Capítulo 6

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—Skyler, pode vir me ajudar? —mamãe chama.

Coloco meu livro sobre a mesinha de centro e levanto-me do sofá. Elly acompanha meus movimentos com olhos curiosos, mas logo volta a se concentrar no seu filme.

—Me ajude a picar estes tomates, por favor —pede, apontando com o queixo para os vegetais sobre a nossa velha tábua de madeira.

Faço um breve sinal afirmativo com a cabeça, então pego uma faca e começo a cortar.

—Como foi na escola hoje? —indaga.

—Bem —minto. Não quero dar a ela mais motivos para se preocupar.

—Fez alguma nova amiga? —insiste.

Umedeço os lábios e prendo a respiração por alguns instantes.

—Hum... Fiz —outra mentira.

Ela para de fatiar o linguado e me encara com um olhar carregado de surpresa. Sinto-me mal por não estar falando a verdade, mas acho que é melhor assim.

—Sério? —sorri. —Qual é o nome dela?

—É... —mordo o lábio inferior enquanto tento pensar em alguém. —É Mandy.

—Onde se conheceram? É simpática? Vai bem na escola?

Simpática?

—Mãe, calma —corto, desesperada para encerrar este assunto. —Foi na aula de História. E ela é muito amigável.

—Que bom, Skyler! Quer convidá-la para vir aqui em casa? Eu podia ir com vocês alugar um filme, talvez comprar alguns doces...

—Mãe! —paro de picar os tomates. —Eu não conheço ela direito. É melhor esperar um pouco...

Mamãe sempre acha que um par de dias é suficiente para se tornar tão íntimo de alguém ao ponto de convidar a pessoa para ir em casa. Ela entrou na escola junto a três amigas que conhecia desde que todas usavam fraldas, então nunca teve que almoçar sozinha ou ficar sem dupla na sala de aula. Acho que é por isso que ela não entende que não é tão fácil ficar amigo de um desconhecido.

—Certo... Que tal um cinema? —sugere. Apenas respiro fundo e deixo minha expressão facial falar por mim. —Está bem, Skyler, vá no seu ritmo...

—Obrigada —ironizo enquanto coloco os tomates em cubinhos no prato de salada.

—Já pode voltar para o sofá. Eu chamo você e sua irmã quando o jantar estiver pronto.

Depois de dar um breve aceno com a cabeça, volto a me acomodar ao lado de Elly. Ela está quase dormindo, mas luta para manter os olhos abertos enquanto o filme da Branca de Neve não termina. Está na cena em que os anões, devastados, colocam-na no caixão de cristal. Eu achava essa cena particularmente triste, mas nunca cheguei a chorar enquanto assistia. Acho que o único filme infantil que me fez derrubar uma lágrima foi o do Rei Leão, animação que, por sinal, não vejo há muito tempo. Minha irmã prefere as princesas, e como ela é praticamente a dona da televisão, os outros desenhos acabam sendo deixados de lado...

***

Esquerda? Não. Direita? Não. Barriga para cima? Não. Barriga para baixo? Não! Cada posição parece mais desconfortável que a outra. Enfio minha cara no travesseiro e solto um grunhido de frustração. Maldita insônia... Pegar no sono ficou muito mais difícil depois da mudança.

Encaro o teto. Se o Papai Noel existisse, eu pediria para ele um botão de "desligar". Dessa forma, toda vez que eu não conseguisse dormir, apenas pressionaria o botão e cairia em um sono profundo. Ele poderia ficar na minha nuca, escondido sob o meu cabelo para que ninguém conseguisse vê-lo. Mas Papai Noel não existe...

Encaro meus livros do outro lado do quarto. Talvez ler ajude. Levanto-me com certa preguiça e vou até meu querido exemplar de A Odisseia. Enquanto volto para a cama, tento encontrar o clips que usei como marcador da última vez. É então que eu me detenho. Com o canto do olho, percebo um movimento do lado de fora da janela. Será que...

Sim, é ele. Como de costume, caminha solitário pela calçada. Cogito ir até lá e fazer todas as perguntas que sempre quero fazer quando penso nele, mas o bom senso me impede. Permaneço parada por alguns segundos, apenas observando-o caminhar. A luz da Lua alonga a sombra de sua silhueta pelo concreto enquanto se afasta, deixando tudo com um aspecto mais misterioso. Céus, por que ele não vai para casa? Está tão frio que, mesmo com meu pijama mais quente e a janela fechada, minha pele está toda arrepiada. Só um louco ficaria andando na rua a esta hora da noite e com uma temperatura tão baixa...

Balanço a cabeça e volto para minhas cobertas. Seja lá o que o motiva a se comportar dessa forma, não é assunto meu. Abro meu livro, acendo o abajur no meu criado-mudo e tento deixar todo esse assunto de lado...

Quando o Sol se PõeOnde histórias criam vida. Descubra agora