Capítulo 29

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Sam

Quando enfim conseguimos voltar para a estrada, percebi que Sammy estava  sorrindo outra vez. Este caos todo está mexendo com ela, mas não tenho ideia se é algo bom ou ruim, queria que ela parasse de tentar esconder seus sentimentos e me contasse o que se passa em sua cabeça neste exato momento.

Não lhe pergunto o porquê do sorriso, essa é uma das raras vezes em que a vi sorrir de verdade. Mas posso garantir, ela não está feliz porque vamos voltar para casa. Precisamos do dinheiro, e eu o tenho guardado, este é o único motivo para estarmos voltando, depois disso eu a levarei até Los Angeles, como o prometido. Será uma longa viagem, mas acho que pode ser uma boa experiência para compensar os dias em que estivemos longe um do outro.

-Já está escurecendo. - Sammy diz. Olho para o céu e percebo que ele está formando uma camada azul escura, ao longe, consigo ver uma pequena estrela, sozinha a brilhar.

-Está com frio? - pergunto, ao perceber que seus braços abraçam o próprio corpo. 

-Estou bem. Acho que não estamos muito longe de casa. - seu olhar volta para o céu, como se não existisse outra coisa a contemplar. - Sam, posso fazer uma pergunta?

Engulo em seco, fazendo meu pomo-de-adão subir e descer. 

-Claro.

-Por que você não tentou me ligar? - ela me encara. 

Na verdade, não sei porquê esqueci que podia ter ligado para ela. Acho que fiquei tão maluco, fiquei preocupado em encontrá-la e trazê-la de volta em segurança que acabei me esquecendo de que podia fazer algo óbvio. Afinal, quando se está desesperado, o seu cérebro não consegue pensar direito.

-Você ia atender? Se eu tivesse te ligado? - ela parece ponderar por um momento.

-Não. 

-Então está respondida a sua pergunta. - prefiro deixar por assim. 

As vezes chego a pensar, se tudo isso que estamos vivendo, é real. É difícil acreditar que passamos por tudo aquilo e que ainda iremos passar por muitas coisas, e isso me dá medo, não saber o que nos espera lá na frente. Acho que todos tememos o futuro. 

&

Depois de ficarmos caminhando por quase três horas, o céu finalmente escurecera por completo, restando apenas os postes a iluminarem as calçadas e as estrelas penduradas sobre nossas cabeças. Estávamos agora, dobrando a rua que daria direto para nossas respectivas casas.

Paro Sammy com um toque em seu braço, faltando apenas uma quadra para chegarmos lá.

-Minha mãe deve estar dormindo a esta hora, ela pegou o costume de dormir cedo. Então, vamos tentar entrar de fininho. - falo, e sua cabeça balança em negação.

-Nem pensar. Você vai entrar sozinho, e pegar o dinheiro. É muito arriscado se formos nós dois. - concordo com ela. - Eu vou ficar te esperando no salgueiro.

Conforme passávamos pelas casas, as luzes iam se desligando pouco a pouco. Meu coração martelava apressado no peito, com medo de ser pego. Se minha mãe me pegar entrando naquela casa, tudo já era. Sammy provavelmente fugirá de novo e eu irei enlouquecer tentando encontra-la novamente. Por isso tomarei todo cuidado do mundo para não estragar nossos planos. 

Acho que todo mundo, uma vez na vida, deveria sentir essa sensação que estou sentindo, o medo de ser pego fazendo algo errado. Sempre quis fazer algo grandioso, algo que pudesse fazer as pessoas suspirarem, ou algo que servisse de história para contar  para meus filhos e netos. Talvez tenha chegado a hora. Não há graça viver a vida, se você nunca quebrar uma regra sequer. 

-Tome cuidado. - Sammy me avisa, e para minha surpresa, ela me puxa com todas as suas forças para si, juntando nossos lábios em uma explosão de emoção. - Eu te amo.

-Eu também te amo. - nossos olhos se encontram e uma pequena fagulha se ascende dentro de mim, me dando forças para prosseguir.

Assim, tomamos rumos diferentes. Enquanto Sammy segue para o salgueiro, eu me apresso a chegar até a entrada, onde há uma chave escondida dentro de um vaso de flor que minha mãe ama. Percebo que a plantinha está morrendo, suas folhas estão caídas, e suas pétalas murchas, acho que ela já nem se lembra mais que tem que regá-la. 

Pego a chave e me dirijo até a porta, enfiando a chave na fechadura, onde com um clic baixo a porta se abre. O ambiente está quente e escuro, mas por sorte, a luz da rua ilumina o espaço. Subo as escadas, calmamente, pondo um pé de cada vez. Quando alcanço o último degrau, percebo um pequeno facho de luz atravessar por baixo da porta, onde é o quarto de mamãe. 

Passo devagar pela porta dela e logo abro a do meu quarto que fica logo depois do banheiro. Assim que entro, fecho a porta depressa. Corro até meu guarda-roupa e procuro no fundo da última gaveta um pequeno baú, o retiro de lá e assim que o abro, vejo que todo o dinheiro que consegui reunir trabalhando, está ainda ali. Pego minha mochila velha e boto o pequeno baú dentro, logo pego algumas roupas também. O clima aqui é muito frio. 

Quando estou indo em direção a janela, percebo um movimento do outro lado da porta, acho que é minha mãe. Me deito de bruços no chão, ao lado da cama e devagar me rastejo para baixo dela, tempo o suficiente para conseguir me esconder por inteiro antes da porta se abrir e minha mãe entrar. Fico imóvel, meu coração parece dançar por todos os lados. Seus pés se dirigem até a cama, onde ela se senta. 

-Onde você está Sam? - mamãe fala, a dor em sua voz é profunda. Ela suspira e volta a falar: - Queria poder me desculpar por tudo, sei que não fui uma boa mãe. Mas... - ela solta uma fungada. - Ah Deus, eu devia ter contado a ele. Talvez se eu o tivesse contado, ele estaria ainda aqui. - ela se ergue da cama e caminha em direção a porta. - Não seja estúpida, você não pode usar isso contra seu garoto. - ela suspira uma última vez e então diz: - Eu sempre soube, que ele e Sammy foram feitos um para o outro. Não deveria ter dito a ele as coisas que disse.

Mas do que será que ela está falando? Usar o que contra mim? Contar o que?  

Seja o que for, terá que ficar para quando eu voltar, porque agora Sammy está me esperando. Saio debaixo da cama e me levanto, limpando as calças. Abro a janela e passo uma perna de cada vez, e assim que consigo por meu corpo todo para fora, ando devagar até o salgueiro, e me agarro a um de seus galhos que me levam de volta ao chão firme. 

Procuro Sammy por todos os lados, mas não a encontro. 

-Sammy! - falo baixinho. Nada. - Sammy, onde você está? - falo baixo novamente, mas não recebo nenhuma resposta. O nervosismo já se espalhando.

-Aqui Sam! - ela reaparece perto dos fundos de sua casa. Ela faz um sinal com a mão para que eu vá onde ela está. Logo me acalmo.

-O que você está fazendo? Temos que ir, já consegui... - de repente vejo o que ela estava fazendo e não posso deixar de entrar em pânico. - O que você fez? Por que fez isso? Agora sim, eles vão saber que passamos por aqui!

Sammy havia escrito na parede de sua casa com um spray vermelho:

EU SEI DE TODA A VERDADE PAI. POR QUE INSISTE EM MENTIR? 

-Para Sam! Eu quero torturar um pouco o meu pai, o que tem de mal nisso? 

-Nada. Mas vamos logo, já consegui o que precisávamos. 



Sammy & SamOnde histórias criam vida. Descubra agora