M-48 Contos

Bem vinda Marie

2 MESES ANTES, 
31 DE AGOSTO. 

Talvez eu simplesmente deva ficar aqui, talvez não. Algo havia me puxado para cá, algo maior do que eu mesma consiga entender, algo além do que os olhos humanos possam ver.  
Ainda lembrava das palavras de minha mãe: 
'' -Sua roda da vida girou – Ela encarou-me pela primeira vez desde que começou a mexer nas ervas em cima da mesa- Tem algo que queira me contar Marie?  
Suspirei e cortei algumas flores amarelas do Verbascum thapsus e o coloquei em uma bacia para serem usadas mais tarde.  
-Eu decidi estudar na cidade mamãe.  
Senti seus olhos fuzilando-me, mas não tive coragem de encara-la de volta.  
-Por que Marie?  
-Sinto que devo ir. 
-Filha? 

Ergui meu rosto e a olhei. 
-Prometa-me algo. 
-O que quiser mamãe.  
-Honre seu sangue.  
Fiquei confusa por um momento. 
-Por quê? 
-Algo vai acontecer e colocar sua fé em prova.  
Fiquei ainda mais confusa mas eu conhecia minha mãe, ela não me falaria tudo isso atoa. 
-Eu prometo.  
-Ligue seu sangue a essa promessa minha filha. 
Ela me passou a bacia com as ervas e flores da floresta e eu apanhei a faca pontiaguda que estava sobre a mesa, a pressionando contra meu indicador logo em seguida. Senti uma leve picada e uma gota do meu sangue caiu direto nas ervas e delas foram formadas meu nome: Marie. 
-Está feito ''.  

-Marie?  
Sacudi a cabeça me livrando das lembranças em minha mente e voltando a realidade. 
-Algum problema querida? - Perguntou minha professora de biologia. 
-Não. Desculpe. 
-Eu estava falando sobre as duplas, a senhorita fará dupla com o James, tudo bem? 
-Claro – Falei casualmente.  
-Ótimo. James, pode sentar-se ao lado de Marie? 
-Sim. - Respondeu vindo em minha direção e sentando-se ao meu lado. 
-Oi Marie. 
-Oi James.  
Ele sorriu e apontou para a lousa.  
-Animada? 
-Nem um pouco, estudar pedras e calcário não é nada animador. 
Meu comentário o fez rir. 
-Gostei da sua sinceridade.  
Sorri e abri meu caderno começando a anotar alguns sites para pesquisa que estavam na lousa.  

-Detesto ter que procurar isso em sites... - Sussurrei baixinho, era mais um comentário retorico feito somente para eu mesma, mas acho que ele pensou que eu estava puxando assunto.  
-E por quê?  
Ergui o rosto e o observei pelo canto do olho. 
-Simples: Isso está na natureza, é só levantar e ir procurar. Não tem segredos.  
-Tudo bem – Sorriu e eu o vi riscando os sites que havia anotado no caderno – Vamos fazer do seu jeito, gostei.  
*** 

Depois do último horário de aula, nós decidimos ir até uma reserva ambiental perto da escola para procurámos o que foi pedido na aula de biologia. 
-Você é nova na cidade né?  
Apanhei mais algumas pedras e coloquei em sua mochila. 
-Sim, sou.  
-Poxa, legal.  
-Acho que é...  
Estranho, eu queria que ele puxasse mais assunto comigo, mas eu não sabia como responder suas perguntas sem ser chata ou monótona demais.  
-Você mora aqui muito tempo?  - Perguntei. 
-Sim, desde que nasci.  
-Conhece tudo por aqui então. 
-Ah, nem tanto. Esse parque por exemplo, até então não tinha pisado aqui. 
-Por quê? Aqui é tão lindo. 
-Sei lá, nunca quis vim sozinho... 
Ergui uma sobrancelha e decidi ousar um pouco mais, sei que estou sendo bem precipitada, mas sei lá, me deu vontade.  
-Gostou de ter vindo comigo? 
James ficou sem graça mas sorriu. 
-Gostei, você é uma ótima companhia, mesmo sendo bem misteriosa.  
-Misteriosa? 
-Sim, você esconde algo – Olhei em seus olhos verdes, devo admitir, ele é bastante atraente – Algo que te assombra. 
Legal, está tão na cara assim? 

Abaixei e apanhei uma pedra colorida na tonalidade roxa sobre o chão, erguendo-me logo em seguida. 
-Essa é peça rara, demos sorte. - Falei como se seu comentário fosse apenas fruto da minha imaginação.  
-É bonita – Sussurrou chateado por eu ter o ignorado. 
-Sabe – O encarei com um sorriso travesso nos lábios - Dizem que os mistérios nos atiçam a conhecer o desconhecido e desvendar aquilo que se esconde através dele.  
-Isso é um convite? - Perguntou sorrindo. 
-Entenda como quiser – O instiguei ainda mais. 
-Gostei de você.  
-Seremos bons amigos então.  
-Não tenha dúvidas.  
Acho que estou indo bem para uma semana na cidade. Quando eu ia perguntar algo para ele, seu celular tocou. 
-Droga – Sussurrou olhando para a tela do mesmo. 
-Algum problema? 
-Mais ou menos, me dê só um minutinho – E atendeu a ligação se afastando um pouco de onde estávamos.  
Observei sua expressão apreensiva. 
-Eu sei que combinamos de almoçar juntos mas eu acabei esquecendo, estava ocupado com o trabalho de biologia. 
Ele almoçou comigo e realmente ficamos ocupados com o trabalho de biologia.  
-Eu sei – Suspirou e olhou em minha direção sussurrando baixinho um pedido de desculpas – Eu sei, devia ter avisado mas juro que não tive intenção de sacanear você. Tudo bem. Eu estou no parque com uma colega de turma, eu sei mas... - Fechou os olhos e suspirou mais uma vez – Tudo bem, te vejo em 10 minutos. - Então desligou e voltou para o meu lado.  
-Problemas com a namorada? - Perguntei tentando parecer despreocupada.  
-Não exatamente uma namorada... 
-Não? 
-Não. 
Percebi o quanto ele ficou sem graça com minha pergunta. 
-Desculpe ter feito essas perguntas, isso não é mesmo da minha conta.  
-Você não falou nada demais, é só que... 
O olhei completamente confusa. 

-Só que...?  
-Era meu namorado. 
Tudo bem, por essa eu não esperava. Bom Marie, deixe as chances caírem de uma vez, você não tem o que ele gosta.  
-Ah... - Foi tudo que consegui falar, não que isso me cause repulsa, claro que não, mas lá no fundo eu tinha esperanças de que ele só estivesse brincando comigo. 
-Não... - Passou a mão nos cabelos e me encarou furioso - Você também! 
Fiquei confusa. 
-Eu o que?  
-Vai me julgar? Falar como posso fazer isso? Namorar outra cara! 
-Espera aí, em momento algum insinuei isso! Não coloque palavras em minha boca! E não se faça de coitadinho!  
-Então por que reagiu assim? 
-Eu... - Bufei irritada comigo mesma – Pensei que talvez... - Revirei os olhos e ajeitei minha mochila em meu ombro – Esquece. Vamos terminar esse trabalho amanhã.  
Comecei a andar o deixando para atrás, sem ter direito a qualquer resposta. 

#A Bruxa de Sangue, de vicalberic