicativo. Porém, nem sabia onde estava o celular, não o via desde que retornei de Chicago.

Descendo do SaltoOnde histórias criam vida. Descubra agora