Quando acordei estava emaranhada e afogada dentro dos seus braços. Eu tinha receio de afastar o meu corpo, perder o seu calor, fazer com que ele acorde, mas o ar era escasso, como raios eu consegui dormir deste jeito? O anjo abraçava o meu corpo da mesma forma que costumo abraçar as almofadas, prendendo-me contra ele. O meu rosto estava preso no seu peito, e os braços dele à minha volta. O ambiente era calmo, e quase que deixei-me embalar no sono outra vez. Mas eu podia ver o sol pela janela, e isso geralmente não acontecia nos dias de inverno, eu queria aproveitar. O calor do seu corpo era tanto que já me fazia suar, comecei a pensar numa estratégia para sair do seu aperto.
Escorreguei para fora da chave dos seus braços passando por baixo, ficando cansada pelo esforço e atrapalhada com o cabelo loiro. Ele mexeu-se como que a acordar aos poucos e eu meti a almofada que usava entre os seus braços. Ele a apertou com tanta força contra si, que se fosse o meu corpo, poderia não estar com os ossos perfeitos agora. Aquela imagem era adorável. Os seus olhos pareciam completamente selados, daqueles que nunca mais abririam, e o rosto estava descansado, talvez isso tenha sido bom para ele. Desci da cama e caminhei para o seu lado, os meus dedos finos baixaram um pouco da faixa do curativo que voltei a fazer à noite, rendida. A ferida não mostrava grande progresso de cura, mas estava menos profunda. Passei a mão pelo seu rosto, livrando o mesmo da cascata de cabelos cacheados e pude observar o quão angelical ele parecia, quando não tinha acesso ao seu olhar.
No banheiro, eu lavei o rosto e a boca, mas não parecia o suficiente. Abri todos os armários lá presentes e foi num pequenino que encontrei uma escova de dentes transparente, era bastante bonita, porém, dele. Eu tenho a certeza que ele não vai se importar se não saber. Usei a escova para lavar os dentes e depois a toalha para seca-la. Coloquei no mesmo sítio de onde a havia encontrado e depois de secar o rosto voltei para o quarto. Apanhei a minha roupa no chão e despi a camisola masculina que havia vestido antes de dormir, começando a recompor-me.
Ouvi os seus movimentos na cama e encarei-o, eu já tinha a roupa íntima no corpo. Ele procurou o meu corpo com a mão a perambular pelo lençol e ao não encontrar nada, sentou-se na cama um pouco perdido. Quando finalmente o seu olhar pairou em mim, ele parecia confuso e aliviado.
— Você já quer ir? Podia ao menos ter esperado ou me acordado.
A sua voz era incrivelmente rouca a esta hora da manhã. Estampei um breve sorriso no rosto, querendo transmitir a boa impressão matinal, enquanto o observava a tentar arranjar o cabelo.
— Você dorme muito devagar. — comentei.
Ele caminhou para a casa de banho, pude ouvir quando abriu o armário para apanhar a escova e mordi o meu polegar um pouco receosa enquanto segurava os leggings contra o meu corpo. Ele não diz nada, despercebido, e eu termino de me vestir. Apanhei o cabelo num coque atrapalhado e depois procurei o meu aparelho. Encontrei-o na sala ao lado do quarto, em cima de uma cristaleira antiga, e recordei-me que foi ali onde havia mandado sms pela última vez. Fui com o telefone para o quarto e sentei-me na poltrona dele, sentindo o seu cheiro desprender-se do couro e atingir a minha mente.
Gabriel deixou a casa de banho e apareceu no quarto, as suas escleras estavam avermelhadas pela água fria e ele passou as mãos molhadas pelo cabelo antes de as secar na toalha que havia estendido na noite anterior. Enquanto isso, investia nas minhas mensagens de desculpas à Rachel. Supostamente ia dormir com ela quando desapareci por dois dias. Ela visualizava, porém não respondia. Eu entendia o porque de não querer falar comigo. Eu teria de conta-la, em algum momento, ao menos um terço das coisas. Só o que ela não poderia saber é que o meu anjo-da-guarda, é o assassino daquela noite. Quem nos tirou os nossos amigos.
Quando deixamos a mansão, o sol tocou o meu rosto. Estava frio, eu vestia um dos seus moletons. O calor solar na pouca pele que eu tinha exposta parecia acariciar-me. Ele abriu a minha porta, e eu lamentei ao entrar, por ter abandonado o sol. Gabriel ligou o aquecedor, o que me reconfortou naquele momento.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Crows { H.S }
رعبAqui, fixarei a minha eterna súplica, por mais que vagueie pelo vale sombrio da morte, que padeça nas mais prolíferas agonias do submundo, livra-me do mal que pelo chamado exílio caminha. Aquele cujo o coração é quente e o olhar, assassino. A criatu...