XVIII

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Íris POV

A vida do meu anjo estava posta nas mãos do homem que uma vez invadiu os meus sonhos. O metal era pálido, quase branco, e parecia cintilar por entre os seus dedos. As minhas mãos começavam a suar. Enquanto a sua voz fria perfurou o meu estômago, a raiva derrubou o meu medo, quando vi a figura feminina esguia que estava ao lado do demónio. Os nossos olhares se cruzaram, e pude sentir o seu remorso em fazer aquilo. Eu não sabia se pensava o quão egoísta ela seria, ou se eu, em seu lugar, teria feito o mesmo. Não conseguia aceitar a ideia de algo que o pudesse ferir. Aterrei o meu rosto no seu bícep, e as minhas mãos alisaram a extensão do seu braço, de algum modo precisava que ele soubesse da minha presença, que estava ali com ele.

— Livrem-se dela.

Asmodeus ordenou. O exército de caças ergueu-se do chão, aparecendo por todos os lados, os seus olhos pesaram a minha alma. O ar atrás de mim deslocou-se quando Gabriel estendeu as grandes asas negras. A armadura de metal, extremamente pesada, envolveu as suas penas, e a sua pele tornou-se fria. Encarei-o e voltei a ver as mesmas manchas negras que subiam por suas veias. Asmodeus, como que também a preparar-se, apertou a lança no seu punho. O seu maxilar dilatou, e o corpo cresceu rígido. As roupas rasgadas não conteram a criatura de chifres e garras em que ele havia se tornado, o rugido que rompeu a sua garganta, fez-me estremecer.

— Gabriel, não.

Miguel pigarreou, inutilmente. O anjo abandonou o meu conforto, avançando em direção ao demónio, que fez o mesmo. Os dois monstros encontraram-se, travando uma luta perigosa. O objeto que tinha o poder de tirar a vida do anjo, destacava-se por entre a mistura de corpos, penas, garras e escuridão.

Os caças aproximaram-se numa velocidade inesperada, e eu estava indefesa. Esperava pelo pior quando Miguel abriu as suas asas, e pôs-se à minha frente, espantando os demónios fracos. Os meus olhos estavam focados na luta, ignorando completamente o perigo que estaria a correr, enquanto Miguel, lutava por mim com centenas de micróbios imundos.

O meu olhar foi de encontro com o dela. Mirage olhava-me com uma raiva incomparável nos olhos. O seu rosto tornava-se mais próximo, o que indicava a sua movimentação. Recuei para trás, sabendo que não podia de forma alguma lutar com aquilo. Miguel estava ocupado com vos caças e Gabriel, ocupado com a sua suposta morte. Eu estava sozinha.

Virei o meu corpo, começando a correr para longe do local, mas algo parecia prender-me, de modo que, por mais que corresse e me cansasse, permanecia no mesmo lugar. Os meus pés foram puxados por uma força descomunal, fazendo com que o meu corpo encontrasse o chão, e seguidamente fosse virado para cima. Observei o seu rosto ainda distante. Mirage ergueu uma mão, e gesticulou com os dedos. Neste instante, o chão começou a mover-se, num tipo de abalo. Uma fenda formou-se atrás do seu corpo, e imediatamente, com os gritos de sofrimento e os reflexos das chamas descobri o que era. O reino do inferno.

O meu corpo ficou frio, e desmotivado. Os meus pés voltaram a ser arrastados rumo aquele mar de fogo, e debater-me era inútil. Gritei com negação, sentindo as pequenas pedras, galhos e terra perfurarem o interior das minhas unhas enquanto tentava impedir que o meu corpo fosse levado. As minhas lágrimas queimavam o meu rosto, mas não como a sensação de saber que o deixaria, queimava o meu peito.

Quando estava suficientemente perto, o meu corpo foi erguido, e os seus dedos esguios agarraram o meu cabelo, estendendo o meu pescoço. Tentava fixar os meus pés no chão, de frente para a fenda do inferno, a qual estava prestes a ser atirada. Os meus sentidos estavam confusos, a minha respiração alterada e, os meus olhos eram meramente tapados pelos meus cabelos.

— Você não o merece. — Mirage resmungou perto do meu ouvido.

— Traz até ele quem o quer matar, e sou eu quem não o merece?

Crows { H.S }Onde histórias criam vida. Descubra agora