Não sei mais quem sou,
Não sei mais o que sou,
Não tenho mais certezas que não
A certeza da existência de pó.
E sei, com toda a certeza do Universo,
Que o pó é a coisa mais humilde,
Boa, companheira, amante,
Que alguma vez existirá.
E isso o é porque não questiona,
Não demanda, não julga e sempre ama.
Porque todos do pó nascemos
E ao pó regressamos.
Mas o pó tem um lamento,
Uma mágoa que carrega dentro de si,
Consigo a todas as horas da vida.
Não tem ninguém que o ame, verdadeiramente.
As donas de casa expulsam-no,
Os homens tiram-no dos seus carros,
As crianças têm-lhe nojo
E os velhos têm alergias.
Por isso, por muito que ame,
Por muito que todos acolha,
Ninguém o quer, ninguém o deseja,
Ninguém o ama, verdadeiramente, como ele ama
Todos nós.
Esse é o seu lamento, a sua dor e agonia.
Deseja ser um dia,
Algo mais que pó e dar alegria
A algo mais que pó.
Não posso mais lutar
Sabendo que serei como ele,
Que no fim de tudo,
Que no fim de uma guerra para ser
Como o sol,
Serei como o pó,
E que me lamentarei para todo o sempre
Por ser pó.
Mas que mau que sou...
Sentir compaixão por algo
Mas temer ser como ele.
-JM
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