Por um mercúrio de presente

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Querido papai noel,

Sei que você tem motivos o suficiente para me mandar colocar essa minha carta naquele lugar específico, cujo nome eu não direi em respeito ao senhor, que provavelmente nunca deve ter ouvido um palavrão. Mas antes de ir direto ao ponto, eu gostaria de pedir-lhe para levar em consideração o grande esforço que estou fazendo para escrevê-la e o esforço bônus para referir-me a você pelo termo "querido".

Sendo objetivo: estou apaixonado pelo Mercúrio, meu melhor amigo. Não sei como isso foi acontecer, pois, quase sempre sou capaz de controlar meus sentimentos e simplesmente dizer "não" quando eu sentia que algo não acabaria bem, mas nesse caso, sinto-me como quem está caindo em um abismo e por mais que eu tente dizer negar, me vejo cada vez mais apaixonado.

Não faço ideia de como explicar, porém, não vou dizer que foi a famosa paixão à primeira vista, porque não foi. Ao contrário, eu o considerava estranho, e por mais que sua alma fosse bela, não me atraía.
    
Consigo me lembrar perfeitamente do dia em que o conheci. Mercúrio usava um topete que ficava parcialmente coberto por sua touca e uma que tinha duas abas escapava, em função de cobrir suas orelhas.

A professora o indicou um lugar para que ele se sentasse, e por coincidência, era o aluno novo e o único lugar vazio era ao meu lado. E por algum motivo, toda a turma riu de Mercúrio quando este sentou-se.

No almoço sentei-me na minha mesa como sempre, e brincava com meu canivete junto de minha expressão impassível cotidiana, como se eu levantasse uma placa que dizia "afaste-se" e funcionava com todos, mas Mercúrio parecia não observar da mesma forma.

- Posso me sentar? - Ousou solicitar.

Meu primeiro impulso foi negar, só que olhando em seus olhos pude perceber que ele estava sobrando no mundo como eu. Sabíamos como era caminhar na multidão e sentir-nos confortáveis na solidão. Éramos estranhos e nossa estranheza se completava ao ponto de cogitar que Mercúrio poderia ser meu cais, já que estava cansado de velejar.
    
Apesar de toda essa conexão em nosso primeiro encontro, não posso com definir com exatidão o que me fez ficar apaixonado por ele. Pensando bem, como não se apaixonar por aqueles olhos verdes tão claros como diamantes? Ou seriam esmeraldas? E, não me julgue, mesmo sendo daltônico podia sentir a ternura que eles transmitiam. Era o bastante para eu me sentir a pessoa mais sortuda do mundo.

Mas falando sério, Papai Noel. Sempre fui classificado como uma causa perdida, cometi pequenos furtos e confesso cheguei até a assaltar; e tudo bem, admito que o fato de ter quebrado o nariz do Dylan na escola hoje é mais um ponto negativo em meu currículo, porém, o motivo pelo qual peço que me atenda é que talvez o amor de Mercúrio seja a única salvação de pessoa condenada como eu; a única forma de fazer um coração descrente sonhar. Me atrevo a dizer que com ele eu poderia me tornar um daqueles milagres ambulantes.

Ele me vê, querido Papai Noel, quando a maioria das pessoas acham que me enxergam, sabe do meu amor por flores e foi o único que teve conhecimento de minha fórmula secreta de misturar nescau e café para ficar acordado para olhar as estrelas, por exemplo, e o melhor foi que não me julgou por isso.

De todos as pessoas que passaram por minha vida, ele foi o único que conseguiu entrar e se atreveu a me conhecer como sou. E se para o senhor é importante salvar uma vida, eu lhe peço que me conceda o presente de ouvir um "sim" da boca dele quando for me declarar.

Atenciosamente e forçadamente, Toni, uma causa perdida.

#Se o céu me ouvisse, de Hugotg89

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