Stallone, cupins e pernilongos

51 4 7
                                    

Cupim – bicho do capeta. Por causa deles não posso mais falar que moro sozinho. Aliás, seria uma hipocrisia. Do modo como a coisa anda, mal posso dizer que vivo em comunidade, já é quase uma conurbação. Comecei, inclusive, a delimitar minha casa em bairros, vilas, conjuntos habitacionais e cortiços de cupins. A rapaziada do sofá, por exemplo, intitulo de "a turma do centro", os cupinzinhos que se assentaram na mesa já são mais da periferia, os que se mudaram para a estante são a high society, olhando todos por cima. E tenho feito o que posso para impedir as invasões no armário, mas, sabe como é, o crescimento populacional suplanta nossa capacidade de oferecer moradias de qualidade nas regiões já habitadas.

Por ora tenho me adaptado bem a eles, com exceção do período logo após o carnaval. Fiquei alguns dias fora e quando voltei para casa deparei-me com o caos. Era asinha de cupim pra todo lado, misturadas àquela serragem – cuja presença é um claro indício de banquete –, além de latinhas de lança-perfume, confetes, serpentina e um ou outro corpo estendido no chão. Uma zona! Fiquei horas varrendo, varrendo, varrendo e não dava conta de me livrar de tanta asa de cupim. Mas não fiz mais do que dar um pito na galera, pois não queria criar inimizade com os vizinhos por coisa pouca. De todo modo, já os avisei que se alguém chegar perto do meu violão aí, sim, o pau vai cantar.

Contudo, não bastasse ter de praticar a política da boa vizinhança com os cupins, dia desses precisei tratar com uma migração de pernilongos. Dormia tranquilamente e comecei a sonhar que estava voando. Gosto de sonhar que estou voando. Voava por sobre o mar, cânions, florestas e apenas ouvia a brisa em meus ouvidos. Logo a brisa deu vez a um zumbido infernal, zzzzzzzzzz, e despenquei lá de cima, só não me espatifando no chão porque, ufa!, era sonho. Quando acendi a luz, percebi que estava sob ataque. Milhões de pernilongos – sim, deixei a janela aberta – me atacavam e eu ali, me defendendo como podia. Peguei uma camiseta, que era o que tinha à mão, e dê-lhe porrada nos pernilongos. Mas eram muitos.

Fui um bravo por horas, abatendo pernilongos aqui e ali, esmagando-os contra a parede e deixando rastros de sangue por todo canto. Até coloquei uma faixa na cabeça e cantarolei a música do Rambo, tanã tana-nana-nã, pois certamente matei mais inimigos naquela noite do que o Stallone em toda a trilogia. Em um determinado momento, pressenti que seria vencido por meus adversários e achei melhor pedir reforço. Fui até a sala e, como fez o general Custer na Batalha de Gettysgurg, gritei: cavalaria, ATACAR! E saí correndo, crente que meus amigos cupins viriam em meu auxílio. Ledo engano. Tratantes!

Por fim, venci os pernilongos, sozinho, após horas de batalha, e decidi cortar relações diplomáticas com os cupins. Temo sofrer bloqueios e sanções econômicas da parte deles, mas agora é guerra!


O Fantástico Mundo das QuinquilhariasOnde histórias criam vida. Descubra agora