LEMBRANDO - ALGO MUDOU

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"Corra", foi o que escutei em minha cabeça. Continuava fazendo o que haviam me mandado fazer: correr. Mesmo quando meus pulmões reclamavam por ar, mesmo quando minhas pernas não pareciam mais aguentar, eu corri. "Sua vida depende disso!". Mais um alerta, ela estava se aproximando. Eu tinha que me afastar o máximo possível. Um tronco de árvore abaixo, pulei o mesmo como fui ensinada, caindo agachada sobre meus pés. "Continue!", ordenou "Você está indo bem!".

Eu continuei. Aquele trajeto parecia não ter fim. Minhas pernas reclamavam e meus pulmões pareciam querer saltar para fora. Em um descuido olhei para trás, foi um erro, mas precisava saber o quanto ela estava longe de mim. Eu havia sido ensinada que deveria sempre estar atenta, um movimento em falso e eu seria a próxima vítima. Mais rápida que qualquer coisa que já houvesse presenciado ela pulou em cima de mim. Um lobo tão branco quanto à neve daquele inverno que assolava nosso vilarejo.

Caí para trás no mesmo instante, suas patas dianteiras prendendo-me ao chão enquanto eu própria cobria meu rosto com o braço para não ter que escutar sua próxima bronca.

"Você foi estúpida garota", escutei enquanto seus caninos continuavam a mostra, deixando bem claro sua irá em relação ao que me foi ensinado. "Jamais! Jamais olhe para trás. Um movimento desses e você foi surpreendida.", disse enquanto ainda me prendia ao chão.

Tirei meu braço dos olhos e virei minha cabeça para o lado. Suas patas deixaram meu peito e pude escutar o vento rasgando. Era melhor forma de dizer que esse mesmo lobo transformava-se na mais bela mulher. Seus cabelos tão negros quanto à própria escuridão, seus olhos tão verdes e incomparáveis. Eu sentei-me sentindo um leve ardor em minha cabeça. A minha frente ela encontrava-se completamente nua, sua pele branca refletia a cor do inverno, um contraste perfeito revelado com seu cabelo longo. Ela puxou um roupão feito da ceda mais pura que se podia encontrar e o vestiu. Ao notar que a mesma virava-se para me encarar, eu virei meus olhos apreensivos. Esperava não ser pega enquanto admirava tamanha beleza.

- Vamos. – disse ela friamente – Levante-se.

Em silêncio me levantei, mas com a pancada na cabeça acabei caindo novamente ao chão. Tudo pareceu rodar, uma vertigem passou por mim e fraca deitei-me no chão, tentando recuperar as forças e o equilíbrio necessário.

Lorena apoiou-se sobre mim. Mechas de seu cabelo caiam ao redor de sua cabeça enquanto ela me avaliava atentamente. Aqueles olhos verdes pareciam preocupados, mas eu não poderia ter certeza, já que ela era sempre muito fria e evasiva comigo. Eu mesma nem sequer sabia o que sentia por ela. Não sabia ao certo se seria apenas admiração, ou algo em que eu estava com medo e ao mesmo tempo tentada a descobrir.

- Maria – chamou ela e era bem estranho, porque ela não me chamava pelo primeiro nome. Apenas Madalena, sempre era Madalena.

- Maria – chamou novamente. – O que houve?

- Sinto-me fraca e tonta. Até um pouco cansada. – respondi quase em um sussurro, mesmo falar me tomava às forças todas que restavam.

- Tenho quase certeza de que não se alimentou hoje pela manhã. – disse ela com uma pontada de frustração. – Consegue se levantar.

Olhei-a um pouco irada, mesmo sabendo que era apenas minha imaginação, porque eu mal conseguia mudar as minhas expressões faciais. Fiz que sim com a cabeça. Ela se afastou um pouco enquanto me ajudava a levantar. Seus braços apoiaram meu tronco para que eu pudesse sentar e com um pouco mais de força ela ajudou-me a ficar de pé, e no primeiro passo que dei senti a vista escurecer um pouco, e se não fosse Lorena eu teria caído de cara com aquele chão do bosque.

MADALENA (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora