Capítulo Bônus - especial Rafael

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Antes de mais nada...

Hoje faz exatamente um ano que terminei uma história que eu nem achei que conseguiria escrever –  Quase Amigos 1ª temporada. Afinal, eu não sou nenhuma escritora. Graças a vocês eu comecei a escrever a segunda temporada. Por muito tempo eu achei que ninguém nem leria essa história, mas estamos aí!

Eu resolvi comemorar e agradecer fazendo pouco mas aquilo que é possível: Postando um capítulo bônus de Quase Amigos – 2ª temporada! Vocês me pediram no início para escrever um capítulo com a visão do Rafael, espero não ter decepcionado! (Lembrando que o Rafael não está em condições de retratar nada, então é uma visão do subconsciente dele)

Boa leitura, e um ótimo fim de ano para vocês, que 2017 seja repleto de amor e felicidade! Obrigada infinitamente por tudo 💛

Desde que meus amigos entraram para a faculdade, eu uso drogas. Pode parecer que eu tenha sido só um jovem mimado e um mauricinho de primeira todo esse tempo. Sei que eu também não fui a melhor pessoa existente. Fiz muita merda e muitas vezes fui um grande babaca. Eu sei. Mas jovens fazem cagadas as vezes, não fazem? Eu não sou o único.

Mas francamente, não estou aqui para poder me desculpar com ninguém e me fazer de bom moço.

Tem cerca de dois anos que eu estou "nessa vida". Foi através de um amigo meu que eu experimentei maconha pela primeira vez. Marcos. Ele me ofereceu e disse que era tranquilo. Alegou que iria me fazer bem porque eu precisava relaxar. Eu acreditei. Experimentei e quando eu percebi já estava naquilo todos os dias.

Começou a piorar depois daquela festa na boate no centro. Fumei junto com uns amigos e junto com o Arthur – então peguete da Luana – ele vendia bastante coisa e depois daí, começamos a nos encontrar junto com a galera, como se fosse uma rotina. E ele – o Arthur – nunca mais vi. Uns colegas disseram que mudou de cidade, estado e país.

Não vou bancar o arrependido porque se eu tivesse realmente arrependido, já teria saído de onde estou.

Meus pais descobriram, meus amigos descobriram e como se isso fosse uma sentença de morte, todos se afastaram. Eu mesmo decidi sair de casa e fui morar na ponte junto com uns colegas que também passavam pela mesma coisa que eu. Minha mãe tentava me convencer de voltar todos os dias para a casa. Meu pai veio algumas vezes também mas acabou desistindo.

Todo mundo desistiu.

Eu moro aqui. Durmo num colchonete bem fino, sem travesseiro, com um cobertor velho que eu não faço ideia de onde veio. Não costumamos tomar banho, mas as vezes alguma casa de reabilitação oferece uma comida, um banho. A gente come aquilo que dá. As vezes nem come.

Eu nunca senti que pertencia ao mundo de um adolescente comum. Ir pra faculdade e arrumar uma namorada. Eu não queria responsabilidades e ainda não quero. A droga foi uma saída para que eu pudesse me desligar das responsabilidades. Entrei de cabeça. E quando vi, já estava viciado. Eu não queria me atrelar a nada e aqui eu realmente não tinha nem como me atrelar a algo.

Eu tentava conseguir dinheiro em sinais, fazendo trabalho sujo, ou apelando para pessoas na rua.

É a minha vida agora e se tinha uma coisa que me irritava, era quando alguém vinha me dizendo "coitado" ou "você precisa de ajuda". Talvez eu realmente precise, mas tudo era muito confuso. Eu não consigo estar na minha vida normal, e ao mesmo tempo estar na minha vida voando.

Não consigo pensar sem estar grogue.

A primeira vez que a Melissa apareceu aqui, achei que fosse brincadeira. Depois de sei lá quantos anos, ela resolve vir. Tentar me ajudar, como alegou.

Consegui sentir pena vindo dela. Ela sentia pena de mim. Assim como todos. E eu não a julgava por isso. Sei que minha situação é crítica, mas eu não pedi que ninguém sentisse pena.

Estou parecendo uma garota falando.

Eu e a Melissa tivemos um lance. Mas eu nunca gostei dela e acho que depois dessas vezes que ela veio aqui, ela passou a me odiar.

Lembro das vezes que eu e o Gustavo saíamos a noite para festas. Depois que eu passei a usar drogas, ele nunca veio atrás – exceto um dia. Ele foi um grande amigo, por mais que nos últimos tempos nossos pensamentos já tivessem começado a se embaralhar.

Quando as pessoas falam comigo, sempre acham que eu estou alto e que não entendo o que dizem. Eu me drogo, mas não parei de entender português.

Flashback

- Rafael, meu filho! Por favor, volta pra casa com a gente! Não tem porque você ficar aí! - Minha mãe falava, aos prantos.

Eu não falava nada.

Minha mãe vinha aqui sempre, no início. Trazia comida, roupa, água, sabonete...

- Todo mundo sente sua falta, Rafael!

- Ninguém liga mãe!

- Seu amigo... O Gustavo... Ele... Tá péssimo! A Luana me contou que ele fica mal toda hora...

- Dane-se! - Joguei uma garrafa de cerveja que estava próxima de mim. Acabou acertando na perna da minha mãe. Depois desse dia, ela não veio mais nenhum dia.

Eu também lembro da festa que eu entrei por engano e acabei vendo o Gustavo e a Melissa.

Um colega meu tinha me oferecido uns cigarros e eu fui pegar num beco aqui perto. Entrei numa festa.

Assustei quando vi a Melissa. Ela me olhou perdida, como se não quisesse acreditar que era eu. Nesse dia, eu estava bem alto.

Ela me olhou fundo e saiu correndo, esbarrando em algumas pessoas. Depois de uns dois minutos, apareceu o Gustavo, que me encarou profundamente e me olhou com pena. Pude ver seus olhos se encherem de lágrimas. Ele se virou e voltou para onde estava.

Depois dessa festa, ele veio até aqui. Não sei como me achou. Ele se estreitou e me olhou fundo nos olhos.

O Gustavo ficou parado me observando e tinha uma sacola na mão. Me olhou durante alguns longos minutos e deixou a sacola no chão, indicando que eu a pegasse depois.

Uns amigos pegaram pra mim e tinham algumas comidas e uma folha amassada, que ele parecia ter esquecido. Dizendo: "Me liga de algum orelhão se quiser." E o número do lado.

Eu nunca liguei. Nem sei onde está aquele papel mais, joguei no primeiro lixo que vi.

Eu poderia viver ali naquela ponte até quando desse. Eu me sentia livre diante de tudo que eu fazia. Não precisava dar satisfação para ninguém e nem ficar me preocupando com ninguém.

Eu só tinha uma memória guardada. A foto que a Melissa me deu. Por algum momento, chegou a me dar saudade e pensar em abandonar tudo e voltar a viver minha vida normalmente. Estávamos juntos e felizes naquela foto.

Mas eu não tinha pra onde ir nem onde me encostar.

Provavelmente, ninguém me queria por perto.

Quase Amigos #2Onde histórias criam vida. Descubra agora