Capítulo 12

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De volta a Porto Alegre fui fazer um curso de clown (palhaços) quando recebi a triste notícia que meu pai havia morrido. Ele ainda estava morando em Serrania com meu avô, era a cidade natal dele, nós mal nos falávamos, mas saber de uma coisa assim sem poder fazer nada. O diagnóstico era cirrose e ele seria enterrado lá mesmo. E assim enquanto fazia um curso para fazer as pessoas rirem eu chorava. Chorava pela ausência de não ter sabido como era ter um pai. Chorava porque nunca saberia. Chorava por ele, por ter morrido de uma coisa que poderia ser evitada se não bebesse tanto. Chorava lembrando dele indo embora. Chorava por momentos não vividos.

André me ligou, mas não o atendi, não queria falar com ninguém, somente retornei um e-mail para dizer que estava bem.

− Filha, se você não quiser vir não tem problema, vão enterrá-lo rápido − disse minha mãe ao telefone.

− A gente mal se falava mãe.

De repente não ir ao enterro pareceu ser uma boa ideia, estava fugindo daquela situação.

− Ele te amava muito, mas é melhor assim. Deus sabe o que faz − ela dizia essas coisas que se diz quando alguém morre.

Uma menina chamada Rosinha que estava no curso se compadeceu de mim, a conexão foi imediata, parece que os amigos realmente se reconhecem ao invés de se conhecerem. Rosinha era uma moça baixinha de cabelos lisos e negros, parecendo uma verdadeira indiazinha, ela era xamã e me convidou a fazer parte de um grupo que estudava essas energias. No próximo fim de semana haveria uma reunião na casa dela em Viamão.

Depois de alguns dias de luto resolvi aceitar o convite. A casa era linda, mais parecia um sítio, cercada por um jardim muito bem cuidado com lindas florezinhas, que cercava a piscina ao centro. Nos dirigimos a uma sala muito aconchegante com sofás e cadeiras rústicas, tudo decorado como se fosse uma casa de praia. As pessoas eram muito simpáticas e logo me senti em casa, conversando com todos ali.

− Fica à vontade, Kate, logo iniciaremos a nossa reunião − me tranquilizou Rosinha.

Então alguém começou a bater um tambor de som muito peculiar e a entoar uma canção muito bonita, em uma língua desconhecida para mim. Uma mulher vestida como os índios americanos acendeu um cachimbo com folhas de coca que havia trazido do Peru, não era um cachimbo igual aos dos pretos velhos que vi no Centro de Umbanda, ele era mais comprido ornamentado com penas de algum pássaro que desconfiei ser de uma águia. Ele ia passando por todos e já estava começando a me sentir em uma música do Gabriel o Pensador, até que ele chegou nas minhas mãos.

Quando o traguei senti a boca levemente adormecida, mas não era algo que me deixava chapada, era bom, a tal mulher de cabelos grisalhos me olhava sorrindo, mas o olhar dela não parecia dela, e sim de outra pessoa, de repente vi a fumaça sair e circundar todos ali como se envolvesse a todos num círculo, ela ficava ondulando como naqueles desenhos que assistia quando o personagem sentia o cheiro de comida. Comentei o fato com um rapaz que estava do meu lado, mas parecia que somente eu estava vendo a fumaça passeando. A mulher continuava a me olhar e assentiu com a cabeça como se também estivesse vendo. Ao menos eu não estava tendo alucinações.

Rosinha falava sobre a Grande Mãe e outras coisas que não entendi muito bem, e que aquela era uma preparação para entrarmos no suador e sentir como se estivéssemos no útero da mãe.

Nos encaminhamos para o quintal onde estava montada uma oca. Ao lado uma grande fogueira aquecia umas pedras. Todos entramos na oca que estava completamente escura, encontrei um lugar em que poderia ficar sentada, fiquei meio com medo de ter algum ser andando por lá, por exemplo uma aranha, tinha pavor de aranhas.

No centro da oca havia um buraco que um rapaz forte depositou algumas pedras retiradas da fogueira. A mulher do cachimbo pegou umas ervas, molhou na água e espirrou no buraco, logo o espaço se encheu de uma fumaça cheirosa, ela continuava cantando e Rosinha agora batucava o tambor. Não sabia exatamente o que fazer, mas entrei na viagem. Ficamos lá por um bom tempo, meu corpo suava e podia sentir a terra úmida nas minhas pernas.

Ahava- O amor é possívelOnde histórias criam vida. Descubra agora