Vivo num mundo negro, sem Sol, sem luz
Vivo numa ilha perdida
Num mar sem marés.
Não há onda, não há som do bater da água
Na areia-carvão.
Não há vida no mar
Porque é salgado como a dor
Que carrego dentro de mim.
Passo as horas deitado sobre a pedra nua
Despido porque não tenho frio
Nem calor, nem vergonha nem pudor.
Não choro, não falo, não sinto
Porque neste mundo não há nada
Que me faça chorar, que me faça rir
Que me faça ser quem era.
Perdi conta aos dias, às horas, aos segundos
E deixo-me ficar onde nasci
E deixo-me ser cadáver
Incrivelmente imóvel esperando pelo fim.
Neste mar sem marés
Nesta ilha que me aprisiona
Não há força que me faça querer
Sair da pedra nua e fria
Que me faça querer ser algo mais
Do que o nada que me tornei.
Perdi os sonhos, perdi o querer
Jovial da mocidade.
Perdi-me num mundo que desconheço
Mas que conheço tão bem
Que me parece ser monótono.
As conversas que tenho com os espíritos
São cópias de si mesmas,
As histórias que ouço do vento
São lisas e sem sentimento.
Eu próprio sou folha por escrever!
Não, não quero ser livro que todos tocam
Prefiro ser uma folha rabiscada no fundo de uma velha gaveta.
Mas a dor de morrer aqui sozinho sufoca-me
Faz-me doer o peito como se um ferro
Me perfurasse uma e outra vez.
Não sou mais que um mar sem marés,
Não sou mais que um mundo negro sem luz.
Eu próprio sou um prisioneiro
Do meu próprio mundo.
-JM