11. SORVETE DE LIMÃO - PARTE II

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- É. Médico neurocirurgião. Tenho que lidar com a morte todos os dias, por isso não suporto fazer parte desse cenário quando não há necessidade. Evito o quanto posso. Mas... – ele falou olhando para o chão encontrando seus pés – Uso sapatos de couro.

Eu caí na risada, mas logo fiquei apreensiva já que ele poderia não achar meu gesto muito adequado. No entanto, ele ria também, disfarçando o pesar, obviamente, mas ria.

- E é por isso que eu te digo Sofia, eu apenas evito.

- E é por isso que eu te digo, Cristofer. Muito nobre! E isso não é sapato, é tênis.

- Certo, eu me rendo! – pude ver descontração em suas palavras e vibrei.

- Eu te avisei certa vez de que sempre teria razão.

- É. Eu me lembro. Deveria ter te levado mais a sério – falou zombando.

- Se você não se comportar o tempero da próxima iguaria pode ser cicuta – o repreendi entre risadas, e logo em seguida me repreendi mentalmente com medo que tivesse pegado pesado.

- Você vai se surpreender ao notar como sou resistente.

Ufa. Ele continuou a brincadeira.

- já notei. Respostas sempre prontas na ponta da língua. Quero ver é se essa sua língua afiada vai resistir à minha calda de sorvete.

- Sorvete! – falou de sobressalto.

- Sim, sorvete. Mas ele vai ser apenas coadjuvante dessa vez – comuniquei enquanto retirava nossos pratos da mesa e os colocava na pia.

- O que vai fazer?

- Calda de laranja. Alguma objeção?

- Não, não. Nenhuma – então como quem fecha um zíper, ele passou o dedão e o dedo indicador na boca e ficou atento a cada passo que eu dava pela cozinha. A única coisa que se ouvia era o tilintar da colher na panela.

Eu sabia que ele estava me olhando, então não desviava os olhos da panela. Sem olhar para ele eu já sentia meu rosto ferver e corar, se eu o olhasse, entraria em combustão espontânea. Mesmo que eu pudesse usar o calor que vinha do fogão como desculpa, preferi não olhar, me mantendo na segurança e na hipnose da calda se movendo no ritmo da colher.

- Voilà – falei colocando em sua frente uma taça de sorvete de limão repleto de calda ainda morna de laranja com uma folhinha de hortelã no topo.

- Pensei que seu balé culinário não fosse acabar tão cedo.

Eu mostrei a língua pra ele me sentando a sua frente mais uma vez e com a minha taça de sorvete em punho.

Não movi um músculo sequer enquanto a expectativa tomava conta de mim. Queria ver com detalhes cada reação dele ao provar da sobremesa.

Ele nem notou meu deslumbramento com a situação. Enquanto seus olhos brilhavam ao ver o sorvete, os meus se moviam inconstantes com as pupilas dilatadas em direção a minha mais nova cobaia.

- Hummm – foi o som que ele emitiu com os olhos apertados enquanto degustava o sorvete.

Eu nem pensava em piscar e perder uma fração de segundo da cena que eu estava presenciando bem diante do meu nariz.

Não queria falar para não despertar Cristofer de tanto regozijo, mas eu precisava ouvir além e observar.

- Então...? – quis saber ansiosa.

O Novo InquilinoOnde histórias criam vida. Descubra agora