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Pouco mais de uma hora depois a mulher acordou. Não havia espelho, mas ela sabia que estava acabada. Desmaiara de tanta dor. Olhara para a perna cuja pele agora estava deformada e pensara que se sobrevivesse aquilo precisaria de uma plástica que lhe custaria todas suas economias.

O amigo lhe deu a camisa para que ela limpasse o rosto, lamentou que só tivessem aquilo, mas explicou que ao contrário do que esperava, a cabana estava abandonada. Ao que parecia ninguém ia até ali há anos, tudo estava deixado para apodrecer havia muito tempo.

Samantha ficou observando o rapaz, fazia anos que não se viam e ele, assim como ela, crescera bastante. O mesmo estava apenas com o colete de caçador que usava sobre a camisa quando se encontraram, era uma peça aberta na frente e com vários bolsos onde guardavam munições e iscas.

Pela abertura ela via o peito e abdômen definidos do jovem, nunca imaginara que seu amigo fosse malhar um dia, tudo que se lembrava dele era das brincadeiras e discussões tempos atrás quando ainda faziam o ginásio juntos na escola. Uma parte da camisa havia sido cortada com a faca de caça e enrolada na perna da jovem, onde o corte havia sido cauterizado.

Samantha levantou-se e apanhou a Beretta sobre a mesa. Checou a munição e olhou na direção da porta. Antes que dissesse algo, Jones interveio.

—Não está pensando no que estou pensando que está pensando, não é?

—Não podemos ficar aqui – respondeu a mulher – Essas criaturas podem ter chegado até a cidade, meu pai e meu irmão estão lá. Além disso, precisamos pegar as armas de volta, não temos nenhuma chance ficando encurralados aqui que nem ratos em um buraco na parede.

—Mas sua perna ainda não se recuperou e nem sabemos quantas dessas criaturas ainda podem estar por aí, o que podemos fazer contra eles? Você viu o quanto são resistentes...

—Eu posso aguentar a dor e assim que pegarmos a sacola com as armas corremos para sua caminhonete. Se dermos sorte chegamos até ela e fugimos antes que nos alcancem. Se o homem que me ligou tiver dito a verdade essas criaturas podem alcançar um veículo a mais de 80km/h, mas não podemos simplesmente ficar aqui parados, precisamos arriscar.

—Isso é loucura, você sabe, não é? O mais provável é que morramos tentando.

—Então irei morrer tentando salvar as pessoas que jurei proteger, principalmente minha família – respondeu a jovem com os olhos castanhos carregados de fúria.

Jones respondeu com um aceno de cabeça, mas com os olhos mirando o chão. Sabia que não iria adiantar argumentar com a amiga, ou melhor, com a policial. Se recusasse a acompanhá-la, a mesma provavelmente iria sozinha. As chances de ela morrer sozinha eram maiores, assim como as suas proprias. Pelo que conhecia daqueles monstros, tinha quase certeza de que morreriam naquela fuga. Esperava estar errado, pelo menos dessa vez.

Samantha explicara em seguida que ao sul daquele pequeno chalé havia uma longa descida que levava em direção à estrada. Haviam também inúmeros eucaliptos nessa área e estavam plantados todos muito próximos, o que significava que se descessem correndo entre as árvores teriam uma chance. As criaturas eram grandes demais para passar por certos espaços e essa era a vantagem que tinham. O caçador pensou na ideia por um momento e chegou à conclusão de que a mulher tinha razão, havia uma pequena chance dependendo de quantos fossem os predadores que estivessem em seu encalço.

Então a jovem abriu uma minúscula fresta na porta e espiou para fora. Ficou ali dois minutos, não ouvira nada. Não havia nada do lado de fora senão a friagem cortante daquela noite, que ela sentira como uma facada ao ser atingida na perna exposta sem a calça e com a ferida ainda a pouco cauterizada.

Respirou fundo e prendeu o ar nos pulmões. Apanhou a escopeta que dera para o amigo antes e lhe deixara com o rifle que tinha. A Beretta havia sido colocada no coldre na perna da calça de novo. Por sorte o coldre ficava na perna que não havia sido atingida.

—Ouça bem – disse ela – Me lembro de onde a sacola caiu, está presa em alguns galhos. Irei correr até ela e removê-la e volto correndo na direção da estrada. Me dê cobertura e assim que ver que estou voltando assuma a frente e corra o máximo que puder – então lhe devolvera as chaves da caminhonete que ele havia lhe dado antes – Quando chegar lá dê a partida o mais rápido possível, vou saltar na traseira para impedir que qualquer daquelas coisas se pendure em nós enquanto partimos, está bem?

—Eu... – começou a dizer o rapaz quando a mulher saíra em disparada cabana afora.

Jones saiu em seguida. Ficou ao lado da cabana observando a mulher no escuro. Pouco se podia ver dela mesmo com poucos metros de distância entre eles, mas ainda assim o uniforme de polícia azul era destacável na escuridão da noite. Samantha chegara até a sacola caída no chão e fora imediatamente alcançar a fivela da alça da mesma.

Seus piores pesadelos tornaram-se reais naquele exato instante. Uma garra enorme, com unhas negras afiadas e longas foram mais rápidas. Desviando o olhar da pata que tocara a sacola primeiro que ela mesma a mulher vira o monstro. Dessa vez o animal fora visto de perto, o que acontecera em menos de dois segundos ficara congelado na mente da mulher.

Seu olhar havia subido desde a garra pelo braço para a cabeça do ser que a observava a poucos centímetros de distância. Então a criatura emitiu um som que se parecia com o coaxar dos sapos. Assim como os sapos seu peito inflou-se e depois contraiu-se nesse momento.

Samantha não tinha tempo para ponderar hipóteses, atirou imediatamente a queima-roupa com a escopeta que tinha em mãos. O animal cambaleou para trás, mas não caiu. A jovem atirou novamente e o bicho ajoelhou-se, um terceiro tiro na cabeça o fez deitar-se, mas suas garras prendiam agora a sacola de armas. A policial se via assustada demais para tentar remover as armas do monstro, por toda parte só havia a mais profunda escuridão e ela temia que outros monstros como aquele pudessem estar se aproximando.

Virando-se a mulher voltou correndo para junto do amigo que a esperava.

—Perdemos as armas! – disse ela, ofegante – Havia um... monstro, eu atirei nele e aquela merda caiu em cima da sacola, é impossível tirar de lá agora, não podemos perder tempo aqui...

—Sammy, cuidado! – gritou o amigo apontando na direção da mesma com o rifle. Ela sabia o que aquilo significava, mas precisava ver e saber se podia fazer algo. Virara-se para trás e o mesmo monstro qual atirara três vezes estava novamente de pé, felizmente não tão próximo. O mesmo estava sobre as armas, aparentemente se recuperando. Naquele momento, Samantha chegara à conclusão de que não tinham chances, aquela era a hora de fugir.

RESIDENT EVIL - Terror em Little RiverOnde histórias criam vida. Descubra agora