Cidade da Meia Noite (Inédito )

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— Olhe bem para o céu... Das estrelas mais brilhantes estão os desejos mais encantadores. 

Caterina sorriu, exibindo a falta de um dente de leite. Ela ergueu as mãos para o céu quase unindo seu dedo indicador com seu polegar, fechando um dos olhos. 

-Assim eu consigo pegar uma só para mim.

Luna sorriu e imitou a irmã. 

-Eu peguei uma também. 

-Essas estrelas maiores só podem ter desejos bons? 

-Sim Cate, somente desejos bons. 

-Essa que peguei... Eu posso usar o desejo para eu também? 

-Hum... Talvez, mas acho que deve esperar sua estrela cair do céu para ter seu próprio desejo, essa estrela já é de outra pessoa. 

-Ah... - Ela abaixou o braço e fez um bico triste com os lábios. 

-Sabe o motivo de estarmos aqui tão tarde da noite? 

-Não sei... Por que estamos aqui a essa hora Lua? 

-Vem cá - Luna a puxou pelo braço levemente guiando seu corpo para a grama verde do quintal de sua casa – Tem que deitar aqui, fechar o olhos e erguer os dois braços para o céu. 

Caterina obedeceu a irmã, sentou-se sobre a grama e jogou seu tronco levemente para atrás, fechou os olhos assim que sentiu o roçar macio da mesma. 

-E agora Lua? 

-Espere só mais um pouco e já saberá. 

Luna ergueu a cabeça e sorriu ao ser contemplada com a visão que vinha do céu. 

-Cate, erga os braços. 

Assim Caterina o fez. 

-Agora abra os olhos. 

Quando a menina abriu os olhos quase não conseguia acreditar no que estava vendo. 

-Estrelas Cadentes Lua! - Disse maravilhada tentando pegá-las com a mão - Tem estrelas caindo direto do céu! 

-É uma chuva de meteoros Cate, agora sim você pode escolher uma só para você.

Luna sentou-se ao seu lado sobre a grama e encarava o brilho de felicidade nos olhos de sua irmã. 

-Eu posso mesmo escolher o que eu quero?

-Claro que pode, escolha sua estrela, feche os olhos e faça seu pedido. 

Caterina levantou o seu tronco e ficou sentada, olhou para o céu novamente e tentou escolher entre tantas estrelas a mais brilhosa, depois de analisar as que eram possíveis de acompanhar, escolheu uma das mais lindas que vinha em um ritmo diferente das demais, um pouco mais lenta, era simplesmente perfeita. Fechou os olhos e passou a mão pelo úmido da grama até encontrar a mão de sua irmã. 

-Desejo que jamais eu me perca da minha imã Lua... Que sempre possamos ser assim, Cate e Lua.  

Os olhos de Luna encheram-se de água salgada e um sorriso iluminado surgiu em seus lábios. 

-Eu a amo muito – Envolveu seus braços envolta da irmã - Muito mesmo Cate. 

-Eu também a amo Lua – Sussurrou retribuindo seu abraço. 

*** 

Lúcia observava a cena das meninas através da janela de vibro em lágrimas. Permitiu que sua filha mais velha Luna levasse a mais nova Caterina para ver a chuva de meteoros apenas por querer vê-las assim, felizes e mais unidas do que qualquer coisa. Mesmo com os últimos acontecimentos e tento que esconde-las no meio da mata, permitiu que elas pudessem contemplar esse momento só delas.  

Vê algo lindo e incrível assim tiravam seus pensamentos do caos pela cidade por conta da guerra para tominarem as chamadas: Crianças especiais. E por mais que doa lembrar, sabia que suas filhas faziam parte da minoria contra o sistema.  

A guerra havia se iniciado quando vazou a informação da dominação da galáxia P-90, com isso o próximo alvo seria a Terra. Depois de décadas escondendo as crianças especiais, descobriram que as mesmas poderiam ser usadas como arma, por serem altamente resistentes.  Mensagens foram enviadas a Terra e escondidas para evitar o que está exatamente acontecendo por todos os lugares: Caos. Guerras, guerras e mais guerras pelo simples fato de quem irá domina o exercito dos especiais... Por quê querem tanto isso? Simples, se salvarem. 

Lúcia foi uma criança especial, sabia que tipo de tortura e teste suas filhas seriam submetidas. Há 30 anos atrás ela forjou a própria morte, quando tinha apenas 10 anos de idade. A princípio nenhum delesacreditaram em sua morte, mas ela sabia que com o tempo daria certo. Ela lembrara de uma vez que um dos meninos especiais havia tropeçado e caído no cortador de carne do açougue aonde acontecia um dos treinamentos, o garoto cortou a perna. Ninguém se moveu, Lúcia tentou ajudar, mas foi barrada. Ela ainda lembrava-se das palavras do governador: 

''-Ninguém toque nele, veremos se é capaz de regenerar seus membros, se não for... O corte inteiro, com menos uma perna não nos servirá mais, mas servirá para mostrar para todos que mesmo tento essas habilidades extras podem morrer como qualquer um. Além das coleiras, lembraram-se disso também!'' 

Foi agoniante a espera, não podiam se quer desviar o olhar da ferida exposta do rapaz. Ele tentava ser forte, mas era em vão, os gritos de dor vieram trazendo consigo socos e pontapés. Passou-se um dia inteiro e não houve regeneração de seu membro, então eles o levaram para a bancada de cortes e o cortaram, membro por membro e a  vontade de Lúcia era de chorar, espernear e ser capaz de esquecer cada segundo dentro daquele lugar.  

Depois de dois meses treinando conseguiu em fim retirar a coleira de seu pescoço, testou tantos códigos que quase enlouqueceu. Sabia que teria pouco tempo... Lúcia apoiou seu braço sobre a bancada de cortes e o cortou de uma vez só. Com o pano sobre a boca ela tentou não gritar mais que o necessário. Correu para a máquina de corte e a ligou, jogou seu braço cortado dentro e pegou um pedaço generoso de carne sangrenta no freezer , espalhou pelas paredes e o colocou de volta em seu lugar, amarrou opano no cotoco que sobrou de seu braço e saiu correndo pelo túnel de lixo subterrâneo. Sabia que eles localizariam sua coleira na máquina de cortes e se importasse para eles fariam um exame com o suco do braço dela. Tudo virou líquido, pois ela usou a máquina para animais de grande porte. Apenas com issolibertou-se daquele lugar e com o tempo e pela falta de prática foi perdendo toda e qualquer habilidade especial que um dia chegou a ter. Sabia que jamais deixaria algo semelhante acontecer com suas filhas. 

De vicalberic

M-48 ContosOnde histórias criam vida. Descubra agora