Capítulo 14

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Brinco com o sachê de chá de hortelã imerso na água quente, observando o movimento agitado do líquido dentro da caneca cor de rosa. Elly desenha ao meu lado em completo silêncio.

—O que está desenhando? —indago. Está claro que trata-se de uma fada, mas sei que minha irmã gosta de explicar.

—É uma fada que vive nas montanhas —diz, apontando para alguns morros verdes no canto esquerdo da folha sulfite. —A casa dela é uma tulipa, mas não dá para ver porque está lá no fundo...

—Qual é o nome dela?

—Não sei —admite, desviando os olhos do papel. —Acho que ela não tem um...

—Todos tem um nome.

—Certo... —comprime os lábios enquanto pensa. —O nome dela é Fada.

Deixo escapar uma breve risada.

—As outras fadas não vão ficar confusas? —arqueio uma sobrancelha.

Elly dá de ombros e volta a desenhar.

—Por que você não desenha? —indaga depois de rabiscar algumas nuvens rosadas.

—Prefiro fazer outras coisas...

—Tipo?

—Ler —dou de ombros.

—Você só faz isso —revira os olhos. —Deveria tentar desenhar. É divertido.

Ela separa uma folha de papel sulfite da sua pilha e a coloca na minha frente.

—Pode usar meus lápis de cor —sorri.

Respiro fundo e olho para a folha em branco. Bem... Por que não? Pego dois tons de roxo, três de azul, um lápis cor de rosa e outro verde escuro. Resolvo desenhar uma rosa em um vaso. Começo pelo próprio recipiente, então vem o caule, os espinhos e, finalmente, as pétalas. Nelas, resolvo misturar quase todos os tons, dando-lhes certa profundidade.

—Você desenha bem —Elly suspira com uma pontinha de ciúmes. Sorrio e faço cócegas nela.

***

Observo a rua através da janela, parando de dois em dois minutos para ver o horário no meu celular. Nove e cinquenta e dois da noite. Será que Luke já está realizando sua caminhada? Será que ele vai realizar a caminhada? Droga, a cada minuto que passa, percebo o quanto eu não o conheço.

Deixo um bocejo escapar e cerro um pouco os olhos. Acho que eu teria acabado dormindo se não fosse pelo pequeno movimento que consegui captar do lado de fora da casa. Já mais desperta, levanto-me da cadeira e abro o vidro.

É ele.

Começo a acenar desesperadamente, rezando para que Luke me veja. Quando ele finalmente para e olha para mim, saio rapidamente do quarto e, tentando ser o mais silenciosa possível, abro a porta de entrada e vou para a calçada.

—Por onde você andou? —indago ao me aproximar dele. —Eu procurei por você ontem e não te encontrei em lugar algum!

—Eu estava por aí... —enfia as mãos pálidas nos bolsos surrados.

Eu o encaro em absoluto silêncio por alguns segundos. Eu não tinha percebido o quão branca sua pele era.

—Bem, eu... —coço a nuca. —Eu percebi que você não gostou da ideia de eu contar a Elly sobre a floresta...

Luke permanece em silêncio, fitando-me com os olhos frios e inexpressivos. Respiro fundo e tento juntar coragem suficiente para continuar falando.

—Se você não quiser que eu conte para outras pessoas, eu não vou.

Ele comprime os lábios e acena com a cabeça. O vento forte joga meus cabelos contra meu rosto, mas permaneço imóvel.

—Nós... —afasto as mechas negras dos meus olhos. —Nós podemos voltar até aquele lugar?

Ele fica quieto por alguns segundos, fitando o chão como se o mesmo pudesse revelar algo importante.

—Podemos —diz sem olhar para mim.

***

—A floresta me parece familiar—comento enquanto caminhamos. —Não sei bem como explicar...

—Todas as florestas são parecidas —ele responde. Continuamos andando em silêncio.

De repente, as pequenas asas luminosas começam a aparecer por trás das árvores. Azuis, brancas... As borboletas voam ao meu redor, pousam no meu ombro e sob minha cabeça. Com os olhos arregalados e um sorriso verdadeiro no rosto, olho em volta. Pétalas se abrem, revelando interiores brilhantes. Parece ter tinta fluorescente passando pelo interior dos caules e atravessando as trepadeiras que enroscam-se nos troncos.

Uma pequena lágrima ameaça escapar de meus olhos. Tudo isso é... maravilhoso. É como se fosse de outro mundo. Eu pensei que morreria sem ver algo tão lindo, tão... mágico.

Ando de costas, sem me preocupar muito com a possibilidade de esbarrar em uma raíz. Inevitavelmente acabo tropeçando em algo. Consigo me manter de pé, mas então levo um susto ao encostar as pontas de meus dedos em algo gelado. Viro-me e percebo que a coisa fria era, na verdade, a mão de Luke.

—Desculpe —digo, envergonhada. Ele dá de ombros e volta a colocá-la dentro do bolso.

Céus, como a mão dele pode ser tão gelada? Não é fria como a de minha mãe, é como a de alguém doente, uma pessoa prestes a morrer.

—Você está bem? —indago.

—Como assim? —franze um pouco o cenho.

—Sua mão é muito fria —explico. —Fria demais.

Ele olha para os próprios dedos com indiferença e respira fundo.

—Está ficando tarde —diz, olhando para mim. —É melhor voltarmos.

Quando o Sol se PõeOnde histórias criam vida. Descubra agora