Capítulo 2

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Era mesmo o Rafael. Eu não me enganaria nem por um segundo. Os mesmo traços e a mesma silhueta, porém bem mais acabado. Estava com o rosto sujo, as roupas pareciam usadas, os olhos vermelhos como sangue, um olhar que apresentava ora medo, ora vício.

Quem era esse? De fato, não era o Rafael que eu convivi por anos da minha vida. Estava derrotado. As drogas o engoliram. Não havia mais Rafael.

Eu não o via desde a festa da formatura, na casa da Catarina. E acredito que a Luana e o Gustavo também não. Ele não entrou pra faculdade. Nem ficava nas ruas do bairro. Não sei onde ficava. Mas nunca mais o vi e pra ser sincera, nem queria. Era triste vê-lo daquela forma.
Corri na procura da Luana e do Gustavo. Os dois estavam no bar.

- Gente! Meu deus! - Bufei, ao encostar na bancada do bar.

- O que foi? Aconteceu alguma coisa? - Luana perguntou.

- Não! O Rafael. Ele tá aqui. Ele tá aqui. - Falei, olhando para os dois, na minha frente.

Gustavo levantou o olhar, surpreso e atônito. Como se não acreditasse naquilo. Me olhou e olhou pra Luana, que também estava sem saber o que fazer.

Acho que quem mais sofreu com a perda do Rafael, foi o Gustavo. Eles eram muito amigos. E saber que o amigo só se importava com drogas, doía. Ele evitava falar do Rafael, da forma que podia.

Por um momento percebi que talvez fiz a coisa errada.

Não devia ter contado que o Rafael estava ali.

Que burrice que eu acabei de fazer.

- Onde? - O Gustavo perguntou, já andando pra pista.

- Calma Gustavo. Você não pode fazer nada. - Luana tentava contê-lo.

- Eu não sei. Ele estava perto da entrada. - Falei. - Mas Gustavo, esquece isso. Eu não devia ter falado.

- Eu quero ver ele. Só ver.

- Não, Gustavo. Você sabe que vai te fazer mal. Por favor. - Luana implorava.

- Ele é meu amigo! Ou era! Se fosse a Melissa você ia querer ver. Me deixa. - Ele saiu num passo mais apertado, se distanciando de nós.

- Meu Deus Melissa! Por que você foi contar isso? - Luana me olhou, indignada.

- Desculpa. Eu nem raciocinei. Só o vi e...

- Tudo bem. Tudo bem. Uma hora ou outra o Gustavo ia encontrar esse garoto. - Ela fez uma pausa e me olhou - Mas e ai? Como ele tá?

- Péssimo. Não vi muito bem mas... Terrível.

Soltamos a mesma expressão. Aquela de compaixão. Ninguém entendia porque o Rafael se meteu nessa e nunca mais saiu. E nunca iríamos entender.

Eu e a Luana fomos pra onde não tinha muita gente. Depois disso, acredito que não íamos ficar por muito tempo na festa.

Burra.

Por que tocou nesse assunto?

Depois de uns dez minutos, o Gustavo apareceu. Estava com uma expressão abatida, que eu a última vez que o vi assim, foi quando expulsou o Rafael da festa da Catarina, há dois anos. Tinha o olhar triste e cabisbaixo.

Boa Melissa.

- Não fica assim. - Luana o abraçou.

- Ele tá... Irreconhecível. Com as roupas surradas, o olho parece que vai pular das órbitas. Não é a mesma pessoa. Tá pior. Cada vez pior. - Gustavo falou, encostado no ombro da Luana.

- Desculpa. Eu não devia... - Reconheci.

- Melissa. Tá tudo bem. Eu ia ver ele algum dia. Só não esperava que ele estivesse assim...

- Você foi até ele? - A Luana perguntou, se soltando do abraço.

- Não. Não tive coragem.

- Então ele não te viu? - Ela formava uma expressão de alívio.

- Não.

- Menos mal. Vamos pra casa? - Luana questionou, quase afirmando. Sabia que Gustavo diria sim. Ninguém ali tinha condições para ficar mais.

Ele apenas afirmou com a cabeça.

Nos dirigimos até o carro, nos espremendo entre aquelas pessoas que haviam ali. De relance, vi o Rafael novamente. Ele estava num canto, conversando com alguém que aparentava estar pior que ele. Estava com um copo de bebida na mão.

Ele não se arrependia?
Não queria voltar atrás?
Pedir ajuda?
Não lembrava dos amigos?
Dos momentos bons?
De como sua vira era boa e repleta de... Felicidade? Sim, felicidade. Nós éramos ou somos, felizes.

Ao pensar em como a vida dele era boa, e os pais dele? Diziam que a mãe e o pai haviam tentando de tudo. Implorado pro filho voltar pra casa, não dar mais dinheiro, levado-o a força a centros de ajuda. Nada resolveu. Recorreram aos amigos, mas já era tarde demais, que amigos ele tinha, àquela altura? Mal mal tinha o Gustavo, com o tempo, nem ele.

O Rafael sempre foi querido. Tanto pela família quando pelos amigos. Você conhece ele. Eu simplesmente tentava lembrar do Rafael que eu gostava, que todos gostavam. Aquele Rafael babaca e estúpido, esqueci. Não valia a pena lembrá-lo daquela forma. Sei que talvez pareça muito dramático, afinal, ele não está morto mas eu tinha minhas dúvidas: era bem pior ver alguém que você gosta, sofrendo e se destruindo daquele jeito. Talvez a morte não teria sido tão impactante.

Cruel. Eu sei.

Durante esses dois anos, evitamos o Rafael. Não procurávamos, e nem oferecemos ajuda. Eu me sentia culpada e errada. Mas a Luana sempre disse que "não se deve ajudar quem não quer ser ajudado" e ele realmente não queria, naquela época. Hoje eu não sei. Me arrependo sim. Queria tê-lo de volta, como um amigo, pois além do mais, também já superei.

Eu disse que estava mudada.

Superei o Rafael há muito tempo, aliás, a Luana costuma chamar de overcoming. Não era aquela pessoa que fazia meu coração palpitar. Ele fez meu coração em pedaços, a propósito. Não que eu guarde rancor disso, claro que não. Eu só percebi que eu poderia encontar uma pessoa melhor, que não me faria sofrer tanto. Mas confesso que ainda não achei. Alguns beijos ali e aqui, mas nada tão completo, que me fizesse parar o tempo e só pensar nele.

E como já disse, estava bem assim, não quero ser repetitiva.

Pois bem. A noite passou e a sexta-feira foi esquecida. A Luana evitou em cem por cento tocar no nome do Rafael ou se referir a festa. Eu segui a mesma linha. Infelizmente, o Gustavo ainda não tinha... Hm, aceitado muito bem a "perda" do amigo. Nunca entendi porquê. Sei que eram muito próximos, mas já fazem dois anos. Não é muito tempo?

★★★

Confesso que me diverti vendo vocês fazendo várias especulações sobre quem seria "ele". Gente! Achei que vocês iriam saber de primeira (fiquei surpresa). O Bernardo, foi só uma citação de Quase Amigos, uma citação do passado da Melissa. Ele não vai voltar, mesmo hahaha.

Enfim, gostaria de agradecer todas vocês pelo apoio gigantesco, pelos comentários, falando que gostaram e etc. Eu leio tudo que vocês falam e... obrigada, é isso que me motiva, que me faz querer escrever e escrever. Claro, comentem o que acharam desse capitulo e criem mais especulações (juro, adoro ler todas, me dão várias ideias). ❤❤

Quase Amigos #2Onde histórias criam vida. Descubra agora