Capítulo 34 - Parte I

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Na cabana em Fernando de Noronha...

Os jovens estavam aproveitando o conforto da casa de Vicente, o piloto vinha mapeando o aeroporto para organizar a fuga daqui há alguns dias.

Ele decidiu sair sozinho e estudar a rotina da segurança do aeroporto para que eles pudessem quebrá-la com facilidade e sem correr riscos.
Na mesa de jantar ele estava sentado sozinho estudando os mapas e criando rotas, pediu para que ninguém o incomodasse.

Daniel bufou ao se jogar no sofá ao lado de Juliana que linha um livro qualquer.
A garota tentou ignorar o irmão e folheou livro para a próxima página, mas ele começou a reclamar.

— Será que só eu que estou farto de ficar sendo jogado para escanteio? — questionou Daniel cruzando os braços, claramente aborrecido ao olhar para Vicente trabalhando sozinho na mesa de jantar. — Ele não nos deixar ajudar. Não nos deixar sair daqui...

— Depois dos últimos dias de aventura até chegarmos aqui? — perguntou Juliana sem tirar os olhos do livro — Acho que sim.

— Ele não é não. — disse Tiago Oliver entre os dentes, ele estava jogando dominó com Jacqueline e Téodoro e estava perdendo.
Téodoro liderava o rank com 10 pontos, Jacqueline logo atrás com 8 pontos e Tiago com 0 pontos. — Passei. — bufou ele para seus adversários.

Téo gargalhou após introduzir um gabão de pio e encarou Jacqueline que estava analisando o jogo com seriedade de uma jogadora profissional. Ele desviou os olhos da adversaria e olhou para Juliana e Daniel — Eu sinceramente estou de boa. Estamos seguros aqui.

— Seguros e parados. — disse Jacqueline fazendo a sua jogada que fez Tiago resmungar mais uma vez.

Téo mordeu os lábios e soltou um suspiro e esperou a jogada de Tiago.

— Não é possível! Vocês estão de complô! — Bufou ele irritado — Passei de novo. E odeio esse jogo. Odeio dominó.

— Não acho bom a gente se acomodar desse jeito. Ainda estamos na ilha da Ísis. Eles podem nos achar a qualquer momento. — disse a Ferraz mais nova observando Téo colocar a peça que ela esperava, mas ele mudou jogando o outro lado e fechando ela. — Garoto, você tá escondendo peça, é? — disse ela o encarando.

Téo gargalhou — Claro que não. Agora pode passar.

— É por isso que nunca ficamos desarmados. — respondeu Juliana fechando o livro.

— Eu passei. — Disse Jacque estreitando os olhos.

Tiago resmungou e passou novamente.

— Mas estamos baixando a guarda cada vez mais. — disse Daniel e então olhou para Vicente — Ele não confia na gente.

— É claro que ele confia. — disse Tiago encarando Daniel, o mesmo se inclinou para frente para ouvi-lo. — Só não é da politica dele colocar a gente para um trabalho potencialmente perigoso, como a Ísis costuma fazer.

— O que ela costuma fazer? — Perguntaram os três voltando a atenção para o garoto.

Tiago franziu a testa — Vocês não sabem? Onde ela colocou vocês quando os sequestrou?

— Um hotel. — respondeu Juliana como se fosse óbvio.

— Ah... É claro. — disse Tiago como se tudo fizesse sentido.— Filhos de gente importante, né?

— Dá pra responder a pergunta ô pirralho? — sugeriu Daniel.

— Falou, falou. Sem estresse. — disse Tiago erguendo as mãos — Ela separa os jovens. Meninos e meninas. Os largar em um campo cheio de zumbi e joga algumas armas. Quem sobreviver ela recruta.

Os três arregalaram os olhos surpresos. Sabiam aquela mulher era perversa e perigosa. Logo perceberam que sabiam de menos.

— Tá falando sério? — questionou Téodoro o encarando. Sem conseguir acreditar no que estava ouvindo. Ela tinha uma filha e uma neta, como poderia fazer isso com os filhos e netos dos outros?

Tiago assentiu seriamente.

— Isso quando os pais ou responsáveis não fazem o que ela manda? — perguntou Juliana.

Tiago balançou a cabeça negativamente — Independente dos pais a obedeceram ou não. Ela deu a idade mínima para servi a ela. Quinze anos.

Juliana balançou a cabeça indignada — Inacreditável. Essa mulher é um monstro.

Tiago soltou uma risada irônica — Monstro é apelido carinho... — ele parou e olhou para a cozinha e viu a irmã concentrada nas panelas e então sussurrou. — Ela é o próprio diabo.

— Alguém precisa parar essa mulher. — disse Jacqueline. — Ela está indo longe demais! Alguém tem que matá-la.

Juliana encarou o irmão.

— Não cabe a nós. — disse Daniel encarando a irmã mais nova. Ela aparentemente não gostou de ouvir.
As Ferraz eram assim, não conseguiam esconder quando algo as desagradava. Daniel soltou um suspirou e continuou.

— Essa mulher já provou ser muito perigosa. Chega de nos arriscar. Vamos sair dessa ilha e nos encontrar com a nossa família. Já temos problemas o suficiente para resolver.

— Não podemos comprar essa guerra. — disse Juliana encarando a irmã — Por mais que quiséssemos ajudar essas pessoas, está fora do nosso alcance.

— E ela vai continuar escravizando e ameaçando os mais fracos, que não sabem se proteger? — questionou Jacque — Enquanto a gente foge em um belo avião. Pais morrem, filhos morrem. Pelo capricho de Ísis. E sabendo disso nós vamos fugir sem fazer nada? Sem ao menos dar o que ela merece?

Jacqueline se levantou e foi para o quintal em passo pesados.

— Nossa... — disse Téodoro após a porta se fechar com força.

— Eu vou falar com ela. — disse Juliana começando a se levantar.

— Ela precisa de um tempo sozinha. A última coisa que ela quer ouvir agora é um sermão de um irmão mais velho. — disse Daniel segurando a mão da irmã, ela a puxou a fazendo sentar novamente. — Ela vai entender que não podemos salvar o mundo.

— O que me preocupa é o tempo que ela ficou sozinha. — disse Juliana o encarando e então olhou para Téodoro — Ela não me contou tudo.

— Eu vou ajudar o meu irmão e a Bia na cozinha. — disse o garoto se levantando e escapando do futuro interrogatório.

— Aconteceram muitas coisas com a gente nesses últimos meses. — disse Daniel olhando para Juliana. — Você também não contou muita coisa. Não contou sobre o incêndio no refeitório da escola. Não contou o que aconteceu com o Fernando. O que ele fez com...

— Nada. — respondeu Juliana cortando o irmão.

— Não estou mais questionando. Só estou comentando. Eu resolvi guardar alguns acontecimentos para mim... Nossa mãe então, nem se fala. — ele segurou a mão dela — Há coisas que não queremos compartilhar, só deixar no fundo da mente e tentar esquecer. Eu estou preocupado com a Jacqueline também, ela tá diferente. Não é uma mudança que me agradou, mas talvez seja necessária para ela sobreviver.

— Vou falar com ela. — disse Tiago se levantando.

— Boa sorte. — disse Juliana.

Ele agradeceu e seguiu até a porta. Tiago respirou fundo e abriu a porta e fechou a trás de si. Jacqueline estava sentada no sofá da varanda olhando para o muro.

— Não enche. — ela foi logo dizendo sem nem mesmo olhar para quem era.

Tiago a ignorou e se aproximou se sentando ao seu lado.
Jacqueline bufou, mas não disse mais nada. Ela permaneceu encarando o muro.
Tiago também não disse nada por alguns minutos, ficou apenas contemplando o trabalho duro do seu pai os protegia da Ísis e seu exercito do outro lado.
Ele imaginou Vicente trabalhando sozinho, cortando arvores, talhando os troncos, amarrando uns aos outros, cravando na terra e levantando.
Sozinho?
Não, impossível.
Ele teve ajuda.
Só não imaginava de quem.
Perguntaria assim que tivesse a oportunidade.

Tiago novamente respirou profundamente apagando os devaneios e atraindo um olhar rápido de Jacqueline e então começou a falar.

— Eu tenho milhares de motivos para querer a Ísis morta. — disse Tiago olhando para o muro — Ela mandou a minha mãe para morrer. Ela planejou uma armadilha para matar a minha mãe e tirar o meu pai de mim. Escravizou ele, o deixou morrendo nas suas prisões mais sujas. Me deixou morrendo na prisão imunda dela... O meu pensamento dentro daquela prisão era apenas matá-la. Matá-la com as minhas próprias mãos. Por tudo, tudo que ela causou a minha família, a mim...

Jacqueline o encarou, Tiago agora encarava as próprias mãos.

— Mas eu percebi que a morte é fácil demais para alguém que causou tanto mal. A vingança só nos envenena. Tudo que a Ísis fez contra a minha família, foi por vingança. Queria se vingar da minha mãe por ter 'roubado' o marido dela. — ele fez aspas com os dedos e riu sem achar graça — Ela me torturou, me prendeu e me deixou morrendo, só para torturar o meu pai, por não amá-la... Eu pensei muito enquanto estava preso. Fiquei meses lá, tive muito tempo para clarear a mente. Ísis é uma mulher envenenada, morta por dentro. Ela consumiu litros de ódio, inveja, rancor por minha família, pelo meu pai durante anos. Ela se envenenou a cada dia, até chegar ao ponto de se satisfazer de prazer pela dor de terceiros. E eu me perguntei diversas vezes, eu queria mesmo beber desse veneno? Queria consumir ódio e reproduzi-lo em violência. Em maldade, tortura? Queria ficar igual a ela? — ele negou com a cabeça — Não, eu não queria. Jamais seria igual a Ísis. Jamais deixaria o ódio, o rancor me dominar.

Jacqueline abaixou a cabeça e fitou as próprias mãos, procurando o que dizer.

— O que ela fez... O que ela faz. Não tem perdão. — disse Jacqueline.

— Quem disse em perdão? — questionou Tiago — Eu não a perdoei e provavelmente nunca vou perdoar. Ainda quero que a Ísis pague por tudo que ela fez, que ela está fazendo e o que vai fazer. Só que matá-la com facadas ou tiros não vale a pena. Ainda mais nos dias de hoje É bondade demais para quem só causou sofrimento. Ela merece que a vida a machuque, lenta e dolorosamente. E o melhor é que não vai ter ninguém para cuidar dela, para amá-la nos últimos momentos da sua vida. Essa sim, é a pior morte.

Brigada dos Mortos - Sobreviventes em alto marOnde histórias criam vida. Descubra agora