Capítulo Doze

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Domingo amanheceu nublado e frio, um clima perfeito para dormir até tarde, essa era a vontade de Samuel, mas o sono desapareceu assim que os primeiros raios de sol surgiram, clareando o céu aos poucos e jogando uma luz fraca pelas frestas da janela. Então levantou logo, prendeu seu cabelo num coque frouxo e foi escovar os dentes. Tudo fazia parte do seu ritual matinal, muito comum e repetitivo, feito no modo automático, mas assim que se olhou no espelho parou tudo que estava fazendo, sua mente despertou com um click no instante que viu suas olheiras e a expressão cansada que possuía.

Fazia quase três dias que havia chegado ao seu destino e tudo que conseguiu foi trocar algumas palavras com Toni e ganhar duas ameaças diretas. Tinha que fazer alguma coisa além de tremer de medo e falar besteiras.

— Coragem — recomendou para o próprio reflexo antes de se enfiar embaixo do chuveiro.

Samuel desceu para cozinha, precisava muito se ocupar e se dedicou a ajudar Magnólia a preparar a mesa do café da manhã enquanto conversavam bobagens. Passava um pouco das sete quando finalmente parou para comer.

— Que foi meu filho? Tá com a cabeça avoada hoje, um olharzinho triste — perguntou a dona da pensão, meio de supetão enquanto bebia seu café.

Apenas sorriu educadamente.

— Eu posso fazer uma pergunta pessoal? — pediu um pouco desconfortável já que não sabia como ela ia reagir.

Magnólia ergueu as sobrancelhas, entortou a boca com estranheza ao pedido.

— Claro amor. O que quiser! Diga que se eu puder eu respondo.

Se remexeu na cadeira, escolhendo as palavras com cuidado.

— Como era o pai do Toni? — Magnólia ergueu as sobrancelhas sem esconder a surpresa pela pergunta repentina — Eu não quero ser invasivo, nem nada, mas percebi que conheço o Toni há quase dez anos e não sei quase nada sobre o pai dele. Ontem estávamos conversando sobre o Seu Otoniel e ele acabou ficando meio zangado comigo — justificou sua curiosidade o melhor que pode.

Magnólia sorriu consternada, como se tivesse entendido tudo e algo mais, mas se manteve calma como sempre.

— Então foi por isso que ele saiu daqui com aquela cara amarrada — comentou sem dar muita importância ao fato.

Aquilo o acertou em cheio, parecia que estava sempre causando problemas.

— Desculpa tia.

Magnólia voltou dos seus pensamentos um pouco espantada, foi abanando a mão com desdém. 

— Não foi culpa sua, querido. Não liga para isso não. O meu filho consegue ser muito melodramático as vezes. Acho que tá sendo influenciado por todas aquelas novelas idiotas que o César assisti.

— O que o seu Otoniel fazia? — perguntou por pura curiosidade.

— Ele era Pediatra do hospital infantil municipal, mas isso faz mais de vinte anos. O Toni herdou todos os livros de medicina do pai, lia tudo compulsivamente. Fiquei muito preocupada no começo, mas era o jeito dele se sentir mais perto do Oto depois que ele morreu.

Pelo menos agora entendia porque o rapaz entendia tanto do corpo humano e sempre sabia como cuidar dos seus machucados.

— Na verdade ele só começou a ler aquilo tudo por sua causa — anunciou-se Vivi, já indo direto na garrafa de café e sentando para comer.

— Bom dia filha, chegou cedo.

— Eu achei que a senhora ia precisar de ajuda já que o seu filho querido deve tá se matando de foder até agora para passar a raiva de ontem — respondeu com sua língua afiada de sempre.

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