Capítulo 17

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Acreditar que o caminho que nossa vida segue é apenas uma linha reta sem desvios ou curvas é no mínimo insensato e eu por muito tempo acreditei nisso, acreditei que viveria toda minha vida naquela cidadezinha do interior, que cuidaria da minha mãe, que viveria sobre o cabresto do meu pai, me casaria, teria filhos e fim, mas não foi isso que a vida me mostrou, com cada curva e desvio que eu topei pelos caminhos da minha vida eu fui perdendo aquela visão planejada, ilusória e talvez deprimente do que seria meu futuro.

Não vou dizer que não tinha sonhos, mas os achava grandes e impossíveis de se tornarem reais, mas na minha teimosia de que não conseguiria realizar nada do que queria, estou aqui hoje, um diploma em uma das melhores universidades da Europa, viajei para vários paises, conheci pessoas, culturas e crenças tão diversificadas que foram aos poucos apagando os traços da menina do interior que não sabia nem um terço do que a mulher que está aqui em frente ao espelho sabe.

Eu mudei muito, a vida tirou de mim aquele ar angelical de muitos anos atrás, me fez uma pessoa dura e insensível, às únicas pessoas que conseguia tirar algum sentimento de mim eram minha família e as minhas crianças do hospital, minha alma se perdeu depois do que aquele homem fez comigo e eu recuperei um pouco dela com o meu filho, mas novamente a vida foi traiçoeira comigo e me tirou isso também e hoje eu não sei se consigo me importar mais, não sei se tem como desabrochar de mim algum sentimento que não seja dor ou raiva para aqueles que não fazem parte da minha vida diariamente.

- Ana me empresta aquele tayer verde, que você usou naquela entrevista da faculdade?

Meus pensamentos foram afastados completamente quando uma July esbaforida entra no quarto vestida com uma blusa branca de seda, uma calça flare preta e um scarpin preto com o salto mais fino do quê o palito que estava usando para prender meus cabelos em um coque bagunçado.

- não. - ela já ia em direção ao meu closet, quando eu falei, parou e se virou pra mim com os olhos bem abertos.

- o que disse?

- eu disse não, toda vez que você pega uma coisa minha você se apodera, as vezes eu esqueço que eu comprei tal roupa ou tal sapato porque você não sai de dentro e eu amo esse tayer e eu não quero dá-lo a você.

- não é dar é emprestar.

- diga isso para o seu cérebro, ele que esquece a diferença dessas duas palavras.

- tudo bem eu vou trocar de roupa.- ela deixa os ombros dela se curvarem em sinal de derrota - eu fiz esse look pensando em usá-lo com o tayer, se não vai ter tayer não faz sentindo usá-lo e eu estava me sentindo tão linda.

E ela estava mesmo linda, mas quando é que isso não acontecia era raro ver a July desalinhada, no hospital em Londres muitas meninas vinham me perguntar o que ela usava para estar sempre com a pele perfeita e a roupa mais perfeita ainda se ela vivia naquele hospital e eu não podia falar nada porquê não tinha uma receita, era só a July sendo a July, não tinha explicação.

- tudo bem pode pegar, ele vai ficar lindo em você e vai destacar os seus olhos, mas usa, lava e traz de volta sem demora.

Ela deu um pulinho e saiu correndo em direção ao meu closet, saiu de lá com o tayer já vestido e enrugando as mangas na altura dos cotovelos.

- o que acha?

- linda como sempre.- eu digo revirando os olhos.

- o que vai fazer hoje? - eu pergunto.

- tenho uma entrevista, naquele hospital que eu queria trabalhar, que é referência na área de oncologia aqui no Brasil.

- vc disse que achava impossível conseguir uma entrevista?

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