O caminho de volta já devia ter entrado no meu sangue, ou então sou um motorista bom pra caramba. Uma parte dos meus reflexos funcionava para que eu não causasse um acidente, mas minha cabeça estava viajando, completamente longe do caminho. Só queria chegar em casa. Só queria estar perto dela.
Tenho uma grande amiga, Ava, que me dá uns conselhos fodas de tempos em tempos. O melhor deles foi me falar para parar de tentar ser um cara legal, em oposição ao total filho da puta que eu era quando não estava me esforçando para tentar fazer tudo certinho. Ava disse para eu me colocar de fora de uma história que não era minha, parar de tentar achar paliativos para o que me doía. Viver. Fazer o que eu tinha vontade.
Vivi dezesseis anos com vontade de beijar a Malu. Até que a beijei. E viveria o resto da minha vida querendo beijá-la de novo.
Com a partida da Kate, eu e Malu estávamos sozinhos na mesma casa por sei lá quanto tempo. Me coloquei disponível para o caso de realmente ter alguma chance com ela, o que pode ter sido um tremendo tiro n'água. Porque a Malu não me via como um futuro real. Ela me via como um futuro alternativo. A frase: "A gente poderia ter sido tão feliz, Eddie" me assombraria para sempre. E doía como a morte. Ela era a síntese do que poderia ter sido. Se eu não tivesse sido covarde. Se eu tivesse batido de frente com o Tom. Se eu não tivesse dado o duvidoso como certo e tivesse ousado determinar os rumos de uma história que ainda estava sendo construída. Agora a história estava pronta. E eu era apenas um final fantasioso que o autor não teve colhão de escrever.
Estacionei o carro, abri a porta de casa e a chamei. Nada. A procurei na casa inteira e não a encontrei. Só queria ficar perto dela, bater papo. Nada no mundo me fazia tão feliz quanto estar ao seu lado, e não era o fato de estarmos juntos o verão inteiro que atenuava a saudade quando não a via por cinco minutos. Decepcionado pra cacete, concluí que ela havia ido dormir. Fui à cozinha pegar um vinho e achei que vi algo pela janela. Dei uma gargalhada sem me dar conta. Ela estava dormindo na praia.
Amo uma porrada de coisas na Malu. Uma delas é que ela sempre se diz certinha, sempre aposta no convencional, e sempre faz as coisas mais loucas. Não é hipocrisia. É que o mundo foi feito com uma boa dose de mágica, e ela detém a maior parte dela, só não tem consciência disso. Coloquei o vinho no lugar, peguei duas Coca-Colas e fui até lá.
Toquei levemente o seu ombro e ela acordou de um salto. Sentei ao seu lado e lhe passei uma das garrafas.
-Seu quarto é tão desconfortável assim que você resolveu dormir na praia, princesa?
-Eu estava mandando bons fluidos pra família do Vince – Ela explicou. Cara, como não se apaixonar por uma pessoa dessas?
Passamos um tempão conversando. Falamos sobre o pai do Vince, os pais dela, sobre o meu. Nossa conversa às vezes é séria, às vezes tem leveza, muitas vezes tem os dois. Naquela noite ela queria saber sobre como o meu pai morreu, o que ele fazia, e me toquei que eu e ele éramos tão distantes que até a Malu sabia tão pouco. O assunto acabou chegando na falta de planos do meu pai. Na sua incapacidade de se reinventar. Era preciso tão pouco para que ele fosse um cara feliz. Um homem inteligente pra caramba, e só lhe faltou jogo de cintura. Não fosse isso, nossas vidas teriam sido muito diferentes.
-Eddie? – Ela murmurou, olhando para o mar. Ela olhava pouco para mim, mas eu não me importava, pois assim eu podia observá-la. Havia uma brisa suave bagunçando seus cabelos, seus cachos caindo sobre as costas, o luar iluminando o seu perfil, e juro que nunca vi uma mulher mais linda na vida.
-Oi.
-A tattoo. Quando você fez?
Claro, eu sabia exatamente de qual ela estava falando.
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O Lado Escuro da Lua - Primeira Geração
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