Capítulo Sessenta e Sete

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César ajeitou o esfigmomanômetro, colocando a braçadeira inflável um pouco mais para cima, posicionou o estetoscópio nos ouvidos, pressionou o disco metálico na pele pálida, estreitando os olhos, concentrando-se e começou a inflar a braçadeira. Toni acompanhava tudo sentado na beira da cama, sem ousar fazer um ruído que fosse, esperando, ansioso. Levou alguns instantes, César tirou o esfigmomanômetro do braço alheio, colocou o aparelho de lado, cuidadosamente levantou a camiseta cinza que Samuel usava, a roupa larga não mostrou resistência, mostrando a pele estupidamente clara da barriga. Enfiou a mão pelo pouco tecido que ainda cobria o tronco do músico e encostou novamente a ponta gelada e metálica do estetoscópio, dessa vez na altura do peito. Sempre muito concentrado. Por fim tirou o aparelho dos ouvidos.

— A pressão está normal, sem alteração. Os batimentos estão regulares, também sem alteração. Ele só está dormindo, cara. Não tem nada para fazer a não ser esperar.

Toni suspirou, ainda muito tenso e esfregou o rosto.

— Já faz mais de vinte e quatro horas – argumentou, insistindo na sua preocupação.

— Precisamente vinte e sete. Eu sei. Mas eu não posso fazer nada. Tem certeza que ele não tomou nenhum sedativo?

— Não, só o ansiolítico de sempre, só que tomou mais do que geralmente toma.

— Quanto? — questionou seriamente, mas sua pergunta causou espanto no mais novo.

— Três eu acho – rebateu, já estressado com a falta de reação do namorado.

— Então não deve ter muito problema, em termos gerais os ansiolíticos se tornam perigosos com dosagens vinte ou trinta vezes maior que o recomendado, tem aí uma tolerância enorme.

— Tá dizendo então que eu não tenho que me preocupar?

— Não é bem isso. Ele está dormindo a mais de um dia, claro que é preocupante, mas o tempo de fazer uma lavagem estomacal já passou, o medicamento já foi absorvido e está sendo metabolizado. Com uma dose pequena assim, não acho que precise levar ele para o hospital, a pressão não caiu, o ritmo cardíaco está bom também. Assim que o efeito passar ele deve acordar sozinho, talvez se sinta fraco, está sem comer esse tempo todo. Só fica de olho nele.

Toni suspirou outra vez, olhou para o namorado adormecido e passou as mãos no cabelo, muito frustrado.

— Nunca achei que ansiolítico dava um puta sono desses!

— Tecnicamente eles não são sedativos, o intuito não é esse, mas eles causam sim sonolência, depende do paciente. Ele tem problemas para dormir não é, isso pode estar potencializando o efeito, quer dizer, o corpo relaxou, a mente também, o cara apagou.

— Eu entendi. Só não consigo ver ele desse jeito – falou mais para si mesmo.

— Pois é cara, eu tenho que voltar agora, meu horário de almoço acabou faz meia hora.

Se cumprimentaram encostando os punhos fechados.

— Valeu aí brother.

— Qualquer coisa diferente me dá um toque – prontificou-se, dando dois tapinhas amigáveis nas costas do mais novo e por fim saiu.

Toni ficou um tempo de cabeça baixa, apenas lutando contra aquele aperto no seu peito.

Era quase quatro da tarde quando Samuel se moveu na cama, virando de lado, chamando a atenção do moreno, que desejou com todas as suas forças que o namorado acordasse logo. Mas já estava imensamente aliviado por ele se mover, era primeira vez em horas.

Deitou ao lado do mais velho, olhando-o de perto.

Foi desesperador quando acordou de manhã e viu que Samuel não despertava, por mais que o chamasse, apenas resmungava alguma coisa, mas permanecia inerte. Nem conseguiu ir trabalhar.

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