Era tempo de voltar, meu refúgio no Sul estava acabando, já havia terminado o TCC e seis anos morando ali era o suficiente, "não consigo mais nenhum trabalho", o apartamento que estava morando fora vendido e em poucos dias eu teria que sair. "Não posso mais ficar aqui, vou voltar" pensei.
O sono foi entrecortado e pesado. Acordei às 13h e me sentindo péssima por ter dormido até aquela hora. Tomei um banho, coloquei uma bela roupa.
"Vou caminhar pelo Centro." Tomei café, aliás eu deveria já estar almoçando, mas não queria perder tempo, comi um pão integral com geleia de banana e um copo de leite desnatado com café solúvel e saí.
O dia estava ensolarado, peguei um ônibus até o centro, percorri vagarosamente pela Rua da Praia até o Gasômetro, revivendo os momentos de quando havia chegado nessa cidade tão linda, queria guardar na memória os edifícios, museus, camelôs. Entrei na Casa de Cultura para me despedir do Mário Quintana, da janela do seu quarto (que permanecia o mesmo de quando ele era vivo) dei um tchauzinho e tirei uma foto.
Depois fui ver a estátua da Elis Regina, tirei mais algumas fotos, me sentei à beira do Rio Guaíba para ver o pôr do sol, fiquei ali vendo-o baixar como se fechasse um ciclo, sabia que não voltaria nunca mais. Ouvia Vento no Litoral do Legião no meu mp3, "agora está tão longe... vê... a linha do horizonte me distrai... a vida continua e se entregar é uma bobagem...", momento melancólico. Era um adeus.
Precisava voltar para casa ainda naquele mês.
Em poucos dias empacotei tudo, despedi-me dos amigos e peguei um avião até Campinas, lá minha mãe me esperava de carro para me levar até Poços de Caldas. Revia todo o caminho num misto de tristeza e paz. Voltar assim definitivamente era estranho.
Mila mudou-se de cidade, havia se separado de Dani há algum tempo, perdemos o contato depois daquele dia da Sinfonia, na minha ânsia de me desligar de Nino e da velha vida acabei colocando ela no pacote, gostaria de saber o que aconteceu com ela, da turma antiga eu não tinha notícias de mais ninguém, desde a minha conversão decidi me afastar de todos, e parece que não fiz muita falta, eram amigos de balada. Por vezes tinha medo de andar na rua e rever meu passado, pois cada lugar que caminhava me trazia recordações nada agradáveis, eu ficava em um misto de medo e excitação com a possibilidade de encontrar Nino novamente, afinal fazia quase seis anos que eu não o via, nem tinha notícias. Todos aqueles sentimentos obsessivos e malignos estavam superados, mas acho que era normal sentir medo desse reencontro que eu adiaria pelo resto da vida se pudesse.
Quando dei por mim meses se passaram e, em Poços de Caldas, pareciam anos. Quase não saía de casa e estava entrando em um estado de isolamento, e assim os dias iam passando sem que eu fizesse absolutamente nada. Um completo deserto profissional e ministerial. Precisava lutar, levantar e sacudir o pó que se acumulava em meus ombros, sair do marasmo, mas me sentia sem forças. Então resolvi caminhar pela praça.
Já era outono, as folhas amareladas no chão dançavam desreguladamente conforme o vento soprava, senti um ar frio batendo no rosto, bagunçando os fios de cabelo que se soltavam da boina amarela que havia comprado na feirinha de artesanato.
Continuei caminhando até encontrar um banco vazio em frente à fonte, fiquei observando as águas explodirem em jatos rápidos e altos, algumas gotas minúsculas chegavam até mim. Observava como o sol, tímido, tentava entrar por entre as folhagens das árvores. Pouca coisa mudara naquele cenário poços-caldense.
Quando o tédio ficava insuportável eu ia para a praça, me sentava em um dos bancos perto da fonte e ficava imaginando como seria encontrar o verdadeiro amor da minha vida, alguém a quem eu pudesse ver o universo dentro dela e me perder no lago profundo do seu olhar, exageros à parte, às vezes eu ficava tendo esses pensamentos românticos de adolescente e imaginando cenários e situações, por exemplo: eu em um café escrevendo algo importante enquanto ele chegaria e perguntaria sobre a hora, acenderia um cigarro e comentaria sobre o livro que estava na mesa, claro que agora odiava cigarros, mas ficaria bem bonito se fosse uma cena de cinema, essas tolices perpassavam pela minha cabeça.
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Ahava- O amor é possível
RomantikKate se apaixona por Nino. Porém, o amor não correspondido a faz encontrar um amor maior. Mas o destino ainda poderá surpreende-la. Leia o primeiro capitulo desse livro que foi inspirada em uma história real.