Ela parece do tipo que gosta mais de Yuri, do que Yaoi

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Ele parou a moto em frente ao meu prédio e murmurou algo sobre não me dar carona para o bar hoje, mas o fez sem tirar o capacete.

- Tudo bem, o meu carro está aí... - Ele não me olhava de maneira alguma. - Bom, obrigada por-

E ele arrancou com a moto. Literalmente, ele foi embora e me deixou parada no meio da rua, eu continuaria falando se o barulho da moto arrancando não tivesse me assustado. Daniel mudava da água pro vinho em segundos, do nada.

Naquela noite, ele não apareceu no bar, mas ignorei sua ausência quando, no fim de uma noite cansativa, quando abri o quarto de funcionários para pegar minha mochila e encontrei Victor. Ele interrompeu o beijo intenso que dava em outro cara quando ouviu a porta abrir e olhou para mim, meio assustado. O cara com ele havia se apresentado como Carlos, no dia da festa surpresa para Victor, disse que eram amigos. Os dois me olhavam com os olhos arregalados - os olhos mel de Victor e os olhos azuis de Carlos, o cara dos dreads loiros. Sorri para ambos e fechei a porta atrás de mim.

- Se Helena pega vocês aqui, ela não vai ficar nada feliz. - Sussurrei.

- É por isso que a Ju devia estar na porta, guardando caixão! - Victor explodiu numa risada aliviada, depois de falar. - Nossa, Nanda, pensei que você fosse surtar.

- Só porque eu estava indo embora e vejo dois caras muito gatos se beijando? Nah.

- Muito gatos? - Carlos deu um sorrisão, os olhos convidativos.

Ri para os dois e peguei minha mochila.

- Ela parece do tipo que gosta mais Yuri do que Yaoi, Carlos. - E eles riram um pouco. - Mas aquela sua amiga morena...

- Te passo o telefone dela por mensagem! - Ri alto pensando na reação de Nat, mas aí lembrei que ela havia rompido com Rafa e eu.


Eu realmente não esperava que Victor fosse gay, mas esperava ainda menos encontrar Nat no meu apartamento. A paz havia voltado a pairar sobre o meu lar desde que nenhuma de nós três tocasse nos nomes "Samuel" ou "Lívia" e isso não era um grande sacrifício. Nós três dormimos na sala, Nat estava a par do meu novo estado civil e comemorou bastante com isso.

Mesmo depois de uma noite juntas, Rafa ainda olhava magoada para Nat. E eu sabia o que ela pensava como se pudesse ler sua mente. Traição. Ela se sentia traída. Nat tomou as dores de uma amiga sem antes perguntar à outra sobre o assunto. Impulsiva. Era isso o que ela era, como se pudesse agir e ignorar as consequências de tudo o que fazia. É irritante, mas ela ainda está com a gente - e muito empolgada com a preferência sexual de Victor, por sinal.



Na manhã seguinte, recebi a resposta da minha coordenadora do curso e eu havia sido aceita como estagiária de uma grande empresa de publicidade de São Paulo, quase explodi de alegria. Assim que pegasse o diploma, eu já preencheria minha vaga garantida. Era o melhor jeito de começar o dia.

Bruno me mandou uma mensagem. Uma mensagem só me parabenizando pela vaga e eu tive a impressão que a facilidade para o meu ingresso na empresa tivesse alguma coisa a ver com a influência da empresa do seu pai. Ele prometeu que não, pediu que eu valorizasse o meu esforço e comemorasse o meu talento. Antes dessa mensagem, foram três dias sem se falar. Eu pegava o celular o tempo todo, por hábito mesmo, esperando uma mensagem. É simplesmente confuso demais para lidar com o sentimento: sinto falta. Passei dois anos tendo ele na minha vida todos os dias! E, mesmo sentindo falta - mais como hábito, que como saudade -, eu estava melhor assim.


Com Nat de volta na minha vida, ainda mais tão perto da formatura, os dias correram entre provas de vestido e uma ou outra noitada. No "grande dia", cuidei de parecer elegante ao pegar o canudo e deixar a noite correr sem nenhuma surpresa. A comemoração não podia ser noutro lugar que não fosse o bar - cortesia do Davi. E, eu não pude deixar de notar que Daniel não apareceu, nem para a formatura, nem para a festa depois e isso fez com que eu desistisse do plano de ignorar Samuel até ele perceber que estava sendo idiota.

- Sam... - Aproveitei a ida de Lívia até o banheiro para me aproximar.

- Oi, Nanda. - Enfiou as mãos nos bolsos, constrangido.

- Você tem visto o Daniel?

- Não.

- Há quanto tempo?

- Sei lá, umas duas... três semanas. Você o convidou para vir?

- É.

- Bom, eu sinto muito. Eu posso ligar para ele, se quiser. - Sacou o celular do bolso.

- Não, não precisa, obrigada. - Comecei a me afastar quando vi Lívia saindo do banheiro com o batom retocado.

Eu simplesmente não conseguia mais achar aquela mulher doce ou gentil, como antes. A visão que eu tinha de Lívia estava acabada e eu só conseguia vê-la como uma manipuladora usando um batom bonito. E Samuel, bom, ele só estava tentando seguir em frente. Eu queria muito odiá-lo, mas eu sabia que havia razões para fazer o que estava fazendo, então eu só fingia odiá-lo.


Eu não questionei Davi ou Helena, mas sabia que já havia passado três dias desde o fim das férias de Daniel. Seu celular devia estar repleto de mensagens de texto e ligações perdidas, mas ele preferiu não dar sinal de vida. Eu não pensei, quando me vi, já estava falando:

- Victor, você pode me fazer um favor?

Para: ClariceOnde histórias criam vida. Descubra agora