Capitulo 1

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Era uma tarde de primavera quando André e eu subimos o Cristo. Poços de Caldas é uma cidade bonita de se ver nesses dias floridos, com suas praças e rosas por todos os lados, também é uma cidade famosa por suas águas sulfurosas desfrutadas pelo imperador Dom Pedro II. Nos anos 1940, no Palace Casino e no Palace Hotel desfilavam a nata da aristocracia brasileira, o presidente Getúlio Vargas tinha uma suíte especial no hotel, com a mesma decoração da que ele usava no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, então capital do país. Uma vez fomos fazer uma visita com o pessoal da escola, o hotel ainda preservava móveis e quartos com características da época. Os salões do Palace Casino tiveram seu grande momento de prosperidade e luxo quando por ele passaram visitantes ilustres como Carmen Miranda, Rui Barbosa, Olavo Bilac e até Santos Dumont, mas foi perdendo a sua glória depois que os jogos foram proibidos no Brasil. A cidade passou a ser então o recanto dos casais em lua de mel. O Palace Casino se tornou um salão de eventos, ainda é um lugar bonito de se visitar por causa da sua arquitetura. Atualmente Poços de Caldas é frequentada pela terceira idade que vem apreciar a calmaria, jogando comida aos pombos, bem, eles fazem mais que isso, mas achei a cena poética, aliás, falando em cena, algumas novelas foram gravadas por aqui, tenho até uma foto perto de um caminhão da Globo.

Essa linda cidade do sul de Minas foi palco de muitas histórias, inclusive a minha própria aqui presente. Desde criança me maravilhava com a ideia de estar morando em cima de uma caldeira vulcânica localizada a quase 1.300 m de altitude, eu procurei no Google a geografia da cidade, fiquei bem impressionada com o tamanho do vulcão, sempre tive medo de que um dia ele resolvesse entrar em atividade novamente, todos diziam que era impossível, mas nunca se sabe quando a natureza vai se irar e cuspir lavas por todos os lados. Exageros à parte, este era somente um aspecto atrativo para que turistas nos visitassem durante o ano.

Alguns personagens nos aterrorizava a infância, André e eu ficávamos apavorados quando fazíamos alguma coisa errada porque poderíamos parar sob custódia da Cida Casélli. Quando ela passava com seus lábios pintados de vermelho e seu cabelo repicado ao estilo dos anos 1980 dirigindo seu Uno vermelho nos encarando, parávamos de fazer qualquer brincadeira e colocávamos o ar mais santo na nossa fisionomia, não queríamos ser levados como menores infratores, afinal ela era membro do Comissionariado de Menores, seja lá o que isso significava, a verdade é que sempre nos ameaçavam quando pintávamos o sete, era meio que uma forma de fazer nos comportar, funcionava por alguns minutos até esquecermos e começarmos a fazer outra "arte". Tivemos muita sorte em não sermos pegos por ela.

André sempre foi como um irmão para mim, ele era filho da tia Beth, uma amiga de minha mãe dos tempos de técnica em enfermagem. Eu era um ano mais nova que ele, o suficiente para ele achar que tinha mais direitos que eu nas nossas brincadeiras de criança. Crescemos juntos, gostávamos de aventuras.

Apesar de estudarmos em escolas diferentes eu sempre ia para a casa dele nos fins de semana, pois minha mãe fazia trabalhos extras e não tinha com quem me deixar, então eu ficava lá comendo frango e macarronada, o prato típico de domingo que a sua vó nos preparava, depois do almoço a programação era bastante excitante, assistir ao Programa do Silvio Santos. André e eu não aguentávamos ficar parados nem por um segundo, logo nos embrenhávamos em alguma brincadeira na rua com as outras crianças. Eram momentos muito felizes de jogar queimada, pega-pega, etc., no fim da tarde eu nem queria ir embora, mas era obrigada a voltar para a realidade de uma casa vazia.

Nunca parava muito para pensar que não tinha a presença da minha mãe, eu entendia que ela precisava fazer isso, pois o senhor Roberto, meu pai, nunca mandava dinheiro, apesar de trabalhar nos Estados Unidos e do sonho americano de se ter uma vida melhor ele gastava quase tudo na Budweiser, o que lhe rendeu o apelido de Badu e mais tarde uma cirrose fatal. Eu o amava tanto, mas a distância prolongada foi fazendo dele uma lembrança e por vezes eu achava que ele era um sonho.

Ahava- O amor é possívelOnde histórias criam vida. Descubra agora