O escuro domava a minha visão, não me permitia abrir os olhos, tudo que eu menos queria é ver o rosto daquela criatura antes de ser dilacerada. Senti as penas macias rondarem o meu corpo, aquilo me fez relaxar de uma forma única. Escondi o meu rosto no pescoço macio e de pele branca. Olhei de relance as suas mãos na minha cintura, os dedos pareciam mais ásperos, percebi a ausência do metal grosso dos anéis. Não era Gabriel. Imediatamente comecei a afastar-me, mas o anjo agarrou-me.
— Está tudo bem, eu conheço o Gabriel. — ele disse num tom forte. Como se eu nunca tivesse ouvido isso antes.
— Não me toca! — afirmei rastejando para longe dele.
O anjo agarrou o meu corpo, e levantou voo. Estava novamente a voar nos braços de outro anjo. A ideia assustava-me.
— Íris, confia. — ele proferiu num tom agora frio, e saímos dali.
— Quem é você? — não me permiti toca-lo.
— Um arcanjo, também. Eu estou com Gabriel.
— Já me disseram isso.
— O Rafael é o meu inimigo. Talvez isso te conforte.
— Miguel? — perguntei assim que lembrei-me do nome.
Ele assentiu com um sorriso leve no rosto. Aconcheguei-me nos seus braços. Chegamos a o que parecia uma mansão antiga e rústica. Bastante grande e esnobe. Miguel pousou já próximo da porta. Estava aberta.
— Onde eu estou?
— Na casa dele. — murmurou enquanto caminhávamos para dentro.
— E onde ele está?
— Não demora aparecer.
Sentei-me num sofá de camurça azul-escuro que havia na gigantesca sala de estar. Eu de fato não gostava de coisas grandes e avantajadas, mas a casa era sem dúvida admirável. O aroma lembrava um pouco o perfume de Gabriel, mas com um leve toque de eucalipto. Miguel estava parado à quase um metro de distância. Parecia pensativo enquanto servia-se com uma bebida se cor caramelizada que eu julguei ser whisky.
— Por que você tem asas brancas? — não resisti em perguntar.
Miguel me olhou de soslaio e sorriu.
— Porque eu não caí como Gabriel. — ele sentou-se ao meu lado, com o copo na mão. Miguel irradiava elegância. Era bastante esguio e o cabelo castanho combinava perfeitamente com a pele. Era bastante parecido com Gabriel, em questão de cores. Os olhos também eram verdes, mas não era um verde escuro e vívido como o do anjo negro.
— Então você ainda está no céu? Gabriel caiu sozinho? — ergui as minhas pernas, juntando as mesmas ao meu peito e abraçando-as como de costume.
— Eu não faço parte do céu. Caí de uma forma diferente. Eu queria não pertencer a nenhum dos lados. E para isso só precisei morrer.
— Como assim?
— Gabriel e Lúcifer me mataram. Deus acredita que estou morto. Lúcifer permitiu que eu permanecesse no exílio. Ele só queria que eu estivesse longe do céu.
— Então, você pode... Ressuscitar?
Miguel abanou a cabeça.
— Gabriel é o único arcanjo com o dom de ressuscitação. Ele ressuscita outras pessoas, doando um pouco de si.
— Como Adão e Eva? — encolhi as sobrancelhas.
— Sim. — Miguel tomou a bebida. — Usou uma das costelas direitas para me trazer de volta.

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Crows { H.S }
HorrorAqui, fixarei a minha eterna súplica, por mais que vagueie pelo vale sombrio da morte, que padeça nas mais prolíferas agonias do submundo, livra-me do mal que pelo chamado exílio caminha. Aquele cujo o coração é quente e o olhar, assassino. A criatu...